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Traga me de volta , para aquela casa, de muitos dias atrás, que ainda hoje permanece sendo um embrião escuro cheio de esperanças pendentes e melancólicas prontas para serem reescritas.
Apenas tocar naquele chão tão fecundo, carente de sensações extravagantes e olhares enviesados de uma triste sabedoria que é o guia, e o perseguidor, das ilusões quase totalmente desfeitas pelo nó que as amarraram há algum tempo atrás,
Eu sempre corro longe antes de ter a chance de voltar, não sei, é a sensação de estar consertando algo sem conserto que vai poder mudar as coisas que virão e libertar os demônios travestidos de anjos-heróis que , na mais pura e singela sinceridade, querem aproveitar o tempo que perderam fazendo coisas que são de difícil aceitação (ou compreensão) fora de seu período, confundindo e atrapalhando as mais recentes descobertas que, enciumadas pela troca por essas libertadas, reagem de maneira descontrolada e criam outra batalha em uma guerra moral com grandes efeitos no local já quase devastado.
**
Eu me sinto envergonhado por isso tudo, querer voltar e correr longe, poder voltar àquela casa , tão diferente que deve estar, e ter medo do que vai vir.
Mas eu gosto, eu minto para poder querer dizer o que digo , não percebo bem, mas é mais bonito.
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quinta-feira, dezembro 29, 2005
terça-feira, dezembro 27, 2005
Pausa para comentários bloguísticos
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102º post.
Passou da casa dos 100, não esperava.
Espero que se mantenha bem até completar um ano, lá em março. Como é tempo de férias, espero que tenha alguma viagem para ilustrar um pouco isso aqui.
O maior número de acessos foi quando eu fui viajar e coloquei relatos e fotos dos locais onde passei. Era um número risível, mas tava bom.
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102º post.
Passou da casa dos 100, não esperava.
Espero que se mantenha bem até completar um ano, lá em março. Como é tempo de férias, espero que tenha alguma viagem para ilustrar um pouco isso aqui.
O maior número de acessos foi quando eu fui viajar e coloquei relatos e fotos dos locais onde passei. Era um número risível, mas tava bom.
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sexta-feira, dezembro 23, 2005
Cortazarianas beatniks (4)
:
Querer que tudo não se acerte para ter problemas e dúvidas legítimas para se pensar e buscar soluções diferentes, fora do convencional pensamento de que quando tudo está estável o caminho para a solução seria a desestabilidade legítima, genuinamente adquirida através não da estabilidade, obviamente, mas do desequilíbrio proporcionado através de uma situação que clame por romper as amarras firmes que perfazem a tênue linha divisória da perdição desencontrada do seu caminho com a estabilidade proporcionada por uma série de fatores que, por detalhes, não se torna o mesmo caminho da perdição; assim sendo, a linha, as dúvidas, os problemas, a estabilidade e o desequilíbrio, todos, são perpassados pela mesma linha imaginária que separa alguma coisa, será por Deus que separa?
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Querer que tudo não se acerte para ter problemas e dúvidas legítimas para se pensar e buscar soluções diferentes, fora do convencional pensamento de que quando tudo está estável o caminho para a solução seria a desestabilidade legítima, genuinamente adquirida através não da estabilidade, obviamente, mas do desequilíbrio proporcionado através de uma situação que clame por romper as amarras firmes que perfazem a tênue linha divisória da perdição desencontrada do seu caminho com a estabilidade proporcionada por uma série de fatores que, por detalhes, não se torna o mesmo caminho da perdição; assim sendo, a linha, as dúvidas, os problemas, a estabilidade e o desequilíbrio, todos, são perpassados pela mesma linha imaginária que separa alguma coisa, será por Deus que separa?
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quarta-feira, dezembro 21, 2005
Embriagado
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Estranhamente, acordou embriagado. Abriu os olhos, resquícios de luz solar entravam por algumas frestas da cortina que ia e vinha com o vento fresco - esse mesmo vento que chegou até ele passando pelo lençol desalinhado sobre o corpo e provocou um arrepio, os pêlos do braço se eriçaram como se preparassem para um perigo iminente. Os pelos, o vento, o lençol, a cama, mas principalmente a cama que repousava pesada e sufocante nas costas, denunciavam o estado de embriaguez. Quando se deu conta, já estava de pé indo à cozinha tomar vários copos d'água, pois a boca árida clamava por líquido muito mais que a cama clamou pelo corpo embriagado e do que o vento pelos pêlos eriçados e do que os resquícios de luz solar por uma fresta na cortina.
Três copos d'água foram o suficiente, por momento. Voltou ao quarto com a cabeça clamando pela cama e por uma posição fixa, que ocasionasse um olhar fixo para a parede branca do teto ou a visão escura do travesseiro muito próximo dos olhos, quase que forçando a eles se fecharem.
Olhos no travesseiro, flashes do que teria ocorrido para ele estar embriagado lhe vieram, lentos e confusos, como se também eles estivessem embriagados, perplexos de sua existência ou não, de sua simples existência ou de uma mera ficção baseada em fatos ao que tudo indicavam serem reais.
O primeiro dos flashes era uma tentativa de lembrar de qual momento , precisamente, ele não lembrava mais com detalhes do que tinha feito.
O segundo foi perdido pelo sono, que clamou por sua atenção e levou, sem pestanejar muito.
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Estranhamente, acordou embriagado. Abriu os olhos, resquícios de luz solar entravam por algumas frestas da cortina que ia e vinha com o vento fresco - esse mesmo vento que chegou até ele passando pelo lençol desalinhado sobre o corpo e provocou um arrepio, os pêlos do braço se eriçaram como se preparassem para um perigo iminente. Os pelos, o vento, o lençol, a cama, mas principalmente a cama que repousava pesada e sufocante nas costas, denunciavam o estado de embriaguez. Quando se deu conta, já estava de pé indo à cozinha tomar vários copos d'água, pois a boca árida clamava por líquido muito mais que a cama clamou pelo corpo embriagado e do que o vento pelos pêlos eriçados e do que os resquícios de luz solar por uma fresta na cortina.
Três copos d'água foram o suficiente, por momento. Voltou ao quarto com a cabeça clamando pela cama e por uma posição fixa, que ocasionasse um olhar fixo para a parede branca do teto ou a visão escura do travesseiro muito próximo dos olhos, quase que forçando a eles se fecharem.
Olhos no travesseiro, flashes do que teria ocorrido para ele estar embriagado lhe vieram, lentos e confusos, como se também eles estivessem embriagados, perplexos de sua existência ou não, de sua simples existência ou de uma mera ficção baseada em fatos ao que tudo indicavam serem reais.
O primeiro dos flashes era uma tentativa de lembrar de qual momento , precisamente, ele não lembrava mais com detalhes do que tinha feito.
O segundo foi perdido pelo sono, que clamou por sua atenção e levou, sem pestanejar muito.
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domingo, dezembro 18, 2005
Present Tense
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Você vê como aquelas árvores se curvam? Aquilo inspira?
Aprendendo a pegar os raios de sol...
Uma lição para ser aplicada
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Você pode passar seu tempo só,
Digerindo arrependimentos passados
Ou você pode vir até o limite e se dar conta
Que você é o único que pode se perdoar
Faz muito mais sentido viver no presente
Você tem idéia de como esta vida acaba?
Olhou suas mãos e estudou as linhas dela?
Você acredita que a estrada adiante
Conduz à iluminação?
Parece que, sem necessidade, está cada vez mais difícil
Achar um caminho e um jeito de se viver...
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Pearl Jam, Present Tense.
Você vê como aquelas árvores se curvam? Aquilo inspira?
Aprendendo a pegar os raios de sol...
Uma lição para ser aplicada
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Você pode passar seu tempo só,
Digerindo arrependimentos passados
Ou você pode vir até o limite e se dar conta
Que você é o único que pode se perdoar
Faz muito mais sentido viver no presente
Você tem idéia de como esta vida acaba?
Olhou suas mãos e estudou as linhas dela?
Você acredita que a estrada adiante
Conduz à iluminação?
Parece que, sem necessidade, está cada vez mais difícil
Achar um caminho e um jeito de se viver...
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Pearl Jam, Present Tense.
sexta-feira, dezembro 16, 2005
Petardo
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Um petardo quebrou a janela, invadiu o quarto rapidamente, alojou-se ao lado da cama enquanto um homem dormia. No outro dia, o petardo estava ali, perfeitamente instalado no quarto, até combinando com o carpete cinza-esverdeado. Mas mesmo assim não se fez perceber pelo homem que dormia na cama; esse, quando acordou, tropeçou no petardo e caiu de bruços perto da janela. Desmaiou.
Quando acordou, parecia que havia passado muito mais de duas horas que o sol indicava. Nesse tempo desmaiado, o homem entrou em transe: viajou, conheceu alguém, fez algo que não imaginava que fosse capaz, passou bons momentos ao lado da pessoa, foi feliz e então sofreu, fez mais coisas que não se imaginava sendo capaz, ficou perplexo, duvidava de tudo e de (quase) todos, preparou-se para o pior - a morte - mas com aquela esperança de que não fosse a sua hora, e assim se deu, não foi a sua hora, acordou, e o petardo tinha sumido, de alguma forma, mas o buraco na janela estivesse ali para provar que o petardo havia entrado sim. Embora achasse que estivesse sonhando desde o início, começou a cuidar cada passo que dava, evitando os petardos mas também, ao mesmo tempo, lá no fundo de sua vontade - daquela que nunca quer admitir que existe - começou a procurá-los, queria ter um encontro novamente para mostrar que um petardo pode bastar para se evitar outros.
Mas, como era de se esperar, encontrou outro petardo no caminho do banheiro, quando despreocupadamente caminhava, e a história se repetiu: o transe, os sentimentos e ações que pareciam de um sonho, inclusive o desejo de não querer e ao mesmo tempo querer encontrar um outro petardo para esclarecer que um petardo basta para se evitar outros.
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Um petardo quebrou a janela, invadiu o quarto rapidamente, alojou-se ao lado da cama enquanto um homem dormia. No outro dia, o petardo estava ali, perfeitamente instalado no quarto, até combinando com o carpete cinza-esverdeado. Mas mesmo assim não se fez perceber pelo homem que dormia na cama; esse, quando acordou, tropeçou no petardo e caiu de bruços perto da janela. Desmaiou.
Quando acordou, parecia que havia passado muito mais de duas horas que o sol indicava. Nesse tempo desmaiado, o homem entrou em transe: viajou, conheceu alguém, fez algo que não imaginava que fosse capaz, passou bons momentos ao lado da pessoa, foi feliz e então sofreu, fez mais coisas que não se imaginava sendo capaz, ficou perplexo, duvidava de tudo e de (quase) todos, preparou-se para o pior - a morte - mas com aquela esperança de que não fosse a sua hora, e assim se deu, não foi a sua hora, acordou, e o petardo tinha sumido, de alguma forma, mas o buraco na janela estivesse ali para provar que o petardo havia entrado sim. Embora achasse que estivesse sonhando desde o início, começou a cuidar cada passo que dava, evitando os petardos mas também, ao mesmo tempo, lá no fundo de sua vontade - daquela que nunca quer admitir que existe - começou a procurá-los, queria ter um encontro novamente para mostrar que um petardo pode bastar para se evitar outros.
Mas, como era de se esperar, encontrou outro petardo no caminho do banheiro, quando despreocupadamente caminhava, e a história se repetiu: o transe, os sentimentos e ações que pareciam de um sonho, inclusive o desejo de não querer e ao mesmo tempo querer encontrar um outro petardo para esclarecer que um petardo basta para se evitar outros.
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quarta-feira, dezembro 14, 2005
a duvida da certeza
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Primeira
Responsabilidades, travestidas de gritos de socorros inaudíveis mas perceptíveis a quem deve escutar;
estarei lá, ouvindo, ajudando quando possível e quando necessário, embora algumas vezes hesite por dúvida de estar ou não fazendo a coisa certa.
É algo sem convicção, é a resposta imediata ao socorro, e , como tal, não há tempo para maiores questionamentos do estar certo ou não, tudo é a primeira opinião, virgem e pusilânime, mas que precisa sair para ser mais elaborada e convicente - além de crescer como tal e tornar se a "mais certa" (?).
( Porque as pessoas insistem querer saber as respostas de tudo ? Porque elas não se contentam apenas com a dúvida ? Porque, a cada dia, certas pessoas precisam de uma confirmação que outras a amam para , assim, essas pessoas poderem viver na vã e ilusória comodidade que a "certeza" de uma resposta positiva traz? E porque o risco da dúvida não é aceito por quem tanto insiste em querer saber?)
Outras
* È a dúvida que explica o motivo da simples presença de uma pessoa trazer certos sentimentos estranhos que, levados para o aspecto físico, são como se alguém tivesse apertado um parafuso dentro do nosso peito, e que esse lugar que foi parafusado se torne tão frágil por alguns minutos, dias ou anos a ponto de a todo momento precisar de um novo aperto ?
Ou é a certeza?
* Será que essa parte frágil algum dia se tornará fixa, dura, resistente, inquebrável?
* Por que será que a certeza, em sua tão certeira e inquestionável resposta, mesmo assim não consegue aplacar a ira da dúvida, que sempre parece achar brechas nas muitas portas que a limitam?
Que dúvida cruel.
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Primeira
Responsabilidades, travestidas de gritos de socorros inaudíveis mas perceptíveis a quem deve escutar;
estarei lá, ouvindo, ajudando quando possível e quando necessário, embora algumas vezes hesite por dúvida de estar ou não fazendo a coisa certa.
É algo sem convicção, é a resposta imediata ao socorro, e , como tal, não há tempo para maiores questionamentos do estar certo ou não, tudo é a primeira opinião, virgem e pusilânime, mas que precisa sair para ser mais elaborada e convicente - além de crescer como tal e tornar se a "mais certa" (?).
( Porque as pessoas insistem querer saber as respostas de tudo ? Porque elas não se contentam apenas com a dúvida ? Porque, a cada dia, certas pessoas precisam de uma confirmação que outras a amam para , assim, essas pessoas poderem viver na vã e ilusória comodidade que a "certeza" de uma resposta positiva traz? E porque o risco da dúvida não é aceito por quem tanto insiste em querer saber?)
Outras
* È a dúvida que explica o motivo da simples presença de uma pessoa trazer certos sentimentos estranhos que, levados para o aspecto físico, são como se alguém tivesse apertado um parafuso dentro do nosso peito, e que esse lugar que foi parafusado se torne tão frágil por alguns minutos, dias ou anos a ponto de a todo momento precisar de um novo aperto ?
Ou é a certeza?
* Será que essa parte frágil algum dia se tornará fixa, dura, resistente, inquebrável?
* Por que será que a certeza, em sua tão certeira e inquestionável resposta, mesmo assim não consegue aplacar a ira da dúvida, que sempre parece achar brechas nas muitas portas que a limitam?
Que dúvida cruel.
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terça-feira, dezembro 13, 2005
I'm so tired
Deitado em seu quarto, O Garoto olha pela janela, fixa o olhar e vê um feixe dourado em forma de estrela se estender infinitamente na horizontal, como uma grande Enterprise viajando na velocidade da luz. Acende um cigarro, se debate na cama, olha a foto ao seu lado, no bidê, fica perplexo; olha fixamente para a janela, divaga, sofre, pensa - muito - sofre.
Liga o som e escuta :
Beatles, i'm so tired.
I’m so tired, I haven’t slept a wink,
I’m so tired, my mind is on the blink.
I wonder should I get up and fix myself a drink.
No, no, no.
I’m so tired I don’t know what to do.
I’m so tired my mind is set on you.
I wonder should I call you but I know what you’d do.
You’d say I’m putting you on.
But it’s no joke, it’s doing me harm.
You know I can’t sleep, I can’t stop my brain
You know it’s three weeks, I’m going insane.
You know I’d give you everything I’ve got
For a little peace of mind.
I’m so tired, I’m feeling so upset
Although I’m so tired I’ll have another cigarette
And curse Sir Walter Raleigh.
He was such a stupid git.
Acha que uma música não pode dizer tanto num momento tão verdadeiramente certeiro.
Liga o som e escuta :
Beatles, i'm so tired.
I’m so tired, I haven’t slept a wink,
I’m so tired, my mind is on the blink.
I wonder should I get up and fix myself a drink.
No, no, no.
I’m so tired I don’t know what to do.
I’m so tired my mind is set on you.
I wonder should I call you but I know what you’d do.
You’d say I’m putting you on.
But it’s no joke, it’s doing me harm.
You know I can’t sleep, I can’t stop my brain
You know it’s three weeks, I’m going insane.
You know I’d give you everything I’ve got
For a little peace of mind.
I’m so tired, I’m feeling so upset
Although I’m so tired I’ll have another cigarette
And curse Sir Walter Raleigh.
He was such a stupid git.
Acha que uma música não pode dizer tanto num momento tão verdadeiramente certeiro.
sábado, dezembro 10, 2005
Notícia de uma peça
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CADERNO DE CULTURA, página C1:
'ENDEREÇOS' CHEGA EM SANTA MARIA
Polêmica peça do diretor José Henrique tem única apresentação hoje no Treze De Maio.
por Tony Laporta
"A luz se acende, O imenso palco está dividido em três níveis: Cada nível está dividido em linhas verticais. Dentro de cada linha acontecem, entre outras, as seguinte coisas: um homem nú espanca uma mulher nua com um chicote de sete tiras, em cujas pontas estão pedaços de metal; um velho sem dentes, numa velha cozinha,coloca com mãos trêmulas enormes pedaços de goiabada na boca, como se estivesse matando; um homem gordo, sentado numa privada, lê o Jornal do Brasil, levanta-se, vira as nádegas para a platéia e limpa o ânus laboriosamente com pedaços de jornal. Enquanto isso, no plano médio, simultaneamente, uma medalha é colocada no peito de um genreal, uma mitra na cabeça de um bispo, um bebê na mão da mãe do ano, uma caixa de ferramentas é ofertada ao operário, um protetor escrotal é colocado no atleta do ano... "
Assim um crítico de um jornal do centro do país descreveu o início da peça que estréia hoje em Santa Maria. Tentou descrever, pois a peça é indescritível, garante quem assitiu . " É um negócio complexo demais, escatológico demais, maluco mesmo, mas até que eu gostei " diz Fabrício Carvalho, estudante de artes cênicas que estava no Rio de janeiro quando a preça estreiou por lá.
'Endereços' faz parte de uma absurda trilogia chamada 'Guia dos Telefones' (as outras duas partes são Páginas marelas e Assinantes) que tenta mostrar toda a "potencialidade visual do guia telefônico".
Para tentar colocar no palco peça tão polêmica ninguém melhor que o jovem diretor José Henrique, que estreiou dirigindo a peça "Dias Felizes" , de Samuel Beckett, onde colocou dois personagens inteiramente nús - a mulher manchada de fezes e o homom de sangue. A seguir, uma entrevista rápida com o diretor:
Como foi que você decidiu enfrentar o grande desafio de encarar o Guia dos Telefones?
Não sei. Acho que cansei dos velhos textos doteatro do absurdo, da crueldade, da incomunicabilidade, etc. Sentia-me enclausurado num microsegmento do multicodalismo do conhecimento humano. No ano passado encontrei-me com Tynan em Londres e ele me disse "'o grande diretor de teatro ainda não nasceu"'. No avião vim pensando, Welles, Barault, Vilar, todos apenas hubris e nada mais.
Você resolveu dirigir o Guia dos Telefones para mostrar que é um grande diretor?
Eu não preciso mostrar a(...) nenhum que sou um grande diretor. Escolhi o Guia dos Telefones por ele ser uma peça (conjunto de informações sobre o mundo) da maior importância, constantemente renovado, postatual, onde o contexto predomina sobre o texto e a analogia sobre as relações de quantidade.
Guia dos Telefones é uma trilogia. E as outras duas, pretende fazer também?
As três peças deveriam ser representadas concomitantemente. Mas a comercialização do teatro nacional e a preguiça e a burrice e a alienação dos espectadores não permitem que a encenação de uma peça de seis horas de duração.
Santa Maria. Conhece a cidade, os gaúchos, o que espera do público?
Sim óbvio que conheço vocês, esperam que façam valer a fama de "mais intelectuais do Brasil" que tanto pregam e não fiquem enbasbacados ou chocados, que palavra ridícula mas enfim, porque é uma transubstanciaçaõ em forma de teatro, teatro livre, é a vida, pessoas morrem, nascem, copulam, roubam, cagam, enfim, vivem, e isso é Endereços.
Os ingressos estão à venda na bilheteria do Teatro. R$ 15,00 normal, R$ 12,00 sócios e R$ 10,00 estudantes. O espetáculo começa às 18:30.
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P.S: notícia baseada no conto Asteriscos, de Rubem Fonseca, do livro Lucia McCartney.
CADERNO DE CULTURA, página C1:
'ENDEREÇOS' CHEGA EM SANTA MARIA
Polêmica peça do diretor José Henrique tem única apresentação hoje no Treze De Maio.
por Tony Laporta
"A luz se acende, O imenso palco está dividido em três níveis: Cada nível está dividido em linhas verticais. Dentro de cada linha acontecem, entre outras, as seguinte coisas: um homem nú espanca uma mulher nua com um chicote de sete tiras, em cujas pontas estão pedaços de metal; um velho sem dentes, numa velha cozinha,coloca com mãos trêmulas enormes pedaços de goiabada na boca, como se estivesse matando; um homem gordo, sentado numa privada, lê o Jornal do Brasil, levanta-se, vira as nádegas para a platéia e limpa o ânus laboriosamente com pedaços de jornal. Enquanto isso, no plano médio, simultaneamente, uma medalha é colocada no peito de um genreal, uma mitra na cabeça de um bispo, um bebê na mão da mãe do ano, uma caixa de ferramentas é ofertada ao operário, um protetor escrotal é colocado no atleta do ano... "
Assim um crítico de um jornal do centro do país descreveu o início da peça que estréia hoje em Santa Maria. Tentou descrever, pois a peça é indescritível, garante quem assitiu . " É um negócio complexo demais, escatológico demais, maluco mesmo, mas até que eu gostei " diz Fabrício Carvalho, estudante de artes cênicas que estava no Rio de janeiro quando a preça estreiou por lá.
'Endereços' faz parte de uma absurda trilogia chamada 'Guia dos Telefones' (as outras duas partes são Páginas marelas e Assinantes) que tenta mostrar toda a "potencialidade visual do guia telefônico".
Para tentar colocar no palco peça tão polêmica ninguém melhor que o jovem diretor José Henrique, que estreiou dirigindo a peça "Dias Felizes" , de Samuel Beckett, onde colocou dois personagens inteiramente nús - a mulher manchada de fezes e o homom de sangue. A seguir, uma entrevista rápida com o diretor:
Como foi que você decidiu enfrentar o grande desafio de encarar o Guia dos Telefones?
Não sei. Acho que cansei dos velhos textos doteatro do absurdo, da crueldade, da incomunicabilidade, etc. Sentia-me enclausurado num microsegmento do multicodalismo do conhecimento humano. No ano passado encontrei-me com Tynan em Londres e ele me disse "'o grande diretor de teatro ainda não nasceu"'. No avião vim pensando, Welles, Barault, Vilar, todos apenas hubris e nada mais.
Você resolveu dirigir o Guia dos Telefones para mostrar que é um grande diretor?
Eu não preciso mostrar a(...) nenhum que sou um grande diretor. Escolhi o Guia dos Telefones por ele ser uma peça (conjunto de informações sobre o mundo) da maior importância, constantemente renovado, postatual, onde o contexto predomina sobre o texto e a analogia sobre as relações de quantidade.
Guia dos Telefones é uma trilogia. E as outras duas, pretende fazer também?
As três peças deveriam ser representadas concomitantemente. Mas a comercialização do teatro nacional e a preguiça e a burrice e a alienação dos espectadores não permitem que a encenação de uma peça de seis horas de duração.
Santa Maria. Conhece a cidade, os gaúchos, o que espera do público?
Sim óbvio que conheço vocês, esperam que façam valer a fama de "mais intelectuais do Brasil" que tanto pregam e não fiquem enbasbacados ou chocados, que palavra ridícula mas enfim, porque é uma transubstanciaçaõ em forma de teatro, teatro livre, é a vida, pessoas morrem, nascem, copulam, roubam, cagam, enfim, vivem, e isso é Endereços.
Os ingressos estão à venda na bilheteria do Teatro. R$ 15,00 normal, R$ 12,00 sócios e R$ 10,00 estudantes. O espetáculo começa às 18:30.
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P.S: notícia baseada no conto Asteriscos, de Rubem Fonseca, do livro Lucia McCartney.
quinta-feira, dezembro 08, 2005
Revista de criticas (1)
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On the Road – Jack Kerouac
Um dos clássicos da Contracultura, desencadeador da rebeldia de muita gente, livro de ouro dos viajantes. Um chute nos bagos da felicidade inocente dos anos 50 pós-guerra, vilão do American way of life. A babá de uma geração vazia. Muitas expressões que talvez ajudem a definir o que é o livro On the Road - do escritor americano Jack Kerouac.
Lançado em 1957, me atrevo a dizer que é um dos livros do século XX que mais causam um “baque” nos leitores – principalmente em jovens dos 18 aos vinte e poucos anos. Mesmo no Brasil, em que primeira edição saiu em 1984, traduzida em conjunto pelo jornalista Eduardo Bueno e o escritor Antonio Bivar, ele inspirou músicas, pessoas, idéias, comportamentos, atitudes – trouxe um alento de que as coisas poderiam ser diferentes e muito mais interessantes também por aqui.
A história se passa no final dos anos 40 e início dos 50, nos Estados Unidos. Sal Paradise, o narrador (alter-ego do autor Jack Kerouac), e seu amigo , o louco anarquista vagabundo Dean Moriarty, viajam pelos Estados Unidos com pouco dinheiro e muita vontade de fazer algo que eles nem sabem o quê. No caminho, circulam pelos confins dos Estados Unidos inocentemente feliz e conservador do pós-guerra; encontram e fazem muitos amigos, passam dificuldades, bebem; fazem festas, visitam lugares esquecidos e conhecidos, ouvem muito jazz. Quase inconscientes pelo pusilânime mundo ao seu redor, vão em busca de experiências. As encontram travestidas de formas tão estranhas que quase não as reconhecem. Mas é isso mesmo? , perguntam. E é, é isso mesmo, mas como só agora vocês foram perceber ?
On the Road é precursor e inspirador. A busca de uma individualidade perdida , que parecia tão diluída entre os louros da camaradagem e do patriotismo da vitória na guerra, teve um quase fim (pois nunca terá um fim definitivo) nos clubes de jazz ao som do be-bop desordenado ou na marijuana trocada por lucky strikes no México na última das viagens do livro. A rebeldia, como forma de ser contra ao tradicional, de dar um soco na cara da mesmice e depois ser presa por isso, ganhou um corpo consistente nas palavras de Kerouac. E a literatura como forma de transcendência, aquela que pula das páginas para nosso corpo e mente e de lá sai correndo como um cadillac possante nos puxando para a vida, como que dizendo não, você é tão medroso, acorde, veja o que te espera, deve muito a On the Road.
Depois de quase 40 anos de espera, finalmente o livro vai virar filme, pelas mãos do diretor brasileiro Walter Salles, com a produção do mestre americano Francis Ford Coppola. Coisa boa está por vir.
A primeira versão do livro é de 1984, da editora Brasiliense. Recentemente saiu uma edição revisada com uma nova introdução e posfácio de Eduardo Bueno.
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p.s: o teclado nao esta colaborando com os acentos.
On the Road – Jack Kerouac
Um dos clássicos da Contracultura, desencadeador da rebeldia de muita gente, livro de ouro dos viajantes. Um chute nos bagos da felicidade inocente dos anos 50 pós-guerra, vilão do American way of life. A babá de uma geração vazia. Muitas expressões que talvez ajudem a definir o que é o livro On the Road - do escritor americano Jack Kerouac.
Lançado em 1957, me atrevo a dizer que é um dos livros do século XX que mais causam um “baque” nos leitores – principalmente em jovens dos 18 aos vinte e poucos anos. Mesmo no Brasil, em que primeira edição saiu em 1984, traduzida em conjunto pelo jornalista Eduardo Bueno e o escritor Antonio Bivar, ele inspirou músicas, pessoas, idéias, comportamentos, atitudes – trouxe um alento de que as coisas poderiam ser diferentes e muito mais interessantes também por aqui.
A história se passa no final dos anos 40 e início dos 50, nos Estados Unidos. Sal Paradise, o narrador (alter-ego do autor Jack Kerouac), e seu amigo , o louco anarquista vagabundo Dean Moriarty, viajam pelos Estados Unidos com pouco dinheiro e muita vontade de fazer algo que eles nem sabem o quê. No caminho, circulam pelos confins dos Estados Unidos inocentemente feliz e conservador do pós-guerra; encontram e fazem muitos amigos, passam dificuldades, bebem; fazem festas, visitam lugares esquecidos e conhecidos, ouvem muito jazz. Quase inconscientes pelo pusilânime mundo ao seu redor, vão em busca de experiências. As encontram travestidas de formas tão estranhas que quase não as reconhecem. Mas é isso mesmo? , perguntam. E é, é isso mesmo, mas como só agora vocês foram perceber ?
On the Road é precursor e inspirador. A busca de uma individualidade perdida , que parecia tão diluída entre os louros da camaradagem e do patriotismo da vitória na guerra, teve um quase fim (pois nunca terá um fim definitivo) nos clubes de jazz ao som do be-bop desordenado ou na marijuana trocada por lucky strikes no México na última das viagens do livro. A rebeldia, como forma de ser contra ao tradicional, de dar um soco na cara da mesmice e depois ser presa por isso, ganhou um corpo consistente nas palavras de Kerouac. E a literatura como forma de transcendência, aquela que pula das páginas para nosso corpo e mente e de lá sai correndo como um cadillac possante nos puxando para a vida, como que dizendo não, você é tão medroso, acorde, veja o que te espera, deve muito a On the Road.
Depois de quase 40 anos de espera, finalmente o livro vai virar filme, pelas mãos do diretor brasileiro Walter Salles, com a produção do mestre americano Francis Ford Coppola. Coisa boa está por vir.
A primeira versão do livro é de 1984, da editora Brasiliense. Recentemente saiu uma edição revisada com uma nova introdução e posfácio de Eduardo Bueno.
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p.s: o teclado nao esta colaborando com os acentos.
terça-feira, dezembro 06, 2005
Incertos conselhos
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De alguém diante do espelho, após uma noite sem graça, às 23:00.
_ Incerteza, cara amiga tão relutante em ser despertada, venha me salvar. Preciso da tua ajuda, da tua compreensão, da tua tão singela sabedoria de nunca saber a hora certa das coisas, mas de apenas sentir ,e isso bastar. Preciso que tu venhas e combata o teu algoz com duas letras a menos, preciso que tu digas para ele que , sim, ele é necessário, mas que ele não pode se apossar da vida de ninguém e ser o guia onipresente de todas as ações, como se nada sem ele possa existir. Venha mostrar para esse teu algoz - inimigo chato, cruel - que a tua forma de guiar é muito mais sabedora do caminho daquilo que alguém inventou chamar de felicidade - o que quase sempre se confunde com outra palavra chamada diversão, sendo , talvez, essa mais coerente e respeitável aos olhos famintos por facilidades que nós temos e insistimos em disfarçar para não sermos tachados de simplórios.
De uma psicóloga para seu cliente, rapaz de 23 anos com propensão a depressão ( embora não tenha tido nenhum ataque psicótico ainda )
_ Se o pudor é exagerado a ponto de impedir que a diversão busque seu espaço tão caro a todos nós, porque não mudá-lo, moldá-lo de acordo com os estímulos diversionais que a todo momento clamam por nossa atenção? Nós não somos bons por natureza, certas atitudes consideradas ruins são necessárias, talvez porque possamos pensar que elas são ruins para nós mas na verdade são apenas causadoras de uma "dor" que é necessária e indispensável para o crescimento, embora difícil é aceitarmos isso sem sofrimento.
De um professor de sociologia a um intelectual que recém se separou da mulher, com quem foi casado por 23 anos:
_ São princípios relutantes em serem aceitos, mas nunca impossíveis de serem transformados, já que, ao se saber do tão grave erro que se comete em não aderir a certos comportamentos comprovadamente mais eficazes na busca da diversão - que é, afinal o que todos queremos -, porque não abrir a gaveta trancada dos princípios adquiridos a muito custo e pouca escolha da infância e aceitar alguns novos? Ainda mais que, com esses novos, os antigos podem ser mudados e se tornarem ainda mais eficazes em suas tarefas e conscientes de sua função.
..
De alguém diante do espelho, após uma noite sem graça, às 23:00.
_ Incerteza, cara amiga tão relutante em ser despertada, venha me salvar. Preciso da tua ajuda, da tua compreensão, da tua tão singela sabedoria de nunca saber a hora certa das coisas, mas de apenas sentir ,e isso bastar. Preciso que tu venhas e combata o teu algoz com duas letras a menos, preciso que tu digas para ele que , sim, ele é necessário, mas que ele não pode se apossar da vida de ninguém e ser o guia onipresente de todas as ações, como se nada sem ele possa existir. Venha mostrar para esse teu algoz - inimigo chato, cruel - que a tua forma de guiar é muito mais sabedora do caminho daquilo que alguém inventou chamar de felicidade - o que quase sempre se confunde com outra palavra chamada diversão, sendo , talvez, essa mais coerente e respeitável aos olhos famintos por facilidades que nós temos e insistimos em disfarçar para não sermos tachados de simplórios.
De uma psicóloga para seu cliente, rapaz de 23 anos com propensão a depressão ( embora não tenha tido nenhum ataque psicótico ainda )
_ Se o pudor é exagerado a ponto de impedir que a diversão busque seu espaço tão caro a todos nós, porque não mudá-lo, moldá-lo de acordo com os estímulos diversionais que a todo momento clamam por nossa atenção? Nós não somos bons por natureza, certas atitudes consideradas ruins são necessárias, talvez porque possamos pensar que elas são ruins para nós mas na verdade são apenas causadoras de uma "dor" que é necessária e indispensável para o crescimento, embora difícil é aceitarmos isso sem sofrimento.
De um professor de sociologia a um intelectual que recém se separou da mulher, com quem foi casado por 23 anos:
_ São princípios relutantes em serem aceitos, mas nunca impossíveis de serem transformados, já que, ao se saber do tão grave erro que se comete em não aderir a certos comportamentos comprovadamente mais eficazes na busca da diversão - que é, afinal o que todos queremos -, porque não abrir a gaveta trancada dos princípios adquiridos a muito custo e pouca escolha da infância e aceitar alguns novos? Ainda mais que, com esses novos, os antigos podem ser mudados e se tornarem ainda mais eficazes em suas tarefas e conscientes de sua função.
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sábado, dezembro 03, 2005
Seu Benevides
Historieta de um tempo atrás:
Seu benevides
Onde está meu cachorro?
Era só o que sabia dizer o homem, deitado na calçada à frente de seu prédio, com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
O guarda Benevides não sabia o que responder. Não sabia de cachorro nenhum, não sabia que homem era aquele, nem o que fazia ali na rua tarde da noite, muito menos o porquê da cabeça dele estar vermelha de sangue.
Onde está o cachorro, porra?
Não se cansava de repetir. O guarda Benevides estava ficando irritado; mandou o moço se acalmar que ele não tinha visto nenhum cachorro por ali. Iria chamar a ambulância, se o moço quisesse, para tratar de cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
Daí o guarda Benevides não agüentou: deu um chute na boca do estômago do moço, pum, que urrou de dor, mas depois ficou calado, e não se mexeu mais. O guarda mandou ele se acalmar , que não tinha cachorro nenhum por ali, e que era para o moço ficar quieto, se não ele mesmo o levaria a força para um hospital.
..
O guarda Benevides, ou Seu Benevides, como o chamavam os grã-finos do bairro, era guarda-noturno há 10 anos. Nunca se incomodara nesse tempo. Trabalho fácil. Os marginais, por algum motivo que ele desconhecia e nem queria saber, passavam longe dos prédios dos grã-finos. E ele achava o máximo isso, se sentia poderoso. Os marginais tinham medo do Seu Benevides, era nisso que acreditava.
Uma vez tinha visto dois homens sentados na frente da calçada do prédio do Juca, o porteiro, que era seu primo. Notou de longe o naipe das figuras, e foi se aproximando aos pouquinhos, caminhando sem pressa. Botou a mão no bolso e apertou firme a calça jeans , como sempre fazia quando estava diante de um perigo iminente. Aproximou da calçada do prédio, tirou seu boné e abanou para as figuras sentadas, que não responderam. Benevides parou e repetiu o gesto. Dessa vez os homens olharam para ele, mas não fizeram nenhum sinal. Benevides, irritado, chegou mais perto, perguntou, educadamente, o que os dois faziam ali sentados àquela hora da noite. Nada de resposta. Então, pegou seu cacetete de aço de dentro do casaco e bateu nos dois, pum pum, duas pauladas, uma em cada cabeça, sem quase nenhum intervalo de tempo . Os dois caíram no chão, com suas cabeças em um vermelho cor de sangue. Benevides olhou para dentro do prédio para ver se Juca estaria por ali , mas não achou ninguém, e tratou de terminar o serviço. Deu mais dois chutes em cada um, na boca do estômago e nas costas, pum pum, rápido, sem intervalo, que nem aqueles ninjas de filme chinês. Com calma, pegou os corpos, um de cada vez, e tratou de embrulhá-los nos sacos de lixo que tinha em sua mochila. Carregou cada corpo até a casa abandonada da esquina, onde pacientemente terminou o serviço à luz de uma pequena fogueira, cortando-os em pedaços com uma serra e alimentando o seu cachorro Rex, velho já, que por sua vez estava tratando de uma enorme mordida no pescoço que levara uma semana antes. O cachorro estava deitado num canto escuro, em baixo de uma janela aberta, e quando Benevides chamou-o, Rex,Rex, vem cá, o cachorro pulou de alegria e lambeu a mão vermelha do seu dono, parecendo já recuperado do ferimento. Benevides mostrou os pedaços para Rex, que latiu baixinho de felicidade, e logo depois estava os dois, guarda e cachorro, sentados sob a luz da fogueira, um olhando o outro comer, os dois igualmente com uma alegria indescritível em seus rostos cansados.
Fazia dois anos que Rex se fora. Seu Benevides não foi trabalhar no fatídico dia, passou a noite chorando em casa. Depois que se recuperou, nunca mais encontrou outro cachorro decente. De vez em quando achava um na rua, perdido, levava para casa, treinava-o, mas logo depois eles iam embora, ingratos. No mês passado, tinha encontrado um igual ao Rex, mas igualzinho mesmo. Ficou intrigado porque Rex nunca teve filho, Benevides nunca deixou seu cachorro por aí para engravidar cachorrinhas interessadas no seu sêmen de campeão. Mas, de alguma forma, o cachorro era igualzinho a Rex, e só poderia ser filho dele, ou quem sabe pai, porque Rex morreu cedo, com 4 anos .
Observou o cachorro parecido com Rex por algumas semanas, conheceu seu dono, viu sua casa, seus hábitos, onde passeava, suas vizinhas. Descobriu então que o cachorro era irmão gêmeo de Rex. O dono namorava a moça loira que morava no prédio do Juca, seu primo, e todo dia que vinha visitar a namorada trazia o irmão do Rex junto. Uma semana atrás, tinha tido o primeiro contato com o bicho, numa esbarrada. O cachorro saiu correndo lépido pelo corredor do prédio e Benevides, que conversava com Juca, parou e fez uns carinhos no cão, que logo se acalmou e se fez de morto, para a alegria de Benevides que assim o acariciou com vigor, passando sua mão vermelha por todo o corpo tez do cachorro. Ali fez uma promessa: o cachorro ia ser seu, de qualquer maneira.
Arquitetou um plano que não poderia ter falhas, porque só teria uma chance, era matar ou morrer.
Não queria envolver seu primo Juca, mas era a única forma, não tinha muito tempo. Sabia que o irmão do Rex estava sendo cortejado pela cachorra do prédio vizinho. Já tinham até marcado um encontro para ver se os dois se dariam bem, e os donos aprovavam a união, torcendo para que dali saísse muitos cachorrinhos . Benevides pediu para Juca : quando o dono do irmão do Rex estiver saindo da casa da namorada, avisa que tem um moço que quer falar com ele na frente do prédio. Não deu mais detalhes , não precisava envolver demais as pessoas para uma coisa que iria ser só sua, unicamente sua . Juca fez o combinado. Benevides esperava ansioso na calçada, com a mão no bolso apertando ferozmente a calça jeans. Quando avistou o moço, tratou de se aproximar devagar, com cuidado para não apavorá-lo. Perguntou, educadamente, como era o nome do cachorro. Sabia que era Kuki , mas achou que era uma boa primeira pergunta. O homem respondeu , também educadamente, e Benevides se abaixou para fazer carinho no irmão do Rex. Enquanto fazia carinho, puxou seu cacetete de aço de dentro do casaco, devagar , e deu uma paulada na nuca do moço, que estava de costas para ele. Pum. O moço já caiu desmaiado no chão. Agora tinha que agir rápido. Pegou o cachorro no colo e saiu correndo em direção à casa abandonada da esquina. Ao redor de uma pequena fogueira, fez o bicho deitar, deu água, fez carinho até ele se acalmar e quase dormir, bocejando . Então saiu , voltou para o prédio. Viu o homem ali na frente, que ainda estava acordado, inexplicavelmente.
Onde está meu cachorro ?
Era só o que dizia o homem, deitado na calçada com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
Benevides não sabia o que responder. Tentou se acalmar. Disse que não tinha visto cachorro algum ali , que ia chamar uma ambulância , se o moço quisesse, para tratar da cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
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Seu benevides
Onde está meu cachorro?
Era só o que sabia dizer o homem, deitado na calçada à frente de seu prédio, com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
O guarda Benevides não sabia o que responder. Não sabia de cachorro nenhum, não sabia que homem era aquele, nem o que fazia ali na rua tarde da noite, muito menos o porquê da cabeça dele estar vermelha de sangue.
Onde está o cachorro, porra?
Não se cansava de repetir. O guarda Benevides estava ficando irritado; mandou o moço se acalmar que ele não tinha visto nenhum cachorro por ali. Iria chamar a ambulância, se o moço quisesse, para tratar de cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
Daí o guarda Benevides não agüentou: deu um chute na boca do estômago do moço, pum, que urrou de dor, mas depois ficou calado, e não se mexeu mais. O guarda mandou ele se acalmar , que não tinha cachorro nenhum por ali, e que era para o moço ficar quieto, se não ele mesmo o levaria a força para um hospital.
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O guarda Benevides, ou Seu Benevides, como o chamavam os grã-finos do bairro, era guarda-noturno há 10 anos. Nunca se incomodara nesse tempo. Trabalho fácil. Os marginais, por algum motivo que ele desconhecia e nem queria saber, passavam longe dos prédios dos grã-finos. E ele achava o máximo isso, se sentia poderoso. Os marginais tinham medo do Seu Benevides, era nisso que acreditava.
Uma vez tinha visto dois homens sentados na frente da calçada do prédio do Juca, o porteiro, que era seu primo. Notou de longe o naipe das figuras, e foi se aproximando aos pouquinhos, caminhando sem pressa. Botou a mão no bolso e apertou firme a calça jeans , como sempre fazia quando estava diante de um perigo iminente. Aproximou da calçada do prédio, tirou seu boné e abanou para as figuras sentadas, que não responderam. Benevides parou e repetiu o gesto. Dessa vez os homens olharam para ele, mas não fizeram nenhum sinal. Benevides, irritado, chegou mais perto, perguntou, educadamente, o que os dois faziam ali sentados àquela hora da noite. Nada de resposta. Então, pegou seu cacetete de aço de dentro do casaco e bateu nos dois, pum pum, duas pauladas, uma em cada cabeça, sem quase nenhum intervalo de tempo . Os dois caíram no chão, com suas cabeças em um vermelho cor de sangue. Benevides olhou para dentro do prédio para ver se Juca estaria por ali , mas não achou ninguém, e tratou de terminar o serviço. Deu mais dois chutes em cada um, na boca do estômago e nas costas, pum pum, rápido, sem intervalo, que nem aqueles ninjas de filme chinês. Com calma, pegou os corpos, um de cada vez, e tratou de embrulhá-los nos sacos de lixo que tinha em sua mochila. Carregou cada corpo até a casa abandonada da esquina, onde pacientemente terminou o serviço à luz de uma pequena fogueira, cortando-os em pedaços com uma serra e alimentando o seu cachorro Rex, velho já, que por sua vez estava tratando de uma enorme mordida no pescoço que levara uma semana antes. O cachorro estava deitado num canto escuro, em baixo de uma janela aberta, e quando Benevides chamou-o, Rex,Rex, vem cá, o cachorro pulou de alegria e lambeu a mão vermelha do seu dono, parecendo já recuperado do ferimento. Benevides mostrou os pedaços para Rex, que latiu baixinho de felicidade, e logo depois estava os dois, guarda e cachorro, sentados sob a luz da fogueira, um olhando o outro comer, os dois igualmente com uma alegria indescritível em seus rostos cansados.
Fazia dois anos que Rex se fora. Seu Benevides não foi trabalhar no fatídico dia, passou a noite chorando em casa. Depois que se recuperou, nunca mais encontrou outro cachorro decente. De vez em quando achava um na rua, perdido, levava para casa, treinava-o, mas logo depois eles iam embora, ingratos. No mês passado, tinha encontrado um igual ao Rex, mas igualzinho mesmo. Ficou intrigado porque Rex nunca teve filho, Benevides nunca deixou seu cachorro por aí para engravidar cachorrinhas interessadas no seu sêmen de campeão. Mas, de alguma forma, o cachorro era igualzinho a Rex, e só poderia ser filho dele, ou quem sabe pai, porque Rex morreu cedo, com 4 anos .
Observou o cachorro parecido com Rex por algumas semanas, conheceu seu dono, viu sua casa, seus hábitos, onde passeava, suas vizinhas. Descobriu então que o cachorro era irmão gêmeo de Rex. O dono namorava a moça loira que morava no prédio do Juca, seu primo, e todo dia que vinha visitar a namorada trazia o irmão do Rex junto. Uma semana atrás, tinha tido o primeiro contato com o bicho, numa esbarrada. O cachorro saiu correndo lépido pelo corredor do prédio e Benevides, que conversava com Juca, parou e fez uns carinhos no cão, que logo se acalmou e se fez de morto, para a alegria de Benevides que assim o acariciou com vigor, passando sua mão vermelha por todo o corpo tez do cachorro. Ali fez uma promessa: o cachorro ia ser seu, de qualquer maneira.
Arquitetou um plano que não poderia ter falhas, porque só teria uma chance, era matar ou morrer.
Não queria envolver seu primo Juca, mas era a única forma, não tinha muito tempo. Sabia que o irmão do Rex estava sendo cortejado pela cachorra do prédio vizinho. Já tinham até marcado um encontro para ver se os dois se dariam bem, e os donos aprovavam a união, torcendo para que dali saísse muitos cachorrinhos . Benevides pediu para Juca : quando o dono do irmão do Rex estiver saindo da casa da namorada, avisa que tem um moço que quer falar com ele na frente do prédio. Não deu mais detalhes , não precisava envolver demais as pessoas para uma coisa que iria ser só sua, unicamente sua . Juca fez o combinado. Benevides esperava ansioso na calçada, com a mão no bolso apertando ferozmente a calça jeans. Quando avistou o moço, tratou de se aproximar devagar, com cuidado para não apavorá-lo. Perguntou, educadamente, como era o nome do cachorro. Sabia que era Kuki , mas achou que era uma boa primeira pergunta. O homem respondeu , também educadamente, e Benevides se abaixou para fazer carinho no irmão do Rex. Enquanto fazia carinho, puxou seu cacetete de aço de dentro do casaco, devagar , e deu uma paulada na nuca do moço, que estava de costas para ele. Pum. O moço já caiu desmaiado no chão. Agora tinha que agir rápido. Pegou o cachorro no colo e saiu correndo em direção à casa abandonada da esquina. Ao redor de uma pequena fogueira, fez o bicho deitar, deu água, fez carinho até ele se acalmar e quase dormir, bocejando . Então saiu , voltou para o prédio. Viu o homem ali na frente, que ainda estava acordado, inexplicavelmente.
Onde está meu cachorro ?
Era só o que dizia o homem, deitado na calçada com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
Benevides não sabia o que responder. Tentou se acalmar. Disse que não tinha visto cachorro algum ali , que ia chamar uma ambulância , se o moço quisesse, para tratar da cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
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quinta-feira, dezembro 01, 2005
Indagações de um incompreendido
Ah, se as pessoas soubessem que a crítica, por mais arrogante que possa parecer, não é com a intenção de diminuir alguém ou algo, mas com a simples e singela intenção de ajudar a melhorar. O que pode estar errado é o ponto de vista defendido por quem critica, mas, acredito eu, na maioria das vezes que a crítica é veemente, teimosa, é porque quem a faz está muito certo de que aquilo é o melhor caminho, que a coragem de se expor ao criticar é uma forma de garantir a honestidade e a intenção de ajudar a melhorar o algo/alguém criticado.
Claro, posso estar completamente equivocado nisso.
Ah, seu eu aguento ouvir
outro não, quem sabe um talvez
ou um sim
eu mereço enfim
é que eu já sei de cor
qual o quê dos quais
e poréns, dos afins, pense bem
ou não pense assim
- Los Hermanos, Paquetá -
Claro, posso estar completamente equivocado nisso.
Ah, seu eu aguento ouvir
outro não, quem sabe um talvez
ou um sim
eu mereço enfim
é que eu já sei de cor
qual o quê dos quais
e poréns, dos afins, pense bem
ou não pense assim
- Los Hermanos, Paquetá -
quarta-feira, novembro 30, 2005
Espetáculo
.
Algumas palavras sobre o show do Pearl Jam segunda, no gigantinho, em Porto Alegre. Da Zero Hora:
"Conta-se nos dedos de uma mão os shows de rock realizados em Porto Alegre tão arrebatadores e comoventes como este do Pearl Jam na segunda à noite, no Gigantinho. A competência, o carisma e empatia dos cinco amigos que sobre o palco parecem se entregar ao seu público com a mesma paixão e diversão dos tempos da efervescência grunge nos bares de Seattle, mais de 10 anos atrás, em combinação com a grande expectativa dos fãs, criou no ginásio um quase indescritível astral de celebração - que poderia ser ilustrado pela quantidade de gente chorando no acender das luzes."
Desabafo de um fã (eu):
"Acho que nunca fiquei tão emocionado quando na hora que eles tocaram "Alive"; minha banda predileta tocando, na minha frente, a minha música predileta, a que eu mais gostei e escutei até hoje, e ainda contando com o coro de 12.500 pessoas, a maioria abraçados, levantando a mão, pulando, chorando, gritando...
Catarse total."
Algumas palavras sobre o show do Pearl Jam segunda, no gigantinho, em Porto Alegre. Da Zero Hora:
"Conta-se nos dedos de uma mão os shows de rock realizados em Porto Alegre tão arrebatadores e comoventes como este do Pearl Jam na segunda à noite, no Gigantinho. A competência, o carisma e empatia dos cinco amigos que sobre o palco parecem se entregar ao seu público com a mesma paixão e diversão dos tempos da efervescência grunge nos bares de Seattle, mais de 10 anos atrás, em combinação com a grande expectativa dos fãs, criou no ginásio um quase indescritível astral de celebração - que poderia ser ilustrado pela quantidade de gente chorando no acender das luzes."
Desabafo de um fã (eu):
"Acho que nunca fiquei tão emocionado quando na hora que eles tocaram "Alive"; minha banda predileta tocando, na minha frente, a minha música predileta, a que eu mais gostei e escutei até hoje, e ainda contando com o coro de 12.500 pessoas, a maioria abraçados, levantando a mão, pulando, chorando, gritando...
Catarse total."
segunda-feira, novembro 28, 2005
Pearl Jam
Deixando a impessoalidade de lado:
Hoje vou realizar quase que um sonho de muito tempo: ver um show da minha banda preferida. A primeira que eu comprei um cd, a primeira que eu fui conhecer a fundo, a primeira que eu comprei uma camiseta, a primeira (e talvez única) que eu "torço", aquela que tem as letras as quais eu mais me "identifico" , a única que até das músicas ruins eu sou capaz de gostar, coisa e tal. Ainda de brinde virá uma outra banda na abertura que eu também curto bastante, Mudhoney.
P.S: Desculpem o sentimentalismo exacerbado, mas é a minha banda preferida, pô!
Hoje vou realizar quase que um sonho de muito tempo: ver um show da minha banda preferida. A primeira que eu comprei um cd, a primeira que eu fui conhecer a fundo, a primeira que eu comprei uma camiseta, a primeira (e talvez única) que eu "torço", aquela que tem as letras as quais eu mais me "identifico" , a única que até das músicas ruins eu sou capaz de gostar, coisa e tal. Ainda de brinde virá uma outra banda na abertura que eu também curto bastante, Mudhoney.
P.S: Desculpem o sentimentalismo exacerbado, mas é a minha banda preferida, pô!
sábado, novembro 26, 2005
Broken Hearts
.
Micro conto (sem limite para o título, 50 palavras para o resto).
Diálogo de um casal que tinha tudo para dar certo, mas que ela não conseguiu gostar dele como ele gostava dela.
_...
_É assim mesmo, querido.
___________________________________________________________
"I don’t know why but I’m feeling so sad
I long to try something I never had"
Billie Holiday - Lover man
Micro conto (sem limite para o título, 50 palavras para o resto).
Diálogo de um casal que tinha tudo para dar certo, mas que ela não conseguiu gostar dele como ele gostava dela.
_...
_É assim mesmo, querido.
___________________________________________________________
"I don’t know why but I’m feeling so sad
I long to try something I never had"
Billie Holiday - Lover man
quarta-feira, novembro 23, 2005
Complexo de Cavalheirismo
Um texto interessante, de um "mal" da pós-modernidade.
O Complexo de Cavalheirismo
Certas pessoas, as que sofrem mais para "dar certo" em relacionamentos, sofrem de um mal cada vez mais comuns nos tempos modernos: o complexo de cavalheirismo. Com o advento da "paridade" de comportamento entre homens e mulheres no relacionamento, de uma igualdade que sempre deveria de ser assim mas que só agora, quebrada a barreira cultural que inferiozava as mulheres, é, muitos homens afetados pelo caótico pós-modernismo tentam tratar as mulheres da forma que eles acham que elas merecem, ou seja, a melhor possível.
Gostam de fazer coisas que até algumas décadas atrás eram tabus, como discutir o relacionamento, porque querem agradá-las da melhor maneira, esclarecer as dúvidas do relacionamento a fim dele ficar mais forte e durável.
Gostam de ser carinhosos com suas parceiras por necessitarem disso, claro, mas o individualismo de alguns anos atrás deu lugar a uma preocupação maior com o outro( a outra, no caso) e isso faz com que eles dêem carinho e atenção em dose dupla, por precisarem e por achar que as mulheres também precisam.
Mas toda essa preocupação, essa percepção de certa forma inédita do homem pós-moderno, não encontra respaldo no outro lado, o feminino. Por mais que a igualdade está definida e não mais têm volta (na verdade, isso sempre foi definido, mas só agora percebido), em certos aspectos a mulher moderna parece que sente "falta" de certos costumes das suas antepassadas recentes que eram muito cortejadas antes e muito servis a quem os cortejou depois. Elas não entendem quem quer "discutir a relação"; acham estranho algum homem querer saber como anda o tal relaciomento e questioná-lo na tentativa de o fazer mais forte, menos suscetível a objeções externas, e essa não-compreensão parece realçar a busca de costumes das antepassadas que ainda não eram consideradas "iguais". Então, buscam aquele que guarda certos traços dos homens daquela época, como por exemplo o entendimento do casal não se dar na discussão, mas na ação ou na falta dela.
O complexo de cavalheirismo, esse paradoxo de doença, se caracteriza por guardar alguns resquícios do homem que tinha a mulher como apenas "companheira para cuidar dos filhos", como o cortejamento antes da relação, e características do homem pós-moderno, como o respeito à igualdade dos sexos e a busca de uma melhor compreensão do outro lado. Só que, ao contrário de ser uma vantagem, o complexo de cavalheirismo, como o nome já diz, é um mal, uma doença, pois parece que no ponto em que o homem portador é conservador, a mulher é liberal, e no ponto que ele é liberal - como buscar o entendimento através de "discutir a relação" - ela é conservadora. Um desencontro certo.
Receitas para o portador do complexo de cavalheirismo são pouco confiáveis ainda, visto que é um mal do pós-modernismo que não teve tempo para o estudo detalhado. Mas algumas sugestões de cura causam bons resultados até, apesar de serem vistas por alguns como bastante polêmicas: tornar o homem portador menos cavalheiro, mais da ação do que das palavras, evitar o "discutir a relação" e passar para o "perceber a relação". Outra sugestão, ainda mais polêmica e difícil, é buscar as companheiras que guardam bastante pontos em comuns com suas antepassadas, as que ainda mantêm os costumes antigos e não gostam da tal modernização. Mas, na medida que o homem portador tem um certo nível de "inquietude intelectual" e não consegue pensar que está tratando uma mulher como um homem antigo, rude, cruel às vezes, se torna bastante difícil a cura por essa sugestão.
O que resta ao portador é se divertir enquanto a dita "alma gêmea", um fruto da pós-modernidade com a antiguidade clássica, não se apaixone verdadeiramente por ele, pois se isso acontece, tudo muda e se torna mais difícil de dar errado.
O Complexo de Cavalheirismo
Certas pessoas, as que sofrem mais para "dar certo" em relacionamentos, sofrem de um mal cada vez mais comuns nos tempos modernos: o complexo de cavalheirismo. Com o advento da "paridade" de comportamento entre homens e mulheres no relacionamento, de uma igualdade que sempre deveria de ser assim mas que só agora, quebrada a barreira cultural que inferiozava as mulheres, é, muitos homens afetados pelo caótico pós-modernismo tentam tratar as mulheres da forma que eles acham que elas merecem, ou seja, a melhor possível.
Gostam de fazer coisas que até algumas décadas atrás eram tabus, como discutir o relacionamento, porque querem agradá-las da melhor maneira, esclarecer as dúvidas do relacionamento a fim dele ficar mais forte e durável.
Gostam de ser carinhosos com suas parceiras por necessitarem disso, claro, mas o individualismo de alguns anos atrás deu lugar a uma preocupação maior com o outro( a outra, no caso) e isso faz com que eles dêem carinho e atenção em dose dupla, por precisarem e por achar que as mulheres também precisam.
Mas toda essa preocupação, essa percepção de certa forma inédita do homem pós-moderno, não encontra respaldo no outro lado, o feminino. Por mais que a igualdade está definida e não mais têm volta (na verdade, isso sempre foi definido, mas só agora percebido), em certos aspectos a mulher moderna parece que sente "falta" de certos costumes das suas antepassadas recentes que eram muito cortejadas antes e muito servis a quem os cortejou depois. Elas não entendem quem quer "discutir a relação"; acham estranho algum homem querer saber como anda o tal relaciomento e questioná-lo na tentativa de o fazer mais forte, menos suscetível a objeções externas, e essa não-compreensão parece realçar a busca de costumes das antepassadas que ainda não eram consideradas "iguais". Então, buscam aquele que guarda certos traços dos homens daquela época, como por exemplo o entendimento do casal não se dar na discussão, mas na ação ou na falta dela.
O complexo de cavalheirismo, esse paradoxo de doença, se caracteriza por guardar alguns resquícios do homem que tinha a mulher como apenas "companheira para cuidar dos filhos", como o cortejamento antes da relação, e características do homem pós-moderno, como o respeito à igualdade dos sexos e a busca de uma melhor compreensão do outro lado. Só que, ao contrário de ser uma vantagem, o complexo de cavalheirismo, como o nome já diz, é um mal, uma doença, pois parece que no ponto em que o homem portador é conservador, a mulher é liberal, e no ponto que ele é liberal - como buscar o entendimento através de "discutir a relação" - ela é conservadora. Um desencontro certo.
Receitas para o portador do complexo de cavalheirismo são pouco confiáveis ainda, visto que é um mal do pós-modernismo que não teve tempo para o estudo detalhado. Mas algumas sugestões de cura causam bons resultados até, apesar de serem vistas por alguns como bastante polêmicas: tornar o homem portador menos cavalheiro, mais da ação do que das palavras, evitar o "discutir a relação" e passar para o "perceber a relação". Outra sugestão, ainda mais polêmica e difícil, é buscar as companheiras que guardam bastante pontos em comuns com suas antepassadas, as que ainda mantêm os costumes antigos e não gostam da tal modernização. Mas, na medida que o homem portador tem um certo nível de "inquietude intelectual" e não consegue pensar que está tratando uma mulher como um homem antigo, rude, cruel às vezes, se torna bastante difícil a cura por essa sugestão.
O que resta ao portador é se divertir enquanto a dita "alma gêmea", um fruto da pós-modernidade com a antiguidade clássica, não se apaixone verdadeiramente por ele, pois se isso acontece, tudo muda e se torna mais difícil de dar errado.
terça-feira, novembro 22, 2005
Reportagem
Reportagem do primeiro semestre desse ano sobre o festival "Nossas Expressões", organizado pelo DCE da UFSM. Tentativa de enquadramento daquela velha história de Novo Jornalismo ( que de tão novo já ficou velho há muito tempo) que, na sua mais fácil definição, é aquele relato feito em primeira pessoa com recursos estilísticos "emprestados" da literatura.
Nossas Expressões: o tradicional festival cultural luta para se manter vivo sem se esquecer do passado
Segunda feira, 13 de junho, meio-dia e quatro. Depois de enfrentar longa fila, entrou no Restaurante Universitário, largou a pasta, lavou as mãos e foi comer. Galinha com molho, polenta,arroz, salada, e um mandolate de sobremesa. “Hoje a comida tá boa”, pensou, tentando se lembrar da última vez que tinha visto a polenta que tanto adorava no cardápio do R.U. Almoçou rápido até, em vinte minutos, pegou sua pasta, escovou os dentes no banheiro do prédio da união, e então se deu por conta: tinha uma tenda ali na frente. De lá, saía um som melodioso, imponente, certamente tocado por várias pessoas, já que não enxergava nada de onde estava. Procurou um lugar na multidão, avistou o “palco” – um tablado cinza em cima dos paralelepípedos. Músicos das mais variadas idades tocavam seus instrumentos: a menina de uns 12 anos segurava seu pequeno violino olhando com desconfiança para a platéia; o homem de cabelos brancos tocava e balançava seu violoncelo, quase dançando; a menina da percussão, de uns 20 anos, olhava constrangida para a esquerda da orquestra onde seu pai tirava fotos, orgulhoso da apresentação da filha. Não era tão estranho ter música ao vivo na frente da União, mas a curiosidade lhe fez perguntar para o que estava ao seu lado:
_ Tche, o que é isso?
_ É um festival, Nossas Expressões parece. Esse pessoal aí é a Orquestra Jovem de Santa Maria, pelo que falaram.
Nossas Expressões. Um dos festivais mais importantes do estado nos anos 80, sinônimo de música boa e variada, expressão de rebeldia dos estudantes na época da ditadura militar, cultura alternativa feita, organizada e divulgada por estudantes. Em sua 16 º edição, o Nossas Expressões de hoje guarda duas características dos antigos festivais: quem organiza ainda é o DCE (Diretório Central dos Estudantes da UFSM), e quem ministra as oficinas ainda são os estudantes da UFSM. E só. Para as pessoas que viveram o Nossas Expressões dos anos 80 e do início dos anos 90, o festival de hoje passa longe do furdunço que era naquela época. “O pessoal fazia cartazes enormes,bonitos, divulgava por toda a cidade e o estádio do Inter-Sm, onde por alguns anos aconteceu o festival, sempre estava cheio”, conta Marta Marchesan, estudante naquela época, hoje coordenadora geral da TV Campus.
Criado em 1983 como um festival de bandas, o Nossas Expressões mais tarde incorporou outras atividades culturais em sua programação, como oficinas de teatro e exposições de trabalhos dos estudantes.
“Lembro de tocar com numa das edições que foi realizada no estádio do Inter-Sm. Os shows atrasavam bastante, mas o pessoal ,com chuva e tudo, não arredava o pé”, conta o funcionário do departamento de música, Luis Martins.
Em uma época em que se sabia com clareza quem era o “inimigo” , os estudantes aproveitavam qualquer junção para protestar contra a ditadura e a censura, o que acabava se tornando um incentivo a mais para que eles participassem de eventos desse tipo. Algo que, hoje, não acontece mais. Sendo ligado ao movimento estudantil, um festival do tipo do Nossas Expressões pode servir de “termômetro” da ação dos estudantes. Quando o movimento estudantil era forte, o festival era forte. E o Nossas Expressões foi forte até o início dos anos 90. Depois parou. Hoje, há uma tentativa de retomada das duas partes, do movimento estudantil e do festival. Mas agora não é mais só o contexto político que influencia a participação ou não no festival.Há de se considerar que a opção de lazer e de entretenimento dos estudantes hoje é muito maior. “Hoje a gurizada só quer saber de computador, internet, videogame”, diz Luis Martins. Os estudantes saem do RU, dão uma olhada nas atrações musicais, passam pelas bancas de artesanato e vão para a aula. Não participam mais. São poucos os que ficam em todos os shows, participam das oficinas, assistem as peças de teatro, os filmes. È nítido o empenho dos organizadores, mas também é nítido o desinteresse dos estudantes.Mas não há de se culpar alguém, nem de se lamentar : o contexto é outro, mas o festival continua (tentando) ser o mesmo. Aí que está o problema.
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Nossas Expressões: o tradicional festival cultural luta para se manter vivo sem se esquecer do passado
Segunda feira, 13 de junho, meio-dia e quatro. Depois de enfrentar longa fila, entrou no Restaurante Universitário, largou a pasta, lavou as mãos e foi comer. Galinha com molho, polenta,arroz, salada, e um mandolate de sobremesa. “Hoje a comida tá boa”, pensou, tentando se lembrar da última vez que tinha visto a polenta que tanto adorava no cardápio do R.U. Almoçou rápido até, em vinte minutos, pegou sua pasta, escovou os dentes no banheiro do prédio da união, e então se deu por conta: tinha uma tenda ali na frente. De lá, saía um som melodioso, imponente, certamente tocado por várias pessoas, já que não enxergava nada de onde estava. Procurou um lugar na multidão, avistou o “palco” – um tablado cinza em cima dos paralelepípedos. Músicos das mais variadas idades tocavam seus instrumentos: a menina de uns 12 anos segurava seu pequeno violino olhando com desconfiança para a platéia; o homem de cabelos brancos tocava e balançava seu violoncelo, quase dançando; a menina da percussão, de uns 20 anos, olhava constrangida para a esquerda da orquestra onde seu pai tirava fotos, orgulhoso da apresentação da filha. Não era tão estranho ter música ao vivo na frente da União, mas a curiosidade lhe fez perguntar para o que estava ao seu lado:
_ Tche, o que é isso?
_ É um festival, Nossas Expressões parece. Esse pessoal aí é a Orquestra Jovem de Santa Maria, pelo que falaram.
Nossas Expressões. Um dos festivais mais importantes do estado nos anos 80, sinônimo de música boa e variada, expressão de rebeldia dos estudantes na época da ditadura militar, cultura alternativa feita, organizada e divulgada por estudantes. Em sua 16 º edição, o Nossas Expressões de hoje guarda duas características dos antigos festivais: quem organiza ainda é o DCE (Diretório Central dos Estudantes da UFSM), e quem ministra as oficinas ainda são os estudantes da UFSM. E só. Para as pessoas que viveram o Nossas Expressões dos anos 80 e do início dos anos 90, o festival de hoje passa longe do furdunço que era naquela época. “O pessoal fazia cartazes enormes,bonitos, divulgava por toda a cidade e o estádio do Inter-Sm, onde por alguns anos aconteceu o festival, sempre estava cheio”, conta Marta Marchesan, estudante naquela época, hoje coordenadora geral da TV Campus.
Criado em 1983 como um festival de bandas, o Nossas Expressões mais tarde incorporou outras atividades culturais em sua programação, como oficinas de teatro e exposições de trabalhos dos estudantes.
“Lembro de tocar com numa das edições que foi realizada no estádio do Inter-Sm. Os shows atrasavam bastante, mas o pessoal ,com chuva e tudo, não arredava o pé”, conta o funcionário do departamento de música, Luis Martins.
Em uma época em que se sabia com clareza quem era o “inimigo” , os estudantes aproveitavam qualquer junção para protestar contra a ditadura e a censura, o que acabava se tornando um incentivo a mais para que eles participassem de eventos desse tipo. Algo que, hoje, não acontece mais. Sendo ligado ao movimento estudantil, um festival do tipo do Nossas Expressões pode servir de “termômetro” da ação dos estudantes. Quando o movimento estudantil era forte, o festival era forte. E o Nossas Expressões foi forte até o início dos anos 90. Depois parou. Hoje, há uma tentativa de retomada das duas partes, do movimento estudantil e do festival. Mas agora não é mais só o contexto político que influencia a participação ou não no festival.Há de se considerar que a opção de lazer e de entretenimento dos estudantes hoje é muito maior. “Hoje a gurizada só quer saber de computador, internet, videogame”, diz Luis Martins. Os estudantes saem do RU, dão uma olhada nas atrações musicais, passam pelas bancas de artesanato e vão para a aula. Não participam mais. São poucos os que ficam em todos os shows, participam das oficinas, assistem as peças de teatro, os filmes. È nítido o empenho dos organizadores, mas também é nítido o desinteresse dos estudantes.Mas não há de se culpar alguém, nem de se lamentar : o contexto é outro, mas o festival continua (tentando) ser o mesmo. Aí que está o problema.
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domingo, novembro 20, 2005
Futebol, indignação, perplexidade, surpresa
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O futebol, em sua magia que desperta as mais variadas formas de um único sentimento chamado paixão, não é o esporte mais popular do mundo por acaso. É especial, uma junção de pessoas desconhecidas entre si mas que , nesse mundo à parte feito por gente de coração forte, se torna unida umbilicalmente, tão suscetíveis a sentimentos fortes que quando são tocados em seu íntimo por um gol, explodem, gritam, pulam, saem de si em instantes que o tempo para e só volta a andar quando todo esse êxtase é diluído em doses homeopáticas de realidade extra-campo, de uma vida real que o futebol insiste em não querer fazer parte para poder, assim, fazer o que bem entender com a sua vida.
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Desabafo de um colorado (eu)
A cada dia me impressiono com o alcance de um esporte na vida das pessoas. Hoje, depois de ver meu time ser roubado, não consigo não pensar, ver, escutar, ler sobre o jogo, e quando vejo que a minha indignação encontra solidariedade na de tantas pessoas que nem torcem pro meu time, mais indignado fico, e mais difícil fica deixar de ver/ler/escutar algo sobre o jogo. E o pior é que parece que não cansa...
O futebol, em sua magia que desperta as mais variadas formas de um único sentimento chamado paixão, não é o esporte mais popular do mundo por acaso. É especial, uma junção de pessoas desconhecidas entre si mas que , nesse mundo à parte feito por gente de coração forte, se torna unida umbilicalmente, tão suscetíveis a sentimentos fortes que quando são tocados em seu íntimo por um gol, explodem, gritam, pulam, saem de si em instantes que o tempo para e só volta a andar quando todo esse êxtase é diluído em doses homeopáticas de realidade extra-campo, de uma vida real que o futebol insiste em não querer fazer parte para poder, assim, fazer o que bem entender com a sua vida.
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Desabafo de um colorado (eu)
A cada dia me impressiono com o alcance de um esporte na vida das pessoas. Hoje, depois de ver meu time ser roubado, não consigo não pensar, ver, escutar, ler sobre o jogo, e quando vejo que a minha indignação encontra solidariedade na de tantas pessoas que nem torcem pro meu time, mais indignado fico, e mais difícil fica deixar de ver/ler/escutar algo sobre o jogo. E o pior é que parece que não cansa...
sábado, novembro 19, 2005
devaneios (3)
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Entre inúmeras chances de desfazer o tão sonhado caminho do destino, resolvi esquecer tudo, seguir por uma outra estrada. Uma involução ou uma evolução ? Não sei, apesar da forte suspeita de que seja nem uma nem outra, e muito menos aquela que esclarecerá a minha dúvida. Penso que algum destino me servirá de chão para novos vôos em busca de um outro, mas, enfim, dessas coisas ninguém sabe, por mais que possa se pensar que temos plenas condições de saber. Melhor opção? Vou ser um utópico construtor da minha própria utopia, se conseguir sobreviver ao hercúleo trabalho.
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Das frases bonitas sem fundamento:
O amargo do amor é a felicidade dos desgraçados
Entre inúmeras chances de desfazer o tão sonhado caminho do destino, resolvi esquecer tudo, seguir por uma outra estrada. Uma involução ou uma evolução ? Não sei, apesar da forte suspeita de que seja nem uma nem outra, e muito menos aquela que esclarecerá a minha dúvida. Penso que algum destino me servirá de chão para novos vôos em busca de um outro, mas, enfim, dessas coisas ninguém sabe, por mais que possa se pensar que temos plenas condições de saber. Melhor opção? Vou ser um utópico construtor da minha própria utopia, se conseguir sobreviver ao hercúleo trabalho.
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Das frases bonitas sem fundamento:
O amargo do amor é a felicidade dos desgraçados
quinta-feira, novembro 17, 2005
Rayuela
Rayuela, do mestre argentino Julio Cortázar. Trecho do capítulo 72, o primeiro, se for seguido a ordem que ele nos indica no início.
"Si, pero quién nos curará del fuego surdo,del fuego sin color que corre al anochecer pela rue de la Huchette, saliendo de los portales carcomidos, de los parvos zaguanes, del fuego sin imagen que lame las piedras y acecha en los vanos de las puertas, cómo haremos para lavarnos de su queimadura dulce que prosigue, que se aposenta para durar aliada al tiempo y al recuerdo, a las sustancias pegajoas que retienem de este lado, y que nos arderá dulcimente hasta calcinarmos.(...) Ardiendo así sin trégua,, soportando la quemadura central que avanza como la madurez paulatina en el fruto, ser el pulso de una hoguera en esta maraña de piedra interminable, caminar por las noches de nuestra vida com la obediencia de la sangre en su circuito ciego".
"Si, pero quién nos curará del fuego surdo,del fuego sin color que corre al anochecer pela rue de la Huchette, saliendo de los portales carcomidos, de los parvos zaguanes, del fuego sin imagen que lame las piedras y acecha en los vanos de las puertas, cómo haremos para lavarnos de su queimadura dulce que prosigue, que se aposenta para durar aliada al tiempo y al recuerdo, a las sustancias pegajoas que retienem de este lado, y que nos arderá dulcimente hasta calcinarmos.(...) Ardiendo así sin trégua,, soportando la quemadura central que avanza como la madurez paulatina en el fruto, ser el pulso de una hoguera en esta maraña de piedra interminable, caminar por las noches de nuestra vida com la obediencia de la sangre en su circuito ciego".
terça-feira, novembro 15, 2005
O guardião da sinceridade à serviço dos escravos da verdade
"Nosso amor é tão bonito. Você finge que me ama e eu finjo que acredito."
Nelson Sargento
Sim, realmente é complicado quando se tem pudor demais.
Quando há alguma "forçada de barra", por mais sútil que ela seja, há aquele constrangimento interior que chama consigo o pudor, o medo de se fazer coisas que poderiam até serem encaradas como normais diante de determinada situação, mas que só podem ser consideradas normais se haver uma "mentira" nelas - eu minto e tu acredita, funciona assim. Mas a sinceridade não consegue aceitar que a mentira seja o mais importante pré-requisito de uma situação, por isso ela cria o pudor: uma forma de barreira para a situação mentirosa não passar. É difícil para todo mundo viver numa mentira, mas para determinadas pessoas isso é mais difícil ainda, a ponto delas não admitirem , nunca, a mentira como pré-requisito para se vivenciar certas experiências - e situações que a mentira faz esse papel são bastante normais.
Claro, perde-se com isso. Muitas situações mentirosas são extremamente prazerosas. Outras, começam com uma mentira e se tornam belas verdades. Mas para quem tem o pudor excessivo, ou sinceridade demais, ou são escravos da verdade, não há como aceitar isso, é algo que vem de criança, da educação que nos é dada, de todo um contexto que já deixou suas marcas profundas, que não mais pode voltar atrás.
Há um constrangimento que puxa para fora da situação mentirosa, um alerta, um bip dizendo "isso é uma mentira, não seja ridículo, largue disso", e se não se obedece ao alerta fica-se , a todo tempo, incomodado com a situação, não se aproveita como talvez fosse o devido - a não ser, claro, que algumas substâncias façam com que essa distinção seja imperceptível.
Por isso é tão difícil fingir, por isso o pudor é requisitado a toda hora que a sinceridade percebe uma mentira, por isso o constrangimento até excessivo diante de certas situações a ponto de outros não conseguirem compreender e ficarem chateados com algo que consideram como "caretice" até.
Mais fácil mudar ou mascarar as próprias verdades do que se fazer acreditar em mentiras reconhecidas como tal.
Nelson Sargento
Sim, realmente é complicado quando se tem pudor demais.
Quando há alguma "forçada de barra", por mais sútil que ela seja, há aquele constrangimento interior que chama consigo o pudor, o medo de se fazer coisas que poderiam até serem encaradas como normais diante de determinada situação, mas que só podem ser consideradas normais se haver uma "mentira" nelas - eu minto e tu acredita, funciona assim. Mas a sinceridade não consegue aceitar que a mentira seja o mais importante pré-requisito de uma situação, por isso ela cria o pudor: uma forma de barreira para a situação mentirosa não passar. É difícil para todo mundo viver numa mentira, mas para determinadas pessoas isso é mais difícil ainda, a ponto delas não admitirem , nunca, a mentira como pré-requisito para se vivenciar certas experiências - e situações que a mentira faz esse papel são bastante normais.
Claro, perde-se com isso. Muitas situações mentirosas são extremamente prazerosas. Outras, começam com uma mentira e se tornam belas verdades. Mas para quem tem o pudor excessivo, ou sinceridade demais, ou são escravos da verdade, não há como aceitar isso, é algo que vem de criança, da educação que nos é dada, de todo um contexto que já deixou suas marcas profundas, que não mais pode voltar atrás.
Há um constrangimento que puxa para fora da situação mentirosa, um alerta, um bip dizendo "isso é uma mentira, não seja ridículo, largue disso", e se não se obedece ao alerta fica-se , a todo tempo, incomodado com a situação, não se aproveita como talvez fosse o devido - a não ser, claro, que algumas substâncias façam com que essa distinção seja imperceptível.
Por isso é tão difícil fingir, por isso o pudor é requisitado a toda hora que a sinceridade percebe uma mentira, por isso o constrangimento até excessivo diante de certas situações a ponto de outros não conseguirem compreender e ficarem chateados com algo que consideram como "caretice" até.
Mais fácil mudar ou mascarar as próprias verdades do que se fazer acreditar em mentiras reconhecidas como tal.
segunda-feira, novembro 14, 2005
A volta
Voltei. Cansei de "alternativos" que se vestem de "alternativos", agem como "alternativos", tudo modestamente falso, ou "fake" como eles dizem. Vestem-se de "alternativos"; colocam a roupinha "sou diferente", gosto de coisas diferentes só para poderem dizer aos outros,e também porque está incluído na fantasia que retiram todo dia na loja da frente de casa.
ÔÔ cambada de gente falsa!
Mas experiências e mais experiências, nem todas são boas, nem todas são ruins. Mas dessa vez muitas foram ruins. Pelo menos, de forma parecida ou igual é que não vão ser mais, e isso vale alguma coisa, poupa esforços e pensamentos depois.
ÔÔ cambada de gente falsa!
Mas experiências e mais experiências, nem todas são boas, nem todas são ruins. Mas dessa vez muitas foram ruins. Pelo menos, de forma parecida ou igual é que não vão ser mais, e isso vale alguma coisa, poupa esforços e pensamentos depois.
sexta-feira, novembro 11, 2005
Uma boa viagem!
"Através da ponte sobre o rio estarão as flores do auto conhecimento, e quanto mais difícil for a travessia mais as flores estarão amadurecidas, mas tem de se ter o cuidado de não fazer com que elas amadureçam demais e murchem - uma longa travessia cheia dos dissabores podem causar isso; se , por um acaso, se cair no rio, mais difícil ainda será a volta, embora como toda boa volta consciente, será melhor aproveitada e encontrará as flores mais rapidamente, pois elas sempre estão a espera de quem as necessita. A dor que não é fingida sempre tem as suas consequências benéficas..."
Estou indo fazer uma breve viagem, acampar. Por isso:
Uma boa viagem ao conhecido imprevisível recheado de grande potencial de situações extraordinárias!
Estou indo fazer uma breve viagem, acampar. Por isso:
Uma boa viagem ao conhecido imprevisível recheado de grande potencial de situações extraordinárias!
quinta-feira, novembro 10, 2005
Situações extraordinárias
Situações extraordinárias e suas fantasias de surpresas - tão convicencentes como aquele tipo de ator que obecede a decisão do diretor de "não incorpore o personagem, simplesmente seja" - são tão indicativas de cisão de alguma coisa dentro de si que não se consegue perceber , ao menos no momento, o que realmente será diferente e onde está a ruptura, essa cisão que parece que só é sentida, mas não localizada. As piores transformações são decorrentes de outros fatores, mas as melhores vêm dessa cisão invisível e, portanto, aparente, embora que escrevendo isso me venha agora uma dúvida : o que é apenas sentido é aparente?
Fico na dúvida toda vez que acontece esse tipo de situação. Embora não seja mais tão extraordinário que situações extraordinárias aconteçam comigo, ainda assim , e que bom que é assim, me surpreendo. Mas em alguns momentos, consigo pensar do tão extraordinário que é aquela situação, e o fato de eu pensar nisso me põe em dúvida se realmente essa vai ser mesmo tão extraordinária daquelas dignas de uma cisão invisível, pois se me dou conta disso, ela não pode ser assim tão extraordinária. Mas acontece que não me dou conta disso em todo o momento; não conseguiria, e , por causa disso, é que há a possibilidade dessa situação estar sendo extraordinária. É como um transe; há a preparação anterior para o transe, que é consciente da situação de preparação mas inconsciente do que para quê está sendo preparada, e há o transe, que , como a preparação, é consciente da situação de transe que está, mas não sabe que tipo de transe é nem no que ele vai levar. As situações extraordinárias são assim, eu ,no início, sei que estou me preparando para ela ( posso estar me preparando para nada, mas enfim, essa certeza se adquire com o treino) e depois, quando entro nela, nem percebo que tipo de situação ela é, se é normal como qualquer outra ou pertence a nobre classe das extraordinárias, e nem no que essa situação vai me colocar, que consequência ela me trará, e que cisão invisível ela provocará, se é que provocará. Mas, enfim, nunca perceberei mesmo, e aí está o combustível que preciso para que outras dessas situações venham pela frente.
Fico na dúvida toda vez que acontece esse tipo de situação. Embora não seja mais tão extraordinário que situações extraordinárias aconteçam comigo, ainda assim , e que bom que é assim, me surpreendo. Mas em alguns momentos, consigo pensar do tão extraordinário que é aquela situação, e o fato de eu pensar nisso me põe em dúvida se realmente essa vai ser mesmo tão extraordinária daquelas dignas de uma cisão invisível, pois se me dou conta disso, ela não pode ser assim tão extraordinária. Mas acontece que não me dou conta disso em todo o momento; não conseguiria, e , por causa disso, é que há a possibilidade dessa situação estar sendo extraordinária. É como um transe; há a preparação anterior para o transe, que é consciente da situação de preparação mas inconsciente do que para quê está sendo preparada, e há o transe, que , como a preparação, é consciente da situação de transe que está, mas não sabe que tipo de transe é nem no que ele vai levar. As situações extraordinárias são assim, eu ,no início, sei que estou me preparando para ela ( posso estar me preparando para nada, mas enfim, essa certeza se adquire com o treino) e depois, quando entro nela, nem percebo que tipo de situação ela é, se é normal como qualquer outra ou pertence a nobre classe das extraordinárias, e nem no que essa situação vai me colocar, que consequência ela me trará, e que cisão invisível ela provocará, se é que provocará. Mas, enfim, nunca perceberei mesmo, e aí está o combustível que preciso para que outras dessas situações venham pela frente.
quarta-feira, novembro 09, 2005
Borges (2)
Outro trecho interessantíssimo:
"Vou procurar, então, recordar um conto meu. Enquanto me traziam para cá, fiquei pensando em um conto meu, não sei se vocês leram, e que se chama “El Zahir”. Vou lembrar como cheguei à concepção desse “conto”.
Não recordo a data em que o escrevi, sei apenas que era diretor da Biblioteca Nacional, que fica no sul de Buenos Aires, perto da igreja de La Concepción. Conheço bem esse bairro. Meu ponto de partida foi uma palavra, uma palavra que usamos quase todos os dias sem nos dar conta do mistério que nela há, exceto que todas as palavras são misteriosas. Pensei na palavra inesquecível. Unforgettable, em inglês. Detive-me, não sei por que, já que havia ouvido essa palavra milhares de vezes, quase não passava um dia sem que a ouvisse. Pensei: que coisa extraordinária seria se houvesse algo de que realmente não pudéssemos nos esquecer? Que fantástico seria se houvesse, no que chamamos realidade, uma coisa, um objeto, por que não?, que fosse realmente inesquecível!
Este foi meu ponto de partida, bastante abstrato e pobre: pensar no possível sentido dessa palavra ouvida, lida, literalmente inesquecível, unforgettable, unvergesslich, inouviable. Foi um consideração bastante pobre, como vocês podem ver.
Depois, pensei que se existe algo inesquecível, deve ser algo comum, já que se tivéssemos uma Quimera, por exemplo, um monstro de três cabeças, uma cabeça, se não me engano, de cobra, outra de serpente, outra de cão, não tenho certeza, certamente recordaríamos isto. De modo que não haveria graça nenhuma num conto com um minotauro, uma quimera, um unicórnio inesquecíveis. Não, teria que ser alguma coisa bem comum. Ao pensar nessa coisa comum, pensei imediatamente numa moeda, já que são cunhadas milhares e milhares de moedas absolutamente iguais. Todas com a efígie da liberdade ou um escudo, ou com certas palavras convencionais. Que coisa extraordinária seria se houvesse uma moeda, uma moeda perdida entre esses milhões de moedas, que fosse inesquecível. Pensei, assim, numa moeda que já saiu de circulação, uma moeda de vinte centavos, uma moeda igual às outras, igual à moeda de cinco ou à de dez centavos, um pouco maior. Que coisa extraordinária seria se, entre os milhões, literalmente, de moedas cunhadas pelo Estado, houvesse uma que fosse inesquecível. Daí surgiu-me uma idéia: uma inesquecível moeda de vinte centavos. Não sei se elas ainda existem, se os numismáticos as colecionam, se elas têm algum valor, mas, enfim, não pensei nisso naquele instante. Pensei numa moeda que, para os objetivos do meu conto, teria de ser inesquecível. Isto é, uma pessoa que a visse não poderia mais pensar em outra coisa.
Depois, encontrei-me diante da segunda ou terceira dificuldade. Perdi a conta das dificuldades. Por que essa moeda viria a ser inesquecível? O leitor não aceitaria tal idéia. Eu tinha de preparar o inesquecível da minha moeda, e para tanto convinha supor um estado emocional em que ele a via, tinha de insinuar a loucura, já que o tema de meu conto é um tema que se parece com a loucura ou a obsessão. Pensei, como pensou Edgar Allan Poe quando escreveu seu merecidamente famoso poema “O corvo”, na morte de uma mulher bonita. Poe se perguntou a quem poderia impressionar a morte dessa mulher bonita e deduziu que tinha de impressionar a alguém que estivesse apaixonado por ela. Daí cheguei a idéia de uma mulher, por quem, no conto, estou apaixonado, e que morre, o que me deixa desesperado. Neste ponto, teria sido fácil, talvez fácil demais, que essa mulher fosse como a perdida Leonor, de Poe. Mas, não. Decidi mostrar essa mulher de um modo satírico, mostrar o amor de quem não esquecerá a moeda de vinte centavos como um pouco ridículo. Todos os amores o são para quem os vê de fora. Assim, ao invés de falar da beleza do love splendor, converti-a numa mulher bastante trivial, um pouco ridícula, nem feia nem muito linda. Imaginei uma situação que ocorre com freqüência: um homem é apaixonado por uma mulher, não pode viver sem ela, mas, ao mesmo tempo, sabe que essa mulher não é especialmente recomendável, digamos, para sua mãe, para suas primas, para a camareira, para a costureira, para as amigas. No entanto, para ele, esse mulher é única.
Isto me levou a uma outra idéia: a de que talvez toda pessoa seja única e que nós não vemos o extraordinário que fala a favor dessa pessoa. Às vezes, penso que isto se dá em tudo. Senão, fixemo-nos no fato de que na natureza ou em Deus, Deus sive Natura, como dizia Spinoza, o importante é a quantidade e não a qualidade. Por que não supor, então, que haja algo singular em cada formiga e que por isso Deus, ou a natureza, cria milhões de formigas. O que é falso. Não há milhões de formigas, há milhões de seres diferentes, mas a diferença é tão sutil que nós as vemos como iguais.
O que é, pois, estar apaixonado? Estar apaixonado é perceber o que há de extraordinário em cada pessoa, singularidade essa que não pode ser comunicada a não ser por meio de hipérboles ou de metáforas. Então, por que não imaginar que essa mulher, um pouco ridícula para todos, pouco ridícula para quem está apaixonado por ela, que essa mulher morra. Depois, temos o velório. Escolhi o lugar do velório, escolhi a esquina, pensei na igreja da Conceição, uma igreja não muito famosa nem muito interessante, e no homem que, depois do velório, vai tomar um refresco num botequim. Paga, dão-lhe uma moeda de troco, e ele percebe, em seguida, que há algo nela: foi riscada, o que a diferencia das outras. Ele vê a moeda, está muito emocionado pela morte da mulher, mas, ao ver a moeda, já começa a se esquecer de tudo e a pensar somente na moeda. Eu tinha, assim, o objeto mágico para o conto. Depois é que surgem as tentativas do narrador de livrar-se de sua obsessão. Diversos artifícios são utilizados: um deles é perder a moeda. Leva-a, então, a outro botequim, distante dali. Usa-a para pagar, procura esquecer em que esquina o botequim se encontrava, mas isso não resolve o problema, ele continua pensando na moeda. Chega a extremos um tanto absurdos. Por exemplo, compra uma libra esterlina, com São Jorge e o dragão, examina-a com uma lupa, procura pensar nela e esquecer a moeda de vinte centavos, já perdida para sempre, mas não consegue livrar-se da lembrança. Até o final do conto, o homem vai enlouquecendo, mas pensa que essa mesma obsessão poderá salvá-lo. Isto é, haverá um momento no qual o Universo já terá desaparecido e o próprio Universo será uma moeda de vinte centavos. Então ele, e aqui produzi um pequeno efeito literário, ele, Borges, estará louco, não saberá mais que é Borges. Já não será outra coisa a não ser o espectador dessa perdida moeda inesquecível. E conclui com uma frase devidamente literária, isto é, falsa: “Talvez por detrás da moeda esteja Deus”. Ou seja, se alguém vê uma só coisa, essa coisa única é absoluta. Há outros episódios que esqueci, alguns talvez que vocês recordem. Ao final, ele não pode dormir, sonha com a moeda, não pode ler, a moeda se interpõe entre o texto e ele, quase não pode falar senão de um modo mecânico, por que realmente está pensando na moeda.
Assim termina o conto".
"Vou procurar, então, recordar um conto meu. Enquanto me traziam para cá, fiquei pensando em um conto meu, não sei se vocês leram, e que se chama “El Zahir”. Vou lembrar como cheguei à concepção desse “conto”.
Não recordo a data em que o escrevi, sei apenas que era diretor da Biblioteca Nacional, que fica no sul de Buenos Aires, perto da igreja de La Concepción. Conheço bem esse bairro. Meu ponto de partida foi uma palavra, uma palavra que usamos quase todos os dias sem nos dar conta do mistério que nela há, exceto que todas as palavras são misteriosas. Pensei na palavra inesquecível. Unforgettable, em inglês. Detive-me, não sei por que, já que havia ouvido essa palavra milhares de vezes, quase não passava um dia sem que a ouvisse. Pensei: que coisa extraordinária seria se houvesse algo de que realmente não pudéssemos nos esquecer? Que fantástico seria se houvesse, no que chamamos realidade, uma coisa, um objeto, por que não?, que fosse realmente inesquecível!
Este foi meu ponto de partida, bastante abstrato e pobre: pensar no possível sentido dessa palavra ouvida, lida, literalmente inesquecível, unforgettable, unvergesslich, inouviable. Foi um consideração bastante pobre, como vocês podem ver.
Depois, pensei que se existe algo inesquecível, deve ser algo comum, já que se tivéssemos uma Quimera, por exemplo, um monstro de três cabeças, uma cabeça, se não me engano, de cobra, outra de serpente, outra de cão, não tenho certeza, certamente recordaríamos isto. De modo que não haveria graça nenhuma num conto com um minotauro, uma quimera, um unicórnio inesquecíveis. Não, teria que ser alguma coisa bem comum. Ao pensar nessa coisa comum, pensei imediatamente numa moeda, já que são cunhadas milhares e milhares de moedas absolutamente iguais. Todas com a efígie da liberdade ou um escudo, ou com certas palavras convencionais. Que coisa extraordinária seria se houvesse uma moeda, uma moeda perdida entre esses milhões de moedas, que fosse inesquecível. Pensei, assim, numa moeda que já saiu de circulação, uma moeda de vinte centavos, uma moeda igual às outras, igual à moeda de cinco ou à de dez centavos, um pouco maior. Que coisa extraordinária seria se, entre os milhões, literalmente, de moedas cunhadas pelo Estado, houvesse uma que fosse inesquecível. Daí surgiu-me uma idéia: uma inesquecível moeda de vinte centavos. Não sei se elas ainda existem, se os numismáticos as colecionam, se elas têm algum valor, mas, enfim, não pensei nisso naquele instante. Pensei numa moeda que, para os objetivos do meu conto, teria de ser inesquecível. Isto é, uma pessoa que a visse não poderia mais pensar em outra coisa.
Depois, encontrei-me diante da segunda ou terceira dificuldade. Perdi a conta das dificuldades. Por que essa moeda viria a ser inesquecível? O leitor não aceitaria tal idéia. Eu tinha de preparar o inesquecível da minha moeda, e para tanto convinha supor um estado emocional em que ele a via, tinha de insinuar a loucura, já que o tema de meu conto é um tema que se parece com a loucura ou a obsessão. Pensei, como pensou Edgar Allan Poe quando escreveu seu merecidamente famoso poema “O corvo”, na morte de uma mulher bonita. Poe se perguntou a quem poderia impressionar a morte dessa mulher bonita e deduziu que tinha de impressionar a alguém que estivesse apaixonado por ela. Daí cheguei a idéia de uma mulher, por quem, no conto, estou apaixonado, e que morre, o que me deixa desesperado. Neste ponto, teria sido fácil, talvez fácil demais, que essa mulher fosse como a perdida Leonor, de Poe. Mas, não. Decidi mostrar essa mulher de um modo satírico, mostrar o amor de quem não esquecerá a moeda de vinte centavos como um pouco ridículo. Todos os amores o são para quem os vê de fora. Assim, ao invés de falar da beleza do love splendor, converti-a numa mulher bastante trivial, um pouco ridícula, nem feia nem muito linda. Imaginei uma situação que ocorre com freqüência: um homem é apaixonado por uma mulher, não pode viver sem ela, mas, ao mesmo tempo, sabe que essa mulher não é especialmente recomendável, digamos, para sua mãe, para suas primas, para a camareira, para a costureira, para as amigas. No entanto, para ele, esse mulher é única.
Isto me levou a uma outra idéia: a de que talvez toda pessoa seja única e que nós não vemos o extraordinário que fala a favor dessa pessoa. Às vezes, penso que isto se dá em tudo. Senão, fixemo-nos no fato de que na natureza ou em Deus, Deus sive Natura, como dizia Spinoza, o importante é a quantidade e não a qualidade. Por que não supor, então, que haja algo singular em cada formiga e que por isso Deus, ou a natureza, cria milhões de formigas. O que é falso. Não há milhões de formigas, há milhões de seres diferentes, mas a diferença é tão sutil que nós as vemos como iguais.
O que é, pois, estar apaixonado? Estar apaixonado é perceber o que há de extraordinário em cada pessoa, singularidade essa que não pode ser comunicada a não ser por meio de hipérboles ou de metáforas. Então, por que não imaginar que essa mulher, um pouco ridícula para todos, pouco ridícula para quem está apaixonado por ela, que essa mulher morra. Depois, temos o velório. Escolhi o lugar do velório, escolhi a esquina, pensei na igreja da Conceição, uma igreja não muito famosa nem muito interessante, e no homem que, depois do velório, vai tomar um refresco num botequim. Paga, dão-lhe uma moeda de troco, e ele percebe, em seguida, que há algo nela: foi riscada, o que a diferencia das outras. Ele vê a moeda, está muito emocionado pela morte da mulher, mas, ao ver a moeda, já começa a se esquecer de tudo e a pensar somente na moeda. Eu tinha, assim, o objeto mágico para o conto. Depois é que surgem as tentativas do narrador de livrar-se de sua obsessão. Diversos artifícios são utilizados: um deles é perder a moeda. Leva-a, então, a outro botequim, distante dali. Usa-a para pagar, procura esquecer em que esquina o botequim se encontrava, mas isso não resolve o problema, ele continua pensando na moeda. Chega a extremos um tanto absurdos. Por exemplo, compra uma libra esterlina, com São Jorge e o dragão, examina-a com uma lupa, procura pensar nela e esquecer a moeda de vinte centavos, já perdida para sempre, mas não consegue livrar-se da lembrança. Até o final do conto, o homem vai enlouquecendo, mas pensa que essa mesma obsessão poderá salvá-lo. Isto é, haverá um momento no qual o Universo já terá desaparecido e o próprio Universo será uma moeda de vinte centavos. Então ele, e aqui produzi um pequeno efeito literário, ele, Borges, estará louco, não saberá mais que é Borges. Já não será outra coisa a não ser o espectador dessa perdida moeda inesquecível. E conclui com uma frase devidamente literária, isto é, falsa: “Talvez por detrás da moeda esteja Deus”. Ou seja, se alguém vê uma só coisa, essa coisa única é absoluta. Há outros episódios que esqueci, alguns talvez que vocês recordem. Ao final, ele não pode dormir, sonha com a moeda, não pode ler, a moeda se interpõe entre o texto e ele, quase não pode falar senão de um modo mecânico, por que realmente está pensando na moeda.
Assim termina o conto".
Borges(1)
Alguns trechos de uma entrevista do escritor argentino Jorge Luis Borges, que traz muita coisa interessante a respeito do seu processo de criação.
"Penso que é melhor que o escritor interfira o mínimo possível em sua obra. Isto pode parecer estranho, mas não é. Em todo caso, trata-se, curiosamente, da doutrina clássica. Nós a vemos na primeira linha, eu não sei grego, da Ilíada, de Homero, que todos lemos na censurável versão de Hermosilla: “Canta, Musa, a cólera de Aquiles”. Isto é, Homero, ou os gregos a que chamamos de Homero, sabia que o poeta não é o cantor, que o poeta, ou prosador, dá no mesmo, é simplesmente o amanuense de algo que ignora e que em sua mitologia particular chama de a Musa. Por outro lado, os hebreus preferiram falar de Espírito, e nossa psicologia contemporânea, que não sofre de excessiva beleza, de subconsciência, inconsciente coletivo, ou algo assim. Mas, enfim, o importante é o fato de que o escritor é um amanuense, ele recebe algo e procura expressá-lo".
"Penso que é melhor que o escritor interfira o mínimo possível em sua obra. Isto pode parecer estranho, mas não é. Em todo caso, trata-se, curiosamente, da doutrina clássica. Nós a vemos na primeira linha, eu não sei grego, da Ilíada, de Homero, que todos lemos na censurável versão de Hermosilla: “Canta, Musa, a cólera de Aquiles”. Isto é, Homero, ou os gregos a que chamamos de Homero, sabia que o poeta não é o cantor, que o poeta, ou prosador, dá no mesmo, é simplesmente o amanuense de algo que ignora e que em sua mitologia particular chama de a Musa. Por outro lado, os hebreus preferiram falar de Espírito, e nossa psicologia contemporânea, que não sofre de excessiva beleza, de subconsciência, inconsciente coletivo, ou algo assim. Mas, enfim, o importante é o fato de que o escritor é um amanuense, ele recebe algo e procura expressá-lo".
segunda-feira, novembro 07, 2005
"Hapiness is a warm gun"
"Hapiness is a warm gun (bang bang, shot shot)"
The Beatles
Após devaneios e wolfianas, há o amor. Ainda não acredito que seja o amor na sua forma mais completa e transformadora, mas fagulhas dele já teimam em se desgarrar e provocar princípios de incêndios. Tudo bem, são muito os bombeiros que me preservam (?) das fagulhas, mas acho que , tranquilamente, está mais que na hora de dar uma cachaça para eles, libertá-los dessa ingrata tarefa de destruir fagulhas tão promissoras...
Se bem que, se são promissoras, não deveriam se apresentar assim, pois trazem consigo expectativas, e delas obrigatoriamente vem uma cisão, seja com o que já está estabelecido em não aparecer seja com o que é mais do que previsível que aconteça, embora não é com a previsão que vão se diminuir os seus efeitos, e que bom que é assim mesmo. Enfim, se "hapiness is a warm gun", love is a slow death, ou a cold rainbow.
Realmente são as surpresas.
The Beatles
Após devaneios e wolfianas, há o amor. Ainda não acredito que seja o amor na sua forma mais completa e transformadora, mas fagulhas dele já teimam em se desgarrar e provocar princípios de incêndios. Tudo bem, são muito os bombeiros que me preservam (?) das fagulhas, mas acho que , tranquilamente, está mais que na hora de dar uma cachaça para eles, libertá-los dessa ingrata tarefa de destruir fagulhas tão promissoras...
Se bem que, se são promissoras, não deveriam se apresentar assim, pois trazem consigo expectativas, e delas obrigatoriamente vem uma cisão, seja com o que já está estabelecido em não aparecer seja com o que é mais do que previsível que aconteça, embora não é com a previsão que vão se diminuir os seus efeitos, e que bom que é assim mesmo. Enfim, se "hapiness is a warm gun", love is a slow death, ou a cold rainbow.
Realmente são as surpresas.
sábado, novembro 05, 2005
devaneios (2)
1.
O peso e o ônus de fazer parte de um grupo restrito, de não conseguir compreender muitas das relações dos outros que se nomeiam como amizade é , por muitas vezes, excessivo. Sim, não é fácil ficar ao lado de pessoas que tem relações de consequências, amizades, até relacionamentos completamente diferentes da sua. Se ouso criticar, posso ser taxado de louco, e talvez até tenham razão, mas , enfim, é isso que escolhei pra mim. Talvez pensem que os criticando estou tentanto fazer com que essas pessoas fiquem mais próximos do meu jeito de encarar certas relações, o que não é de todo mentira; mas , se faço isso, é com a intenção de que as pessoas aproveitem aquilo assim como eu estou aproveitando, de forma alguma querendo me orgulhar de estar nessa nomeada "loucura".
Sempre faço isso de boas atenções, mas acho que , por mais difícil que seja não compartilhar momentos bons, "catequizar" os outros para adentrar nesse mundo "louco" não é a melhor opção. Por isso, o melhor é guardar as próprias loucuras.
2.
Hoje em dia, o sofrimento é pop. Fácil se percebe. Porém, e ainda bem, o verdadeiro sofrimento, aquele que serve como rito de passagem para uma situação extraordinária, esse ainda não foi mapeado e popularizado, assim como eu acho que nunca vai ser, por ser demasiado polêmico e até inatingível à todos. Uma antídoto para o sofrimento pop seria fazer com que se perceba quão ridículo é exaltar o sofrimento, ou ,numa solução mais radical, é fazer com que seja provado o verdadeiro sofrimento, pois assim nunca mais ninguém o irá exaltar, exibir a bom grado, adorar até. Porque sofrer, por indispensável que seja, não é bom.
3.
Esse blog funciona tal como um "medidor de atmosfera pessoal". É uma forma de execrar os sentimentos, os pensamentos daquele dia/época. E aqui se denuncia o humor, pois há os dias tipo manhãs de sol e os pós-tragos noturnos, assim como os tristes em essência por algo maior que essa vidinha tranquila levada e os completamentes loucos de amor por essa mesma vidinha tranquila e surpreendente.
O peso e o ônus de fazer parte de um grupo restrito, de não conseguir compreender muitas das relações dos outros que se nomeiam como amizade é , por muitas vezes, excessivo. Sim, não é fácil ficar ao lado de pessoas que tem relações de consequências, amizades, até relacionamentos completamente diferentes da sua. Se ouso criticar, posso ser taxado de louco, e talvez até tenham razão, mas , enfim, é isso que escolhei pra mim. Talvez pensem que os criticando estou tentanto fazer com que essas pessoas fiquem mais próximos do meu jeito de encarar certas relações, o que não é de todo mentira; mas , se faço isso, é com a intenção de que as pessoas aproveitem aquilo assim como eu estou aproveitando, de forma alguma querendo me orgulhar de estar nessa nomeada "loucura".
Sempre faço isso de boas atenções, mas acho que , por mais difícil que seja não compartilhar momentos bons, "catequizar" os outros para adentrar nesse mundo "louco" não é a melhor opção. Por isso, o melhor é guardar as próprias loucuras.
2.
Hoje em dia, o sofrimento é pop. Fácil se percebe. Porém, e ainda bem, o verdadeiro sofrimento, aquele que serve como rito de passagem para uma situação extraordinária, esse ainda não foi mapeado e popularizado, assim como eu acho que nunca vai ser, por ser demasiado polêmico e até inatingível à todos. Uma antídoto para o sofrimento pop seria fazer com que se perceba quão ridículo é exaltar o sofrimento, ou ,numa solução mais radical, é fazer com que seja provado o verdadeiro sofrimento, pois assim nunca mais ninguém o irá exaltar, exibir a bom grado, adorar até. Porque sofrer, por indispensável que seja, não é bom.
3.
Esse blog funciona tal como um "medidor de atmosfera pessoal". É uma forma de execrar os sentimentos, os pensamentos daquele dia/época. E aqui se denuncia o humor, pois há os dias tipo manhãs de sol e os pós-tragos noturnos, assim como os tristes em essência por algo maior que essa vidinha tranquila levada e os completamentes loucos de amor por essa mesma vidinha tranquila e surpreendente.
sexta-feira, novembro 04, 2005
Wolfianas (1)
Fausto Wolff é um jornalista-escritor gaúcho, descendente de alemães do vale do Sinos e personagem do país mítico chamado "Ipanema", no RIo de Janeiro, como diz Luis Fernando Veríssimo. Desde cedo convivendo com as agruras do país, sabe como poucos meter o dedo na ferida; sabe até as receitas para curar a ferida, mas como isso não depende só dele...
Eu disse uma vez que ele é uma mistura improvável de Bukowski com Jorge Luis Borges, com pitadas marxistas.
Vou colocar alguns trechos de um livro que eu recém comecei a ler, mas que de cara vi que é magistral: A imprensa livre de Fausto Wolff. è uma coletâneas de artigos sobre o país, o caos atual em que nos encontramos. É de 2004, portanto bem recente. Alguns trechos do livro:
"Nossa imprensa - os poucos jornais que sobraram e que viraram empregado dos canais de televisão - tornou-se clean, distante, superior, limitando a narrar os fatos sem se atentar para os fenômenos que ocasionam os fatos".
"As transnacionais, os bancos, as grandes redes de TV que nos convencem a consumir mais e mais todo tipo de porcarias não podem viver sem escravos. E os escravos somos nós e somos escravos porque - na medida em que queremos ter e abdicamos da nossa condição de indivíduos - não percebemos que eles não podem viver sem nós. Pensem bem: o domador sem tigre não passa de um palhaço com um chicote na mão."
" A liberdade é uma carcereira terrível"
Algumas coisas podem até parecer radical demais, mas não; basta ler Fausto Wolff que ele nos explica direitinho que, se há alguma verdade perdida, ele chega o mais próximo possível dela.
Eu disse uma vez que ele é uma mistura improvável de Bukowski com Jorge Luis Borges, com pitadas marxistas.
Vou colocar alguns trechos de um livro que eu recém comecei a ler, mas que de cara vi que é magistral: A imprensa livre de Fausto Wolff. è uma coletâneas de artigos sobre o país, o caos atual em que nos encontramos. É de 2004, portanto bem recente. Alguns trechos do livro:
"Nossa imprensa - os poucos jornais que sobraram e que viraram empregado dos canais de televisão - tornou-se clean, distante, superior, limitando a narrar os fatos sem se atentar para os fenômenos que ocasionam os fatos".
"As transnacionais, os bancos, as grandes redes de TV que nos convencem a consumir mais e mais todo tipo de porcarias não podem viver sem escravos. E os escravos somos nós e somos escravos porque - na medida em que queremos ter e abdicamos da nossa condição de indivíduos - não percebemos que eles não podem viver sem nós. Pensem bem: o domador sem tigre não passa de um palhaço com um chicote na mão."
" A liberdade é uma carcereira terrível"
Algumas coisas podem até parecer radical demais, mas não; basta ler Fausto Wolff que ele nos explica direitinho que, se há alguma verdade perdida, ele chega o mais próximo possível dela.
quinta-feira, novembro 03, 2005
devaneios (1)
Conquanto que seja possível, a fase de experimentação da vida tem de ser "a linha de sombra" dita por Josehp Conrad ; a fase de transição da juventude para a vida "adulta", cheia de responsabilidades onde a fuga delas já não pode mais ser vista de uma boa maneira.
Há ainda uma sustentação que nos permite a experimentação, da mesma forma que são os que nos sustentam que não nos deixam extrapolar essa experimentação, pois, afinal, o investimento tem de ter um fruto, e fazer com que o fruto se perca num mar de outros mais terríveis pode fazer com que ele apodreça, e aí não há nada que o mantenha na linha correta que os que nos sustentam querem que nós sigamos. É o ônus disso tudo; podemos experimentar, mas pagamos o preço de não fugir demais.
Enfim, viva a experimentação dirigida e saudável
( se é que conseguimos distinguí-las como tal...)
Devaneios, loucuras, tudo muito difícil de dar em alguma coisa ou não. Mas é assim.
Há ainda uma sustentação que nos permite a experimentação, da mesma forma que são os que nos sustentam que não nos deixam extrapolar essa experimentação, pois, afinal, o investimento tem de ter um fruto, e fazer com que o fruto se perca num mar de outros mais terríveis pode fazer com que ele apodreça, e aí não há nada que o mantenha na linha correta que os que nos sustentam querem que nós sigamos. É o ônus disso tudo; podemos experimentar, mas pagamos o preço de não fugir demais.
Enfim, viva a experimentação dirigida e saudável
( se é que conseguimos distinguí-las como tal...)
Devaneios, loucuras, tudo muito difícil de dar em alguma coisa ou não. Mas é assim.
segunda-feira, outubro 31, 2005
Filosofia bagaceira
Team America é um filme feito todo em bonecos tipo os antigos Thunderbirds, com os fiozinhos que os movem e tudo. Criado pelos mesmo pessoal responsável pelo desenho South Park, o fulme é uma sátira cruel aos americanos e a sua "missão" de policiar e garantir o bem-estar do mundo. A Team America do título é uma polícia especial encarregada de cuidar de ações terroristas em todo o planeta, e para cumprir sua missão, não hesita em destruir tudo que vê pela frente - inclusive monumentos históricos e Museus, como no início do filme quando destroem o Museu do Louvre em Paris para matar um terrorista árabe que entrou lá para se esconder dos americanos.
Para se disfarçar de árabe e descobrir o que estes estão tramandos, eles contatam o considerado "melhor ator do mundo", Gary Johnston. A partir daí o filme se desenrola, com reviravoltas típicas dos filmes de ação (mas, neste caso, tudo é sátira), e numa das cenas mais hilárias, o ator Gary, frustrado por não conseguir interpretar em situações de risco como a que o Team America o encarrega, toma um porre num bar, e um velho que está ali observando puxa conversa no mínimo estranha com Gary:
" Há três tipos de pessoas no mundo: os dicks (paus), as pussy (bucetas) e os asshole (cús). As pussy enrolam os dicks, que só querem fodê-las sem pensar direito. E há os asshole, quer só querem cagar pra cima de tudo.
As pussy podem ficar brabas com os dicks, porque são fodidas por eles. Mas o problema é que os dicks muitas vezes fodem demais, ou fodem quando não devem, e é preciso que as pussy mostrem isso à eles; só que , às vezes, as pussy são influenciadas demais, e ficam tão cheias de merda que elas próprias se tornam assholes - pela proximidade de alguns centímetros, isso é bem fácil de acontecer. Mas os dicks também fodem os asshole, e se não fudessem, sabe o que aconteceria? os dicks e as pussy ficariam cobertos de merda!
Por isso, cabe aos dicks salvar o mundo dos assholes!
domingo, outubro 30, 2005
Uma simples história de amor
Um argumento para curta metragem, que fiz há um ano atrás. Historinha simples, romântica, ingênua.
Uma simples História de Amor
Jovem vem do interior para fazer vestibular e fica na casa dos seus tios, num quarto só para ele.
Chega num domingo à tarde. Segunda pela manhã, acorda cedo e vai fazer o vestibular.Vai a pé, senta na sala, aguarda.
A uns 3 minutos de esgotar o prazo, surge uma garota, de cabelos vermelhos, atrasada e senta atrás dele. Ele a acompanha com os olhos. Vendo o olhar do garoto, ela, mesmo um pouco ofegante, diz oi para ele e puxa uma conversa. Ele responde, um pouco sem jeito. Mas começa o vestibular, e aconversa morre .
Duas horas depois, ela se levanta para entregar a prova,e o garoto levanta-se segundos depois.
Os dois saem junto da sala. Conversam sobre a prova e outras coisas enquanto vão junto para a casa.
Ao chegar na hora de se despedir,ela dá um beijo no rosto dele e diz seu telefone. Ele chega em casa,vai direto para cama.
No outro dia, mesma rotina: acorda cedo e vai fazer o vestibular. Desta vez a garota já está na sala quando ele chega. Conversam um pouco antes do início da prova;rola um “leve” clima, ela pega na mão dele e o deseja boa sorte. Ele retribui. Fazem a prova, e desta vez ele acaba antes. O garoto espera um pouco e vão junto novamente para casa, pelo mesmo caminho. Na hora de se despedir, ela o convida para dar uma volta de tarde. Um abraço de despedida,almoço, e pelo fim da tarde os dois saem juntos, caminhando pela cidade movimentada.
Começa a chover, e eles vão correndo para casa.
Na hora da despedida, finalmente se beijam pra valer. No outro dia, no colégio, se encontram na mesma sala, um sentando atrás do outro.
Ela está bem diferente no seu comportamento, preocupada com alguma coisa.
Faz a prova rápido, sai quase correndo, mas deixa um bilhete pra ele, discretamente. Ele abre. O bilhete diz que ela não vai fazer a redação, que vai pegar o ônibus pra casa as 11:30. Ele dá um jeito de acabar a prova rápido. Sai quase correndo tentando achar ela. Vai correndo até a rodoviária; chega em tempo de ver o ônibus saindo,e vê ela dando um tchau pela janela. Ele fica desolado. Vai para a casa e chora; acaba dormindo. No outro dia, lê um jornal a caminho da rodoviária: ônibus bate em carreta e mais de dez passageiros morrem.
O garoto só abaixa a cabeça, chora muito e grita.
Outro ano. Ele faz o vestibular de novo.
No mesmo colégio e, na mesma classe, encontra uma garota atrás de si, muito parecida com a outra que morreu. Ela se apresenta, ele a olha com aquele mesmo olhar de antes.Acabam a prova juntos; e vão embora.
Uma simples História de Amor
Jovem vem do interior para fazer vestibular e fica na casa dos seus tios, num quarto só para ele.
Chega num domingo à tarde. Segunda pela manhã, acorda cedo e vai fazer o vestibular.Vai a pé, senta na sala, aguarda.
A uns 3 minutos de esgotar o prazo, surge uma garota, de cabelos vermelhos, atrasada e senta atrás dele. Ele a acompanha com os olhos. Vendo o olhar do garoto, ela, mesmo um pouco ofegante, diz oi para ele e puxa uma conversa. Ele responde, um pouco sem jeito. Mas começa o vestibular, e aconversa morre .
Duas horas depois, ela se levanta para entregar a prova,e o garoto levanta-se segundos depois.
Os dois saem junto da sala. Conversam sobre a prova e outras coisas enquanto vão junto para a casa.
Ao chegar na hora de se despedir,ela dá um beijo no rosto dele e diz seu telefone. Ele chega em casa,vai direto para cama.
No outro dia, mesma rotina: acorda cedo e vai fazer o vestibular. Desta vez a garota já está na sala quando ele chega. Conversam um pouco antes do início da prova;rola um “leve” clima, ela pega na mão dele e o deseja boa sorte. Ele retribui. Fazem a prova, e desta vez ele acaba antes. O garoto espera um pouco e vão junto novamente para casa, pelo mesmo caminho. Na hora de se despedir, ela o convida para dar uma volta de tarde. Um abraço de despedida,almoço, e pelo fim da tarde os dois saem juntos, caminhando pela cidade movimentada.
Começa a chover, e eles vão correndo para casa.
Na hora da despedida, finalmente se beijam pra valer. No outro dia, no colégio, se encontram na mesma sala, um sentando atrás do outro.
Ela está bem diferente no seu comportamento, preocupada com alguma coisa.
Faz a prova rápido, sai quase correndo, mas deixa um bilhete pra ele, discretamente. Ele abre. O bilhete diz que ela não vai fazer a redação, que vai pegar o ônibus pra casa as 11:30. Ele dá um jeito de acabar a prova rápido. Sai quase correndo tentando achar ela. Vai correndo até a rodoviária; chega em tempo de ver o ônibus saindo,e vê ela dando um tchau pela janela. Ele fica desolado. Vai para a casa e chora; acaba dormindo. No outro dia, lê um jornal a caminho da rodoviária: ônibus bate em carreta e mais de dez passageiros morrem.
O garoto só abaixa a cabeça, chora muito e grita.
Outro ano. Ele faz o vestibular de novo.
No mesmo colégio e, na mesma classe, encontra uma garota atrás de si, muito parecida com a outra que morreu. Ela se apresenta, ele a olha com aquele mesmo olhar de antes.Acabam a prova juntos; e vão embora.
quinta-feira, outubro 27, 2005
Impressões de viagem : Punta Del Este (2)
Algumas outras fotos de Punta Del Este, as últimas da viagem.
No último dia lá, pegamos umas bicicletas com o cara do Hotel e andamos por todos os arredores da cidade. Há uns 8 quilômteros do hotel, o pneu da bicicleta do André furou, e pra conseguir uma borracharia ali... sorte nossa que um brasileiro e dois uruguaios estavam , de bicicleta, indo para Punta em busca de trabalho. Como andavam , de bicicleta, desde montevideo, traziam consigo os materiais necessários para remendos de pneu, e por um precinho camarada e umas bolachas arrumaram pra nós. O brasileiro, que era de Livramento, uma figura interessantíssima: algo como um brasiguaio, falava portugûes com nós e espanhol com os outros companheiros, em cada língua com sotaque da outra. Ele veio de bicicleta de Livramento a Montevideo em 3 dias e meio, quase 500 Km, um recorde. Veio pra procurar trabalho, trazendo só uma mochila e alguns poucos pertences.
Depois do pneu, andamos bastante ainda, a minha bicicleta deu problema também, desta vez no câmbio, mas seguimos igual. Fizemos uns 30 Km acho, com algumas subidas cansativas incluso. Chegamos no hotel podre de cansados, logicamente.
Na Casapuebla, um casarão bem estranho de um artista plástico que hoje virou museu. Fica a alguns quilômetros do Centro, numa região com belas praias.
Na Praia em um dos lados da península onde fica Punta; é uma escultura de uma mão enterrada.
No porto, nós e as bici.
Na exata ponta onde o Rio da Prata encontra o Oceano.
À esquerda, o atlântico; à direita, o Rio, que se desde Montevideo já tem cara de mar, aqui então nem lembra mais um rio.
No último dia lá, pegamos umas bicicletas com o cara do Hotel e andamos por todos os arredores da cidade. Há uns 8 quilômteros do hotel, o pneu da bicicleta do André furou, e pra conseguir uma borracharia ali... sorte nossa que um brasileiro e dois uruguaios estavam , de bicicleta, indo para Punta em busca de trabalho. Como andavam , de bicicleta, desde montevideo, traziam consigo os materiais necessários para remendos de pneu, e por um precinho camarada e umas bolachas arrumaram pra nós. O brasileiro, que era de Livramento, uma figura interessantíssima: algo como um brasiguaio, falava portugûes com nós e espanhol com os outros companheiros, em cada língua com sotaque da outra. Ele veio de bicicleta de Livramento a Montevideo em 3 dias e meio, quase 500 Km, um recorde. Veio pra procurar trabalho, trazendo só uma mochila e alguns poucos pertences.
Depois do pneu, andamos bastante ainda, a minha bicicleta deu problema também, desta vez no câmbio, mas seguimos igual. Fizemos uns 30 Km acho, com algumas subidas cansativas incluso. Chegamos no hotel podre de cansados, logicamente.
Na Casapuebla, um casarão bem estranho de um artista plástico que hoje virou museu. Fica a alguns quilômetros do Centro, numa região com belas praias.
Na Praia em um dos lados da península onde fica Punta; é uma escultura de uma mão enterrada.
No porto, nós e as bici.
Na exata ponta onde o Rio da Prata encontra o Oceano.
À esquerda, o atlântico; à direita, o Rio, que se desde Montevideo já tem cara de mar, aqui então nem lembra mais um rio.
terça-feira, outubro 25, 2005
Lembranças de sonhos
De uns meses pra cá eu tenho sonhado compulsivamente. No sono pesado tradicional à noite já era comum, mas agora os sonhos vêm em qualquer dormida que seja, até aquelas cestas de 30 minutos depois do almoço. Na verdade, desconfio que sempre sonhei bastante, mas a diferença desta vez é que me lembro de quase todos os sonhos, embora muitas vezes o que lembro não consegue formar um relato coeso e com nexo. Mas sonho não tem muito nexo mesmo... o que comprovei através das lembranças dos meus sonhos é que eles são diremante ligados ao "assunto" que predominou na minha cabeça durante o dia. É difícil de se medir exatamente o tal assunto, mas acredito que todo mundo tenha uma boa noção para si de qual é esse assunto.
O nível de preocupação sobre esse "assunto" no dia também tem ligação com o sonho; nos dias mais tensos, ou mais ricos em experiências novas e diferentes do comum, é mais fácil, por assim dizer, sonhar. Em outros mais tranquilos, sem muita preocupação ou mesmo monótonos, os sonhos demoram a vir - quando vêm - e talvez nesses dias eles possam dizer alguma coisa a mais sobre nós, se é que eles possam dizer alguma coisa, pois as preocupações e experiências novas de certa forma "tendenciam" o sono, e nos dias em que não há nenhum nem outro, a mente está mais "liberta" para sonhar, sem qualquer amarra com o assunto do dia. Começarei a observar mais os sonhos nestes dias. Posso estar acreditando numa grande bobagem, e essas coisas que pensei podem ser tremendas bobagens, mas eu acredito, pois eu sinto isso, e por mais que não possamos acreditar na nossa memória, pelo menos em certos pontos dá para se acreditar, e é isso que farei.
O nível de preocupação sobre esse "assunto" no dia também tem ligação com o sonho; nos dias mais tensos, ou mais ricos em experiências novas e diferentes do comum, é mais fácil, por assim dizer, sonhar. Em outros mais tranquilos, sem muita preocupação ou mesmo monótonos, os sonhos demoram a vir - quando vêm - e talvez nesses dias eles possam dizer alguma coisa a mais sobre nós, se é que eles possam dizer alguma coisa, pois as preocupações e experiências novas de certa forma "tendenciam" o sono, e nos dias em que não há nenhum nem outro, a mente está mais "liberta" para sonhar, sem qualquer amarra com o assunto do dia. Começarei a observar mais os sonhos nestes dias. Posso estar acreditando numa grande bobagem, e essas coisas que pensei podem ser tremendas bobagens, mas eu acredito, pois eu sinto isso, e por mais que não possamos acreditar na nossa memória, pelo menos em certos pontos dá para se acreditar, e é isso que farei.
segunda-feira, outubro 24, 2005
Impressões de viagem : Punta Del Este (1)
Depois de dois dias em Montevideo, decidimos ir pra Punta Del Este, famoso balneário da América do Sul, auto-proclamado "capital turística do Mercosul". Fomos num Domingo pra lá. E como toda a praia relativamente perto de cidades maiores, domingo de tarde esvazia, as pessoas vão para suas casas, e, quando não é epoca de veraneio, tudo fica naquele clima de "cidade-fantasma".
Punta estava assim. A linda orla de muitos prédios chiques, vazia. Nas avenidas, poucos carros - mas dentre os poucos, só carrões. Procuramos um hotel pelas cercanias do centro, onde fomos deixados por um simpático uruguaio dono de restaurante em Punta, e achamos bem mais fácil que Montevideo. Mais caro a diária, mas pouco comparado a inúmeras outras coisas que em Punta são muito mais caras que em todo o uruguai. Hotelzinho simpático, o dono acostumado com brasileiros arranhava um português, a comunicação se tornou mais fácil. Conversamos bastante com ele, que disse que até um dia anterior o hotel dele estava cheio - agora estava vazio - pois tinha um torneio de Poker no Cassino Hotel Conrad, e esses torneios costumam unir muita gente de fora, brasileiros em peso.
Ah, os Casinos! Punta tem muitos, em sua maioria estatais, e o Conrad, o maior e mais famoso da América Latina. Depois de descansarmos no hotel, caminhamos até lá. O prédio é realmente de encher os olhos; mas o que nos surpreendeu foi a facilidade de se entrar lá, de andar pelos aposentos chiques tranquilamente sem ninguém incomodar. O chão, todo entapetado, era um deleite para nossos pés cansados de ficar em pé;os inúmeros sofás chiques espalhados foram ocupados por nós sem cerimônias. Sentamos bem no do enorme hall de entrada e tomamos um mate, meio receosos com a tranquilidade com que se podia fazer (quase) tudo ali sem se preocupar com nada. As pessoas em volta , em sua grande maioria, vestidas com trajes chiques, vestidos longos, sapatos de salto alto, ternos, jóias... E nós ali, de all-star, mochila, casaco jeans e tomando mate. Pena que a água acabou no segundo mate de cada um. Ficamos ainda umas duas horas por lá, conhecendo os aposentos do Conrad, usando o banheiro gigante e bem cheiroso, até jogando no Cassino - só se podia jogar em dólares, trocamos os pesos e jogamos míseros 2 dólares. E perdemos.
O Conrad
Eu bem sentado num dos diversos aposentos do Conrad. ( tá um pouco escura, não consegui clarear direito)
Tenho mais algumas fotos, coloco depois e conto algumas outras histórias junto.
Punta estava assim. A linda orla de muitos prédios chiques, vazia. Nas avenidas, poucos carros - mas dentre os poucos, só carrões. Procuramos um hotel pelas cercanias do centro, onde fomos deixados por um simpático uruguaio dono de restaurante em Punta, e achamos bem mais fácil que Montevideo. Mais caro a diária, mas pouco comparado a inúmeras outras coisas que em Punta são muito mais caras que em todo o uruguai. Hotelzinho simpático, o dono acostumado com brasileiros arranhava um português, a comunicação se tornou mais fácil. Conversamos bastante com ele, que disse que até um dia anterior o hotel dele estava cheio - agora estava vazio - pois tinha um torneio de Poker no Cassino Hotel Conrad, e esses torneios costumam unir muita gente de fora, brasileiros em peso.
Ah, os Casinos! Punta tem muitos, em sua maioria estatais, e o Conrad, o maior e mais famoso da América Latina. Depois de descansarmos no hotel, caminhamos até lá. O prédio é realmente de encher os olhos; mas o que nos surpreendeu foi a facilidade de se entrar lá, de andar pelos aposentos chiques tranquilamente sem ninguém incomodar. O chão, todo entapetado, era um deleite para nossos pés cansados de ficar em pé;os inúmeros sofás chiques espalhados foram ocupados por nós sem cerimônias. Sentamos bem no do enorme hall de entrada e tomamos um mate, meio receosos com a tranquilidade com que se podia fazer (quase) tudo ali sem se preocupar com nada. As pessoas em volta , em sua grande maioria, vestidas com trajes chiques, vestidos longos, sapatos de salto alto, ternos, jóias... E nós ali, de all-star, mochila, casaco jeans e tomando mate. Pena que a água acabou no segundo mate de cada um. Ficamos ainda umas duas horas por lá, conhecendo os aposentos do Conrad, usando o banheiro gigante e bem cheiroso, até jogando no Cassino - só se podia jogar em dólares, trocamos os pesos e jogamos míseros 2 dólares. E perdemos.
O Conrad
Eu bem sentado num dos diversos aposentos do Conrad. ( tá um pouco escura, não consegui clarear direito)
Tenho mais algumas fotos, coloco depois e conto algumas outras histórias junto.
domingo, outubro 23, 2005
Impressões de viagem: Montevideo (3)
Voltando aos relatos de viagem, algumas fotos de Montevideo.
Da parte "praiana" de Montevideo, AO fundo, os prédios da orla da praia de Pocitos.
Descansando um pouco, nessa mesma orla, perto do Iate Clube.
Na tradicional feira de Tristan Návaja, que funciona todos os domingos de manhã. É uma grande feira de camelôs, antiquários, comidas, roupas, discos, artigos tradicionais do Uruguai, e tudo o que mais se imaginar. ( as minha caras nas fotos é sempre a mesma. Não sou fotogênico. :)
Amanhã conto de Punta Del Este.
Da parte "praiana" de Montevideo, AO fundo, os prédios da orla da praia de Pocitos.
Descansando um pouco, nessa mesma orla, perto do Iate Clube.
Na tradicional feira de Tristan Návaja, que funciona todos os domingos de manhã. É uma grande feira de camelôs, antiquários, comidas, roupas, discos, artigos tradicionais do Uruguai, e tudo o que mais se imaginar. ( as minha caras nas fotos é sempre a mesma. Não sou fotogênico. :)
Amanhã conto de Punta Del Este.
sexta-feira, outubro 21, 2005
Na Linha de Sombra
Dando uma breve pausa dos relatos de viagem, um trecho interessante de um livro ótimo - A linha de sombra, de Joseph Conrad.
Apenas os menos jovens têm tais momentos.(...) Fecha-se atrás de si o pequeno portão da mera meninice - e adentra-se um jardim encantado. Até as sombras aqui resplandecem cheia de promessas. Cada curva de vereda tem suas seduções. E não porque se trate de um país desconhecido. Sabe-se muito bem que a humanidade toda já trilhou aquela senda. É o encanto da experiência universal, da qual se espera extrair um sensação incomum ou pessoal - um algo que seja só nosso.
Vai-se reconhecendo os marcos dos predecessores, excitado, divertindo-se, aceitando a boa como a má sorte - as roas e os espinhos, como se costuma dizer - o pitoresco lote padrão, que guarda tantas possibilidades para os mrecedores, ou talvez para os afortunados.
Sim. Vai-se adiante. E o tempo, também, caminha - até que se percebe logo adiante uma linha de sombra avisando-nos que também a região da mocidade deverá ser deixada para trás. Este é o momento da vida no qual os tais momentos de tédio, desânimo, de insatisfação costumam aparecer.
Às vezes me pergunto se já passei da linha de sombra; se umas horas tenho certeza, outras fico na dúvida. Talvez esteja pra sair, ou já saí e não percebi ainda?
Apenas os menos jovens têm tais momentos.(...) Fecha-se atrás de si o pequeno portão da mera meninice - e adentra-se um jardim encantado. Até as sombras aqui resplandecem cheia de promessas. Cada curva de vereda tem suas seduções. E não porque se trate de um país desconhecido. Sabe-se muito bem que a humanidade toda já trilhou aquela senda. É o encanto da experiência universal, da qual se espera extrair um sensação incomum ou pessoal - um algo que seja só nosso.
Vai-se reconhecendo os marcos dos predecessores, excitado, divertindo-se, aceitando a boa como a má sorte - as roas e os espinhos, como se costuma dizer - o pitoresco lote padrão, que guarda tantas possibilidades para os mrecedores, ou talvez para os afortunados.
Sim. Vai-se adiante. E o tempo, também, caminha - até que se percebe logo adiante uma linha de sombra avisando-nos que também a região da mocidade deverá ser deixada para trás. Este é o momento da vida no qual os tais momentos de tédio, desânimo, de insatisfação costumam aparecer.
Às vezes me pergunto se já passei da linha de sombra; se umas horas tenho certeza, outras fico na dúvida. Talvez esteja pra sair, ou já saí e não percebi ainda?
quinta-feira, outubro 20, 2005
Impressões de viagem: Montevideo (2)
Continuando...
Montevideo tem dois lados meio distintos:
O centro,da Plaza Independecia até perto do porto e do mercado público, que é a parte conhecida como Ciudad Veja, onde surgiram as primeiras povoações. É uma península no Rio da Prata: o porto fica na ponta da península, e o começo da Ciudad Veja fica no meio. Seguindo em direção da Plaza ao porto, pode-se olhar para os dois lados e encontrar água. É como Porto Alegre: estando parado no calçadão da Andradas, olhando para a Praça da Alfândega, por exemplo, o rio Guaíba está na frente e nos dois lados, sendo que atrás de ti é que está o continente. Montevideo é a mesma coisa.
uma das ruas da Ciudad Veja
As praias. Sim, há praias em Montevideo. Elas são distante alguns quilômetros do centro, mas nada que um ônibus não resolva. Pocitos é a primeira de inúmeras que vêm a seguir, todas com uma excelente infra-estrutura, calçadão, uma linda orla com inúmeros prédios chiques, enseadas e tudo. Há uma boa faixa de areia em cada praia, aquelas areias mais escuras, dura, mas a água não é muito aconselhável para o banho, embora sempra haja alguns corajosos. É uma região muito bonita, cheio de gramadões verdes para se sentar, deitar, ler um livro, e um bom lugar para se fazer uma corrida, já que o calçadão acompanha todos a área entrecortada das praias, que dão no total quase 4 quilômetros. É considerada uma área nobre da cidade, há bastante restaurantes, lojas e prédios finos, além do Iate Club, tradiconalmente lugar de elite, onde ficam alguns pequenos iates, lanchas e outros barcos atracados.
As fotos dessa parte virão depois, não descarreguei elas ainda.
As uruguaias
As uruguaias são "cult". A grande maioria anda vestida no que aqui consideramos como "cult", pelo menos. All-Star ou um genérico, calça jeans, uma blusa e um casaco, franjas no cabelo negro. Quase que nem os indies daqui. A diferença é que ,se aqui é exceção esse jeito, lá é maioria. Não há patis, não se vê mulheres de salto na rua - salvo as que tem de trabalhar com ele -, não se vê quase muita produção para se sair na rua, como geralmente acontece por aqui. Assim, a beleza delas é mais rústica, natural.
E, puta que pariu, são muito belas! Morenas, cabelo comprido quase sempre, olhos calros, magras mas boas de corpo - há pouquíssimas gordas, pelo menos das que saiam nas ruas . O que mais se vê por lá são morenas magras de olhos claros de All-star, o que seriaum paraíso, se elas não fossem , digamos, arredias. Nas andanças noturnas, poucas davam conversa, tanto para uruguaios quanto para estrangeiros - que, por sinal, são bastantes por lá ; encontrei dois espanhóis e dois ingleses perdidos como nós , deu até pra arriscar um inglês, andamos juntos por um tempo, até que eles decidiram entrar num lugar e nós ficamos andando mesmo. Mas voltando às uruguaias. Elas andavam pelos circuitos de pubs rapidamente, dando uma leve olhadinha para os em sua maioria homens que estavam nas mesas de fora dos bares, como que para se assegurarem de que eles vão retribuir o olhar e elas continuaram andando, como se não tivessem olhado. Caí muito nesse joguinho delas até perceber que era um jogo que já se começava perdido pra mim. Deixei elas pra lá e fui tomar minha Pilsen litro.
Em um bar/boate que entramos por lá (AlmodoBar o nome, criativo), tivemos a triste verificação de que nosso "espanhol" não é suficiente para se trovar uma uruguaia. Ainda mais uma uruguaia, arredia a uma aproximação simples e corriqueira por aqui.
O lugar. Como os daqui, nada de diferente. Só a banda, um trio de rock com uma mulher no vocal,que por aqui não seria digna de tocar num lugar como esses. Muito ruim. Som péssimo.
Algo comum no lugar , e nas ruas também, era ver gente tomando uma garrafa de litro de cerveja no bico, sem qualquer cerimônia. O que aqui é coisa de bêbado, lá é normal. Muito estranho.
Mas, enfim, ainda caso com uma uruguaia daquelas.
Montevideo tem dois lados meio distintos:
O centro,da Plaza Independecia até perto do porto e do mercado público, que é a parte conhecida como Ciudad Veja, onde surgiram as primeiras povoações. É uma península no Rio da Prata: o porto fica na ponta da península, e o começo da Ciudad Veja fica no meio. Seguindo em direção da Plaza ao porto, pode-se olhar para os dois lados e encontrar água. É como Porto Alegre: estando parado no calçadão da Andradas, olhando para a Praça da Alfândega, por exemplo, o rio Guaíba está na frente e nos dois lados, sendo que atrás de ti é que está o continente. Montevideo é a mesma coisa.
uma das ruas da Ciudad Veja
As praias. Sim, há praias em Montevideo. Elas são distante alguns quilômetros do centro, mas nada que um ônibus não resolva. Pocitos é a primeira de inúmeras que vêm a seguir, todas com uma excelente infra-estrutura, calçadão, uma linda orla com inúmeros prédios chiques, enseadas e tudo. Há uma boa faixa de areia em cada praia, aquelas areias mais escuras, dura, mas a água não é muito aconselhável para o banho, embora sempra haja alguns corajosos. É uma região muito bonita, cheio de gramadões verdes para se sentar, deitar, ler um livro, e um bom lugar para se fazer uma corrida, já que o calçadão acompanha todos a área entrecortada das praias, que dão no total quase 4 quilômetros. É considerada uma área nobre da cidade, há bastante restaurantes, lojas e prédios finos, além do Iate Club, tradiconalmente lugar de elite, onde ficam alguns pequenos iates, lanchas e outros barcos atracados.
As fotos dessa parte virão depois, não descarreguei elas ainda.
As uruguaias
As uruguaias são "cult". A grande maioria anda vestida no que aqui consideramos como "cult", pelo menos. All-Star ou um genérico, calça jeans, uma blusa e um casaco, franjas no cabelo negro. Quase que nem os indies daqui. A diferença é que ,se aqui é exceção esse jeito, lá é maioria. Não há patis, não se vê mulheres de salto na rua - salvo as que tem de trabalhar com ele -, não se vê quase muita produção para se sair na rua, como geralmente acontece por aqui. Assim, a beleza delas é mais rústica, natural.
E, puta que pariu, são muito belas! Morenas, cabelo comprido quase sempre, olhos calros, magras mas boas de corpo - há pouquíssimas gordas, pelo menos das que saiam nas ruas . O que mais se vê por lá são morenas magras de olhos claros de All-star, o que seriaum paraíso, se elas não fossem , digamos, arredias. Nas andanças noturnas, poucas davam conversa, tanto para uruguaios quanto para estrangeiros - que, por sinal, são bastantes por lá ; encontrei dois espanhóis e dois ingleses perdidos como nós , deu até pra arriscar um inglês, andamos juntos por um tempo, até que eles decidiram entrar num lugar e nós ficamos andando mesmo. Mas voltando às uruguaias. Elas andavam pelos circuitos de pubs rapidamente, dando uma leve olhadinha para os em sua maioria homens que estavam nas mesas de fora dos bares, como que para se assegurarem de que eles vão retribuir o olhar e elas continuaram andando, como se não tivessem olhado. Caí muito nesse joguinho delas até perceber que era um jogo que já se começava perdido pra mim. Deixei elas pra lá e fui tomar minha Pilsen litro.
Em um bar/boate que entramos por lá (AlmodoBar o nome, criativo), tivemos a triste verificação de que nosso "espanhol" não é suficiente para se trovar uma uruguaia. Ainda mais uma uruguaia, arredia a uma aproximação simples e corriqueira por aqui.
O lugar. Como os daqui, nada de diferente. Só a banda, um trio de rock com uma mulher no vocal,que por aqui não seria digna de tocar num lugar como esses. Muito ruim. Som péssimo.
Algo comum no lugar , e nas ruas também, era ver gente tomando uma garrafa de litro de cerveja no bico, sem qualquer cerimônia. O que aqui é coisa de bêbado, lá é normal. Muito estranho.
Mas, enfim, ainda caso com uma uruguaia daquelas.
Impressões de viagem : Montevideo(1)
Aos poucos, vou relatando algumas impressões que tive dos lugares por onde passei, algumas coisas que só amadurecem depois de um certo tempo.
Montevideo (traduzido para o português, fica Montevidéu, mas eu prefiro o original) é uma cidade calma. Na parte central, tudo gira em torno da Avenida 18 de Julho, que é onde ficam os principais bancos, praças, sedes de governo, prédios históricos e administrativos do Uruguai. Mesmo com tudo concentrado ali, as coisas parecem funcionar tranquilamente; os ônibus velhos andam nos seus lugares, as pessoas caminham na calçada e não na rua, o chão é limpo em comparação com cidades do mesmo tamanho, as sinaleiras funcionam, quase não se ouve barulhos de buzinas, tudo parece estar em harmonia.
eu na Plaza Independencia, ao fundo a 18 de Julho.
Mate
Um fato curioso é que, independe da hora do dia, os uruguaios sempre carregam a térmica e a cuia para o mate. Pude conferir isso de manhã bem cedinho, pelo meio dia, depois do almoço, à tardinha, até à noite... sempre com o mate, tantos os jovens quantos os mais velhos, mulheres e homens, seja na 18 de Julho ou nas ruas paralelas menos movimentadas.
Algo que me intrigou de início é que o mate parecia um chá, não tinha o tradicional morrinho que fazemos por aqui, era a bomba perdida na cuia sem lugar certo, como um canudinho em um copo de refri. Depois, comprei uma erva num mercado e percebi o motivo disso: a erva deles é muito ruim. Fina, parece aquele pó de se fazer chá-mate, não há morrinho que dure - ainda mais com aquele vento forte que sopra em Montevideo . Tentei fazer um morrinho, mas já no terceiro mate tudo desabou, e meu mate ficou igual ao dos uruguaios. Ainda assim continuei tomando, e ele até que demorou mais do que o normal para ficar "lavado". O gosto é um pouco mais fraco que o nosso, acho que por a erva ser mais fina, mais misturada que a nossa. Mas, definitivamente, o nosso mate/chimarrão é melhor.
Carros
Os carros são quase todos de motor à diesel. Nos acostumamos aqui a ver só caminhonetes, ônibus, caminhões - veículos grandes em geral - com esse tipo de motor, e reconhecemos aquele ronco caracterísitico que o carrom acaba fazendo quando um desses se aproxima. Mas lá, caminhando pelas ruas, parava numa esquina para atravessar e ouvia aquele ronco que , para mim era característico de carro grande, vindo de tudo quanto é tipo de carro, principalmente dos pequenos , corsas, celtas, clios, gols, paratis, todos esses. Estranhava muito, o que me fez ficar cuidando para ver se encontrava algum carro que não tivesse aquele ronco, mas era extremamente difícil. Numa proporção de cabeça, diria que de 90 a 95% dos carros uruguaios são à diesel.
Percebe-se que o DETRAN deles não fiscaliza muito os carros velhos. Há de todos os tipos; fusca caindo aos pedaços, corcel sem uma lasca de pintura, fubicas não se sabe como andando de tão velhas, até mesmo carros novos com batidas no parachoques não consertadas, com a porta estragada, o vidro de trás quebrado.
Há uma justificativa para isso, acho eu: encontrei um carro desses velhos, mas ainda não caindo aos pedaços, por 9000 pesos, o que dá algo perto de R$ 900 reais. Muito barato se comparado aos daqui.
As marcas dos carros de lá são quase as mesmas dos daqui,e não poderia ser diferente, já que a grande maioria é importado do Brasil e da Argentina. Há um ligeiro maior número de carros da Renault que aqui, assim como também acontece na Argentina, onde as fábricas da montadora francesa são mais antigas .No mais, é a mesma proporção nossa, Fiat, Wolksvagem, Ford, GM, etc.
Montevideo (traduzido para o português, fica Montevidéu, mas eu prefiro o original) é uma cidade calma. Na parte central, tudo gira em torno da Avenida 18 de Julho, que é onde ficam os principais bancos, praças, sedes de governo, prédios históricos e administrativos do Uruguai. Mesmo com tudo concentrado ali, as coisas parecem funcionar tranquilamente; os ônibus velhos andam nos seus lugares, as pessoas caminham na calçada e não na rua, o chão é limpo em comparação com cidades do mesmo tamanho, as sinaleiras funcionam, quase não se ouve barulhos de buzinas, tudo parece estar em harmonia.
eu na Plaza Independencia, ao fundo a 18 de Julho.
Mate
Um fato curioso é que, independe da hora do dia, os uruguaios sempre carregam a térmica e a cuia para o mate. Pude conferir isso de manhã bem cedinho, pelo meio dia, depois do almoço, à tardinha, até à noite... sempre com o mate, tantos os jovens quantos os mais velhos, mulheres e homens, seja na 18 de Julho ou nas ruas paralelas menos movimentadas.
Algo que me intrigou de início é que o mate parecia um chá, não tinha o tradicional morrinho que fazemos por aqui, era a bomba perdida na cuia sem lugar certo, como um canudinho em um copo de refri. Depois, comprei uma erva num mercado e percebi o motivo disso: a erva deles é muito ruim. Fina, parece aquele pó de se fazer chá-mate, não há morrinho que dure - ainda mais com aquele vento forte que sopra em Montevideo . Tentei fazer um morrinho, mas já no terceiro mate tudo desabou, e meu mate ficou igual ao dos uruguaios. Ainda assim continuei tomando, e ele até que demorou mais do que o normal para ficar "lavado". O gosto é um pouco mais fraco que o nosso, acho que por a erva ser mais fina, mais misturada que a nossa. Mas, definitivamente, o nosso mate/chimarrão é melhor.
Carros
Os carros são quase todos de motor à diesel. Nos acostumamos aqui a ver só caminhonetes, ônibus, caminhões - veículos grandes em geral - com esse tipo de motor, e reconhecemos aquele ronco caracterísitico que o carrom acaba fazendo quando um desses se aproxima. Mas lá, caminhando pelas ruas, parava numa esquina para atravessar e ouvia aquele ronco que , para mim era característico de carro grande, vindo de tudo quanto é tipo de carro, principalmente dos pequenos , corsas, celtas, clios, gols, paratis, todos esses. Estranhava muito, o que me fez ficar cuidando para ver se encontrava algum carro que não tivesse aquele ronco, mas era extremamente difícil. Numa proporção de cabeça, diria que de 90 a 95% dos carros uruguaios são à diesel.
Percebe-se que o DETRAN deles não fiscaliza muito os carros velhos. Há de todos os tipos; fusca caindo aos pedaços, corcel sem uma lasca de pintura, fubicas não se sabe como andando de tão velhas, até mesmo carros novos com batidas no parachoques não consertadas, com a porta estragada, o vidro de trás quebrado.
Há uma justificativa para isso, acho eu: encontrei um carro desses velhos, mas ainda não caindo aos pedaços, por 9000 pesos, o que dá algo perto de R$ 900 reais. Muito barato se comparado aos daqui.
As marcas dos carros de lá são quase as mesmas dos daqui,e não poderia ser diferente, já que a grande maioria é importado do Brasil e da Argentina. Há um ligeiro maior número de carros da Renault que aqui, assim como também acontece na Argentina, onde as fábricas da montadora francesa são mais antigas .No mais, é a mesma proporção nossa, Fiat, Wolksvagem, Ford, GM, etc.
quarta-feira, outubro 19, 2005
Volta à realidade
Pois bem, depois de alguns dias viajando (mais especificamente 6 dias), a volta a realidade sempre é cruel, as lembranças dos lugares visitados sempre tornam a comparação com a nossa casa desigual, por melhor que nosso lar seja, e demora-se alguns dias até que as lembranças diminuam o , digamos, "domínio de sensações" que as memórias da viagem a todo momento se fazem lembrar.
Hoje é dia de sol forte, calor mas com vento; o mesmo clima de praticamente toda a nossa viagem pelo Uruguai, então saio na rua e lembro do Uruguai, dos lugares que o vento forte causou algo interessante que me fez lembrar mais do que outras coisas e assim por diante. Mas com a quantidade de viagens vem também uma mais rápida "acostumação" da realidade.
Aos poucos, vou colocando impressões de lá, fotos e outras coisas, já que o que era para ser um diário de viagem se tornou apenas um meio diário - um terço de diário - principalmente pelo difícil acesso à cybercafés pelo caminho, mas também por ser mais díficil "analisar" um lugar, contar impressões , estando nele. Um certo distanciamento é saudável para se que as lembranças amadureçam...
Essa é a Peatonal Sarandí da Ciudad Veja, bem no centro de Montevideo. Basicamente, é um caminho de algumas quadras de um tipo dum calçadão onde ficam bares, restaurantes, lojas, antiquários, praças, e que a noite é onde se concentram o movimento das pessoas. Nas ruas paralelas ao caminho há uma grande concentração de pubs, dos mais variados gostos. Os uruguaios gostam muito de se sentar nos pubs, tomarem suas cervejas de litro (Pilsen, preferencialmente, mas também Norteña, Patricia, Heineken...) e conversarem bastante, ao som de rock,tango, música flamenca e mais outros estilos, mas em sua maioria esses. Há bastante jovens, mas também há bastante adultos de seus 30, 40 e até 50 e poucos anos. Em sua maioria, mulheres. Mas essas merecem um capítulo à parte, que eu deixarei para amanhã ou depois.
Hoje é dia de sol forte, calor mas com vento; o mesmo clima de praticamente toda a nossa viagem pelo Uruguai, então saio na rua e lembro do Uruguai, dos lugares que o vento forte causou algo interessante que me fez lembrar mais do que outras coisas e assim por diante. Mas com a quantidade de viagens vem também uma mais rápida "acostumação" da realidade.
Aos poucos, vou colocando impressões de lá, fotos e outras coisas, já que o que era para ser um diário de viagem se tornou apenas um meio diário - um terço de diário - principalmente pelo difícil acesso à cybercafés pelo caminho, mas também por ser mais díficil "analisar" um lugar, contar impressões , estando nele. Um certo distanciamento é saudável para se que as lembranças amadureçam...
Essa é a Peatonal Sarandí da Ciudad Veja, bem no centro de Montevideo. Basicamente, é um caminho de algumas quadras de um tipo dum calçadão onde ficam bares, restaurantes, lojas, antiquários, praças, e que a noite é onde se concentram o movimento das pessoas. Nas ruas paralelas ao caminho há uma grande concentração de pubs, dos mais variados gostos. Os uruguaios gostam muito de se sentar nos pubs, tomarem suas cervejas de litro (Pilsen, preferencialmente, mas também Norteña, Patricia, Heineken...) e conversarem bastante, ao som de rock,tango, música flamenca e mais outros estilos, mas em sua maioria esses. Há bastante jovens, mas também há bastante adultos de seus 30, 40 e até 50 e poucos anos. Em sua maioria, mulheres. Mas essas merecem um capítulo à parte, que eu deixarei para amanhã ou depois.
sábado, outubro 15, 2005
Diário de Viagem (2)
Buenas, cá estamos. Nao consegui postar ontem, esgotou o tempo, uma falha grave que pretendo consertar hoje.
Na quinta, pegamos 3 caronas até Livramento. Em Sao Vicente, a coisa foi complicada, demoramos quase duas horas, mas , por sorte, pegamos uma bem na hora que comecou a chuver. E que chuva! No caminho para Cacequi, choveu até pedra.
Chegamos pelas 8 em Livramento, jantamos e conseguimos pegar o onibus da meia noite e meia para Montevideo. Chuvia bastante, estávamos cansado, acabou sendo a melhor alternativa.
6 horas chegamos em Montevideo. O horário de verao aqui já está em vigor, adiantamos o relógio em uma hora e fomos andar pela cidade. Temperatura agradável, amanhecendo , as pessoas indo trabalhar.
Aqui as coisas giram em torno da Avenida 18 de Julho, a principal da cidade. Nem parece que a cidade tem mais de um milhao de habitantes, as coisas sao tudo meio perto, tudo em volta dessa avenida.
Depois de andar nos arredores da 18 Julho atás de um hotel bom e barato, acabamos achando um nem tao bom, nem tao barato, mas suficiente, na avenida Uruguay esquina com a Rio Branco, tres quadras da 18 de Julho. Alpey o nome do hotel. Conseguimos um desconto de alguns pesos com o gerente-porteiro e fomos para o quarto, que fica numa ala onde era um casarao antigo, com aqueles corredores enormes, o chao de madeira que faz ressoar longe os passos. O quarto é simples, grande.
Descansamos um pouco (umas 3 horas) e fomos conhecer a cidade. Tiramos umas fotos, conhecemos os arredores da plaza Independencia, que é bem o centro da cidade, as ruelinhas que lembram bastante Cuba, os arredores do porto. Tomamamos uma Pilsen no Mercado Publico...
Conhecemos mais alguns lugres, tomamos um mate na beira do Rio da Prata. Aliás, mate é algo que todos uruguaios tomam, na rua a castelhanada toda anda com sua térmica debaixo do braco e a bomba atravessada nos queixo...
De noite, fomos conhecer os bares, tomar algumas cevas, etc. Mas como nao tenho muito tempo, quando chegar conto mais detalhes (ou nao...)
Ficaremos aqui até domingo, depois vamos subir o litoral uruguaio até o Chuy, onde pretendemos chegar segunda ou terca...
Outra foto por lá...
P.s 1 Uso o plural porque estamos eu e o André.
P.s 2 Nao me adaptei ao teclado daqui, que é bastante diferente. Entao algumas coisas saem estranhas, sem acentos principalmente...
Na quinta, pegamos 3 caronas até Livramento. Em Sao Vicente, a coisa foi complicada, demoramos quase duas horas, mas , por sorte, pegamos uma bem na hora que comecou a chuver. E que chuva! No caminho para Cacequi, choveu até pedra.
Chegamos pelas 8 em Livramento, jantamos e conseguimos pegar o onibus da meia noite e meia para Montevideo. Chuvia bastante, estávamos cansado, acabou sendo a melhor alternativa.
6 horas chegamos em Montevideo. O horário de verao aqui já está em vigor, adiantamos o relógio em uma hora e fomos andar pela cidade. Temperatura agradável, amanhecendo , as pessoas indo trabalhar.
Aqui as coisas giram em torno da Avenida 18 de Julho, a principal da cidade. Nem parece que a cidade tem mais de um milhao de habitantes, as coisas sao tudo meio perto, tudo em volta dessa avenida.
Depois de andar nos arredores da 18 Julho atás de um hotel bom e barato, acabamos achando um nem tao bom, nem tao barato, mas suficiente, na avenida Uruguay esquina com a Rio Branco, tres quadras da 18 de Julho. Alpey o nome do hotel. Conseguimos um desconto de alguns pesos com o gerente-porteiro e fomos para o quarto, que fica numa ala onde era um casarao antigo, com aqueles corredores enormes, o chao de madeira que faz ressoar longe os passos. O quarto é simples, grande.
Descansamos um pouco (umas 3 horas) e fomos conhecer a cidade. Tiramos umas fotos, conhecemos os arredores da plaza Independencia, que é bem o centro da cidade, as ruelinhas que lembram bastante Cuba, os arredores do porto. Tomamamos uma Pilsen no Mercado Publico...
Conhecemos mais alguns lugres, tomamos um mate na beira do Rio da Prata. Aliás, mate é algo que todos uruguaios tomam, na rua a castelhanada toda anda com sua térmica debaixo do braco e a bomba atravessada nos queixo...
De noite, fomos conhecer os bares, tomar algumas cevas, etc. Mas como nao tenho muito tempo, quando chegar conto mais detalhes (ou nao...)
Ficaremos aqui até domingo, depois vamos subir o litoral uruguaio até o Chuy, onde pretendemos chegar segunda ou terca...
Outra foto por lá...
P.s 1 Uso o plural porque estamos eu e o André.
P.s 2 Nao me adaptei ao teclado daqui, que é bastante diferente. Entao algumas coisas saem estranhas, sem acentos principalmente...
quinta-feira, outubro 13, 2005
Diário de Viagem (1)
Estamos partindo ao meio dia. Espero estar à noite em Santana do Livramento, mas nessas andanças nunca se sabe, então não me surpeendo se , à noite, estivermos em:
a)Uruguaiana
b)Alegrete
c)Rósário do Sul
d) Bagé
e)ainda São Vicente do Sul
Qualquer outro lugar - fora Livramento, claro - vai ser surpresa. O calor, o sol forte até ajudam a conseguir carona, mas a chuva que promete vir amanhã pode ser um empecilho para os futuros planos. Mas o bom dessa vida é que nunca se sabe: o que em determinada circunstâncias poderia ser motivo de apreensão, aqui pode ser motivo para se surpeender com a capacidade de se enfrentar adversidades. Algo como um tempero forte, que dá um gosto tão bom na comida que depois não se imagina como nós queríamos comer aquela comida sem o bendito tempero.
a)Uruguaiana
b)Alegrete
c)Rósário do Sul
d) Bagé
e)ainda São Vicente do Sul
Qualquer outro lugar - fora Livramento, claro - vai ser surpresa. O calor, o sol forte até ajudam a conseguir carona, mas a chuva que promete vir amanhã pode ser um empecilho para os futuros planos. Mas o bom dessa vida é que nunca se sabe: o que em determinada circunstâncias poderia ser motivo de apreensão, aqui pode ser motivo para se surpeender com a capacidade de se enfrentar adversidades. Algo como um tempero forte, que dá um gosto tão bom na comida que depois não se imagina como nós queríamos comer aquela comida sem o bendito tempero.
terça-feira, outubro 11, 2005
Experimentações (literárias?)
Como tudo aqui, esse texto está sujeito a alterações. Aliás, mais do que os outros, pois esse certamente irei alterar depois, mas posto hoje para ver o que mudarei na vez em que alterá-lo.
Um experimento para comprovar que muito do texto, principalmente o final, depende do estado de espírito em que estamos na hora de escrevê-lo, e que é bastante saudável , na maioria dos casos, deixar o texto amadurecer, como um bom vinho, para passado algum tempo ver se ele ainda conserva o mesmo sabor sentido logo depois de seu término, ou se aumentou, diminiui, mudou completamente.
Eu queria passar na ponte de carro e nadar, só isso.
Então, decidi que era hoje que iria até lá, naquela noite. De uma festa que estava ruim demais, onde o champanhe tinha gosto de sangue e as pessoas fingiam que isso era bom, fui de carro até a ponte, que era distante da festa alguns bons quilômetros. Em um cruzamento já afastado da cidade, peguei à direita numa estradinha de chão batido e de lá segui até a ponte com os milharais me acompanhando, bêbados, agitados, gritando para tentar me dispersar, e , quem sabe, me fazer dormir com eles, ali mesmo.
Chegaram a gritar tanto que perderam a voz, e a lua finalmente conseguiu ouvir meus apelos e se tornou minha guia. Naquele céu estrelado, sem uma nuvem, ela funcionava como um farol para um barco que sabe onde está a costa, mas está embriagado o suficiente para não lembrar mais onde atracar.
Depois de algum tempo no imenso silêncio, cheguei na ponte. Ela estava ali como sempre esteve, me esperando, e dessa vez parecia mais linda ainda – cortesia da minha guia, que a iluminava como um grande sol num filme preto-e-branco. Não tinha muito controle dos meus atos, mas os meus sentidos estavam até mais aguçados, e talvez por isso consegui escutar com clareza a limpidez das águas, o bater suave nas pedras, a correnteza forte que levava tanta água que eu comecei a achar que as pedras não iriam agüentar, principalmente uma menor que estava sozinha, metade fora metade dentro d’água, tão pequena e inocente para estar ali, ao lado de tantas maiores e resistentes, como que esperando o destino cruel que a levaria rio abaixo até a grande cachoeira que o partiria em vários pedaços.
Parei o carro em cima da ponte, tirei o terno apertado, e , nú, me joguei dali de cima. Por algo que eu não entendo até hoje, não lembrei de mais nada depois. Sei exatamente do que aconteceu antes da onda preta aparecer. Foi assim: quando me joguei, vi as águas correndo, bem escuras, a pedrinha solitária ali me chamando, Venha se juntar a mim vamos ser solitários juntos, e algumas espalhadas que foram ficando cada vez mais juntas, maiores, e então veio uma onda meio amarela nos olhos e depois a preta, o breu.
Um experimento para comprovar que muito do texto, principalmente o final, depende do estado de espírito em que estamos na hora de escrevê-lo, e que é bastante saudável , na maioria dos casos, deixar o texto amadurecer, como um bom vinho, para passado algum tempo ver se ele ainda conserva o mesmo sabor sentido logo depois de seu término, ou se aumentou, diminiui, mudou completamente.
Eu queria passar na ponte de carro e nadar, só isso.
Então, decidi que era hoje que iria até lá, naquela noite. De uma festa que estava ruim demais, onde o champanhe tinha gosto de sangue e as pessoas fingiam que isso era bom, fui de carro até a ponte, que era distante da festa alguns bons quilômetros. Em um cruzamento já afastado da cidade, peguei à direita numa estradinha de chão batido e de lá segui até a ponte com os milharais me acompanhando, bêbados, agitados, gritando para tentar me dispersar, e , quem sabe, me fazer dormir com eles, ali mesmo.
Chegaram a gritar tanto que perderam a voz, e a lua finalmente conseguiu ouvir meus apelos e se tornou minha guia. Naquele céu estrelado, sem uma nuvem, ela funcionava como um farol para um barco que sabe onde está a costa, mas está embriagado o suficiente para não lembrar mais onde atracar.
Depois de algum tempo no imenso silêncio, cheguei na ponte. Ela estava ali como sempre esteve, me esperando, e dessa vez parecia mais linda ainda – cortesia da minha guia, que a iluminava como um grande sol num filme preto-e-branco. Não tinha muito controle dos meus atos, mas os meus sentidos estavam até mais aguçados, e talvez por isso consegui escutar com clareza a limpidez das águas, o bater suave nas pedras, a correnteza forte que levava tanta água que eu comecei a achar que as pedras não iriam agüentar, principalmente uma menor que estava sozinha, metade fora metade dentro d’água, tão pequena e inocente para estar ali, ao lado de tantas maiores e resistentes, como que esperando o destino cruel que a levaria rio abaixo até a grande cachoeira que o partiria em vários pedaços.
Parei o carro em cima da ponte, tirei o terno apertado, e , nú, me joguei dali de cima. Por algo que eu não entendo até hoje, não lembrei de mais nada depois. Sei exatamente do que aconteceu antes da onda preta aparecer. Foi assim: quando me joguei, vi as águas correndo, bem escuras, a pedrinha solitária ali me chamando, Venha se juntar a mim vamos ser solitários juntos, e algumas espalhadas que foram ficando cada vez mais juntas, maiores, e então veio uma onda meio amarela nos olhos e depois a preta, o breu.
domingo, outubro 09, 2005
Uma crônica
Eu fiz essa crônica com a intenção de mandar para um concurso de ex-alunos da UFSM. Como eles abriram para os alunos atuais, pensei em fazer. Mas precisava de um "padrinho" entre os ex-alunos. E eu não consegui nenhum. Então, vou colocar ela aqui mesmo, pelo menos alguém vai ler.
AH! É uma história verídica.
O MATE COM PAIEIRO NO CAMPUS
Certa vez, alguém me disse que fumar um paieiro e tomar um mate no campo, deitado, olhando para o céu muito mais estrelado que o normal na cidade, era algo espetacular e indescritível, daquelas coisas que um homem deve fazer algum dia na vida – assim como plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho, segundo aquele ditado bem conhecido. Como na época não fumava e era um recém iniciado no mate - ainda não era capaz de sentir verdadeiro prazer a ponto de tomar um sozinho – achei que isso era bobagem. Era invenção de quem tinha lido As aventuras de Tom Sawyer, do escritor americano Mark Twain, e resolveu adaptar a situação lida às tradições gaúchas, pensei. No livro, Tom e seus amigos, no desabrochar da flor da infância para a adolescência, tem como um de seus grande prazeres ir para as matas além da vila onde moram, na beira do grande rio Mississipi, e sentar-se por lá, fumando um paieiro. O prazer se dá mais pelo proibido da situação do que pelo prazer propriamente dito causado pelo fumo. Tinha escutado isso há bastante tempo, na minha já distante infância no interior.
Pois bem. Numa dessas andanças de carro pelas noites do inverno santa-mariense, lembrei dessa história. Como naqueles estalos que vêm muito depois de se querer, subia a Fernando Ferrari com mais dois amigos , a cabeça grudada na janela do lado olhando para o céu límpido, quando surgiu a idéia:
_ Vamos fumar um paieiro e tomar um mate no bosque do campus!
Silêncio sepulcral de 3 segundos. A resposta veio do meu lado, no banco do motorista:
_ Ué, vamos. Nesse frio...
_ Fazemos uma fogueira, daí! – disse o de trás.
Todos concordaram.
Passamos em casa, pegamos cuia, térmica, bomba, esquentamos a água. Passei no quarto do meu pai e busquei lá no fundo do roupeiro, dentro de uma caixa de sapato, o fumo em corda e as palhas in natura, saídas direto do milharal . Fomos.
Era depois da meia noite, estava perto duns cinco graus na rua. No caminho, pensamos , dentre outras maluquices, em alguma forma de despistar o guardinha da entrada do campus, que achamos que iria complicar com a nossa presença ali àquela hora . Mas era tão mais fácil falar que íamos visitar um amigo na casa do estudante que nem pensamos em inventar alguma história mirabolante.
Da entrada fácil (nem perguntaram nada, apenas pediram o RG de cada um, sabe se lá pra quê) até estacionarmos em frente à reitoria foram três minutos contados no meu relógio. O campus estava vazio, com algumas poucas luzes e barulhos vindos do primeiro prédio da CEU II , aquele mais antigo.
O bosque praticamente tem só aquelas árvores de tronco alto, com muitos metros acima da nossa cabeça, e isso o torna , principalmente à noite, bastante assustador.
Na entrada, olhei para cima e - eu senti isso, juro – pareceu que as árvores se tornariam enormes guardas com armaduras, lanças e escudos só esperando que entrássemos para desferir o golpe mortal que nos desacordaria, para , no outro dia , início da manhã, algum guarda do campus vir nos perguntar “o que vocês fazem aí a essa hora?”.
Entramos devagar, olhando bem para os lados. Apesar de dar medo, a visão era muito bonita, a claridade do céu estrelado entrava pelo meio das árvores, dando um belo contraste claro/escuro no chão. Era como se estivéssemos num filme preto e branco, e o estar ali , bem no meio do bosque, longe o suficiente pra vermos a saída em um pontinho branco lá no fundo, nos dava a nítida sensação de fazermos parte de um filme de faroeste americano, justamente naqueles momentos da parada para descanso da turma do bandido – que normalmente acontece em matas, para evitar a exposição que traria uma área mais aberta.
Passada a ponte sobre o riachinho, alguns metros à direita da estrada, sentamos num tronco caído, colhemos uns tocos de lenha ali pela volta, e fizemos a fogueira. Sentei, olhei para o céu entre as árvores, vi as Três Marias brilhando como nunca , tirei o fumo em corda. O aroma forte de fumo caseiro que saiu nos embriagou de vontade de fumar. O fogo já estava estabelecido, o mate já começava a rodar pelas seis mãos presentes; piquei todo o fumo, juntei a palha, acendi e soltei aquela tragada forte que só os bons fumos possibilitam. Passei o paieiro, recebi o mate, e aquela água quente na garganta desceu como nunca, deixando o gosto forte e amargo do fumo ainda mais forte e amargo, infinitamente mais agradável.
Nem lembrei mais do frio, do medo, dos bandidos, do contraste, das árvores enormes nos vigiando (ai se elas contam para o reitor!), dos guardas, das luzes já tão longe.
Só levantamos dali quando acabou a água.
AH! É uma história verídica.
O MATE COM PAIEIRO NO CAMPUS
Certa vez, alguém me disse que fumar um paieiro e tomar um mate no campo, deitado, olhando para o céu muito mais estrelado que o normal na cidade, era algo espetacular e indescritível, daquelas coisas que um homem deve fazer algum dia na vida – assim como plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho, segundo aquele ditado bem conhecido. Como na época não fumava e era um recém iniciado no mate - ainda não era capaz de sentir verdadeiro prazer a ponto de tomar um sozinho – achei que isso era bobagem. Era invenção de quem tinha lido As aventuras de Tom Sawyer, do escritor americano Mark Twain, e resolveu adaptar a situação lida às tradições gaúchas, pensei. No livro, Tom e seus amigos, no desabrochar da flor da infância para a adolescência, tem como um de seus grande prazeres ir para as matas além da vila onde moram, na beira do grande rio Mississipi, e sentar-se por lá, fumando um paieiro. O prazer se dá mais pelo proibido da situação do que pelo prazer propriamente dito causado pelo fumo. Tinha escutado isso há bastante tempo, na minha já distante infância no interior.
Pois bem. Numa dessas andanças de carro pelas noites do inverno santa-mariense, lembrei dessa história. Como naqueles estalos que vêm muito depois de se querer, subia a Fernando Ferrari com mais dois amigos , a cabeça grudada na janela do lado olhando para o céu límpido, quando surgiu a idéia:
_ Vamos fumar um paieiro e tomar um mate no bosque do campus!
Silêncio sepulcral de 3 segundos. A resposta veio do meu lado, no banco do motorista:
_ Ué, vamos. Nesse frio...
_ Fazemos uma fogueira, daí! – disse o de trás.
Todos concordaram.
Passamos em casa, pegamos cuia, térmica, bomba, esquentamos a água. Passei no quarto do meu pai e busquei lá no fundo do roupeiro, dentro de uma caixa de sapato, o fumo em corda e as palhas in natura, saídas direto do milharal . Fomos.
Era depois da meia noite, estava perto duns cinco graus na rua. No caminho, pensamos , dentre outras maluquices, em alguma forma de despistar o guardinha da entrada do campus, que achamos que iria complicar com a nossa presença ali àquela hora . Mas era tão mais fácil falar que íamos visitar um amigo na casa do estudante que nem pensamos em inventar alguma história mirabolante.
Da entrada fácil (nem perguntaram nada, apenas pediram o RG de cada um, sabe se lá pra quê) até estacionarmos em frente à reitoria foram três minutos contados no meu relógio. O campus estava vazio, com algumas poucas luzes e barulhos vindos do primeiro prédio da CEU II , aquele mais antigo.
O bosque praticamente tem só aquelas árvores de tronco alto, com muitos metros acima da nossa cabeça, e isso o torna , principalmente à noite, bastante assustador.
Na entrada, olhei para cima e - eu senti isso, juro – pareceu que as árvores se tornariam enormes guardas com armaduras, lanças e escudos só esperando que entrássemos para desferir o golpe mortal que nos desacordaria, para , no outro dia , início da manhã, algum guarda do campus vir nos perguntar “o que vocês fazem aí a essa hora?”.
Entramos devagar, olhando bem para os lados. Apesar de dar medo, a visão era muito bonita, a claridade do céu estrelado entrava pelo meio das árvores, dando um belo contraste claro/escuro no chão. Era como se estivéssemos num filme preto e branco, e o estar ali , bem no meio do bosque, longe o suficiente pra vermos a saída em um pontinho branco lá no fundo, nos dava a nítida sensação de fazermos parte de um filme de faroeste americano, justamente naqueles momentos da parada para descanso da turma do bandido – que normalmente acontece em matas, para evitar a exposição que traria uma área mais aberta.
Passada a ponte sobre o riachinho, alguns metros à direita da estrada, sentamos num tronco caído, colhemos uns tocos de lenha ali pela volta, e fizemos a fogueira. Sentei, olhei para o céu entre as árvores, vi as Três Marias brilhando como nunca , tirei o fumo em corda. O aroma forte de fumo caseiro que saiu nos embriagou de vontade de fumar. O fogo já estava estabelecido, o mate já começava a rodar pelas seis mãos presentes; piquei todo o fumo, juntei a palha, acendi e soltei aquela tragada forte que só os bons fumos possibilitam. Passei o paieiro, recebi o mate, e aquela água quente na garganta desceu como nunca, deixando o gosto forte e amargo do fumo ainda mais forte e amargo, infinitamente mais agradável.
Nem lembrei mais do frio, do medo, dos bandidos, do contraste, das árvores enormes nos vigiando (ai se elas contam para o reitor!), dos guardas, das luzes já tão longe.
Só levantamos dali quando acabou a água.
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