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Traga me de volta , para aquela casa, de muitos dias atrás, que ainda hoje permanece sendo um embrião escuro cheio de esperanças pendentes e melancólicas prontas para serem reescritas.
Apenas tocar naquele chão tão fecundo, carente de sensações extravagantes e olhares enviesados de uma triste sabedoria que é o guia, e o perseguidor, das ilusões quase totalmente desfeitas pelo nó que as amarraram há algum tempo atrás,
Eu sempre corro longe antes de ter a chance de voltar, não sei, é a sensação de estar consertando algo sem conserto que vai poder mudar as coisas que virão e libertar os demônios travestidos de anjos-heróis que , na mais pura e singela sinceridade, querem aproveitar o tempo que perderam fazendo coisas que são de difícil aceitação (ou compreensão) fora de seu período, confundindo e atrapalhando as mais recentes descobertas que, enciumadas pela troca por essas libertadas, reagem de maneira descontrolada e criam outra batalha em uma guerra moral com grandes efeitos no local já quase devastado.
**
Eu me sinto envergonhado por isso tudo, querer voltar e correr longe, poder voltar àquela casa , tão diferente que deve estar, e ter medo do que vai vir.
Mas eu gosto, eu minto para poder querer dizer o que digo , não percebo bem, mas é mais bonito.
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quinta-feira, dezembro 29, 2005
terça-feira, dezembro 27, 2005
Pausa para comentários bloguísticos
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102º post.
Passou da casa dos 100, não esperava.
Espero que se mantenha bem até completar um ano, lá em março. Como é tempo de férias, espero que tenha alguma viagem para ilustrar um pouco isso aqui.
O maior número de acessos foi quando eu fui viajar e coloquei relatos e fotos dos locais onde passei. Era um número risível, mas tava bom.
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102º post.
Passou da casa dos 100, não esperava.
Espero que se mantenha bem até completar um ano, lá em março. Como é tempo de férias, espero que tenha alguma viagem para ilustrar um pouco isso aqui.
O maior número de acessos foi quando eu fui viajar e coloquei relatos e fotos dos locais onde passei. Era um número risível, mas tava bom.
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sexta-feira, dezembro 23, 2005
Cortazarianas beatniks (4)
:
Querer que tudo não se acerte para ter problemas e dúvidas legítimas para se pensar e buscar soluções diferentes, fora do convencional pensamento de que quando tudo está estável o caminho para a solução seria a desestabilidade legítima, genuinamente adquirida através não da estabilidade, obviamente, mas do desequilíbrio proporcionado através de uma situação que clame por romper as amarras firmes que perfazem a tênue linha divisória da perdição desencontrada do seu caminho com a estabilidade proporcionada por uma série de fatores que, por detalhes, não se torna o mesmo caminho da perdição; assim sendo, a linha, as dúvidas, os problemas, a estabilidade e o desequilíbrio, todos, são perpassados pela mesma linha imaginária que separa alguma coisa, será por Deus que separa?
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Querer que tudo não se acerte para ter problemas e dúvidas legítimas para se pensar e buscar soluções diferentes, fora do convencional pensamento de que quando tudo está estável o caminho para a solução seria a desestabilidade legítima, genuinamente adquirida através não da estabilidade, obviamente, mas do desequilíbrio proporcionado através de uma situação que clame por romper as amarras firmes que perfazem a tênue linha divisória da perdição desencontrada do seu caminho com a estabilidade proporcionada por uma série de fatores que, por detalhes, não se torna o mesmo caminho da perdição; assim sendo, a linha, as dúvidas, os problemas, a estabilidade e o desequilíbrio, todos, são perpassados pela mesma linha imaginária que separa alguma coisa, será por Deus que separa?
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quarta-feira, dezembro 21, 2005
Embriagado
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Estranhamente, acordou embriagado. Abriu os olhos, resquícios de luz solar entravam por algumas frestas da cortina que ia e vinha com o vento fresco - esse mesmo vento que chegou até ele passando pelo lençol desalinhado sobre o corpo e provocou um arrepio, os pêlos do braço se eriçaram como se preparassem para um perigo iminente. Os pelos, o vento, o lençol, a cama, mas principalmente a cama que repousava pesada e sufocante nas costas, denunciavam o estado de embriaguez. Quando se deu conta, já estava de pé indo à cozinha tomar vários copos d'água, pois a boca árida clamava por líquido muito mais que a cama clamou pelo corpo embriagado e do que o vento pelos pêlos eriçados e do que os resquícios de luz solar por uma fresta na cortina.
Três copos d'água foram o suficiente, por momento. Voltou ao quarto com a cabeça clamando pela cama e por uma posição fixa, que ocasionasse um olhar fixo para a parede branca do teto ou a visão escura do travesseiro muito próximo dos olhos, quase que forçando a eles se fecharem.
Olhos no travesseiro, flashes do que teria ocorrido para ele estar embriagado lhe vieram, lentos e confusos, como se também eles estivessem embriagados, perplexos de sua existência ou não, de sua simples existência ou de uma mera ficção baseada em fatos ao que tudo indicavam serem reais.
O primeiro dos flashes era uma tentativa de lembrar de qual momento , precisamente, ele não lembrava mais com detalhes do que tinha feito.
O segundo foi perdido pelo sono, que clamou por sua atenção e levou, sem pestanejar muito.
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Estranhamente, acordou embriagado. Abriu os olhos, resquícios de luz solar entravam por algumas frestas da cortina que ia e vinha com o vento fresco - esse mesmo vento que chegou até ele passando pelo lençol desalinhado sobre o corpo e provocou um arrepio, os pêlos do braço se eriçaram como se preparassem para um perigo iminente. Os pelos, o vento, o lençol, a cama, mas principalmente a cama que repousava pesada e sufocante nas costas, denunciavam o estado de embriaguez. Quando se deu conta, já estava de pé indo à cozinha tomar vários copos d'água, pois a boca árida clamava por líquido muito mais que a cama clamou pelo corpo embriagado e do que o vento pelos pêlos eriçados e do que os resquícios de luz solar por uma fresta na cortina.
Três copos d'água foram o suficiente, por momento. Voltou ao quarto com a cabeça clamando pela cama e por uma posição fixa, que ocasionasse um olhar fixo para a parede branca do teto ou a visão escura do travesseiro muito próximo dos olhos, quase que forçando a eles se fecharem.
Olhos no travesseiro, flashes do que teria ocorrido para ele estar embriagado lhe vieram, lentos e confusos, como se também eles estivessem embriagados, perplexos de sua existência ou não, de sua simples existência ou de uma mera ficção baseada em fatos ao que tudo indicavam serem reais.
O primeiro dos flashes era uma tentativa de lembrar de qual momento , precisamente, ele não lembrava mais com detalhes do que tinha feito.
O segundo foi perdido pelo sono, que clamou por sua atenção e levou, sem pestanejar muito.
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domingo, dezembro 18, 2005
Present Tense
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Você vê como aquelas árvores se curvam? Aquilo inspira?
Aprendendo a pegar os raios de sol...
Uma lição para ser aplicada
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Você pode passar seu tempo só,
Digerindo arrependimentos passados
Ou você pode vir até o limite e se dar conta
Que você é o único que pode se perdoar
Faz muito mais sentido viver no presente
Você tem idéia de como esta vida acaba?
Olhou suas mãos e estudou as linhas dela?
Você acredita que a estrada adiante
Conduz à iluminação?
Parece que, sem necessidade, está cada vez mais difícil
Achar um caminho e um jeito de se viver...
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Pearl Jam, Present Tense.
Você vê como aquelas árvores se curvam? Aquilo inspira?
Aprendendo a pegar os raios de sol...
Uma lição para ser aplicada
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Você pode passar seu tempo só,
Digerindo arrependimentos passados
Ou você pode vir até o limite e se dar conta
Que você é o único que pode se perdoar
Faz muito mais sentido viver no presente
Você tem idéia de como esta vida acaba?
Olhou suas mãos e estudou as linhas dela?
Você acredita que a estrada adiante
Conduz à iluminação?
Parece que, sem necessidade, está cada vez mais difícil
Achar um caminho e um jeito de se viver...
Você está tirando algo desta viagem onde todos estamos juntos?
Pearl Jam, Present Tense.
sexta-feira, dezembro 16, 2005
Petardo
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Um petardo quebrou a janela, invadiu o quarto rapidamente, alojou-se ao lado da cama enquanto um homem dormia. No outro dia, o petardo estava ali, perfeitamente instalado no quarto, até combinando com o carpete cinza-esverdeado. Mas mesmo assim não se fez perceber pelo homem que dormia na cama; esse, quando acordou, tropeçou no petardo e caiu de bruços perto da janela. Desmaiou.
Quando acordou, parecia que havia passado muito mais de duas horas que o sol indicava. Nesse tempo desmaiado, o homem entrou em transe: viajou, conheceu alguém, fez algo que não imaginava que fosse capaz, passou bons momentos ao lado da pessoa, foi feliz e então sofreu, fez mais coisas que não se imaginava sendo capaz, ficou perplexo, duvidava de tudo e de (quase) todos, preparou-se para o pior - a morte - mas com aquela esperança de que não fosse a sua hora, e assim se deu, não foi a sua hora, acordou, e o petardo tinha sumido, de alguma forma, mas o buraco na janela estivesse ali para provar que o petardo havia entrado sim. Embora achasse que estivesse sonhando desde o início, começou a cuidar cada passo que dava, evitando os petardos mas também, ao mesmo tempo, lá no fundo de sua vontade - daquela que nunca quer admitir que existe - começou a procurá-los, queria ter um encontro novamente para mostrar que um petardo pode bastar para se evitar outros.
Mas, como era de se esperar, encontrou outro petardo no caminho do banheiro, quando despreocupadamente caminhava, e a história se repetiu: o transe, os sentimentos e ações que pareciam de um sonho, inclusive o desejo de não querer e ao mesmo tempo querer encontrar um outro petardo para esclarecer que um petardo basta para se evitar outros.
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Um petardo quebrou a janela, invadiu o quarto rapidamente, alojou-se ao lado da cama enquanto um homem dormia. No outro dia, o petardo estava ali, perfeitamente instalado no quarto, até combinando com o carpete cinza-esverdeado. Mas mesmo assim não se fez perceber pelo homem que dormia na cama; esse, quando acordou, tropeçou no petardo e caiu de bruços perto da janela. Desmaiou.
Quando acordou, parecia que havia passado muito mais de duas horas que o sol indicava. Nesse tempo desmaiado, o homem entrou em transe: viajou, conheceu alguém, fez algo que não imaginava que fosse capaz, passou bons momentos ao lado da pessoa, foi feliz e então sofreu, fez mais coisas que não se imaginava sendo capaz, ficou perplexo, duvidava de tudo e de (quase) todos, preparou-se para o pior - a morte - mas com aquela esperança de que não fosse a sua hora, e assim se deu, não foi a sua hora, acordou, e o petardo tinha sumido, de alguma forma, mas o buraco na janela estivesse ali para provar que o petardo havia entrado sim. Embora achasse que estivesse sonhando desde o início, começou a cuidar cada passo que dava, evitando os petardos mas também, ao mesmo tempo, lá no fundo de sua vontade - daquela que nunca quer admitir que existe - começou a procurá-los, queria ter um encontro novamente para mostrar que um petardo pode bastar para se evitar outros.
Mas, como era de se esperar, encontrou outro petardo no caminho do banheiro, quando despreocupadamente caminhava, e a história se repetiu: o transe, os sentimentos e ações que pareciam de um sonho, inclusive o desejo de não querer e ao mesmo tempo querer encontrar um outro petardo para esclarecer que um petardo basta para se evitar outros.
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quarta-feira, dezembro 14, 2005
a duvida da certeza
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Primeira
Responsabilidades, travestidas de gritos de socorros inaudíveis mas perceptíveis a quem deve escutar;
estarei lá, ouvindo, ajudando quando possível e quando necessário, embora algumas vezes hesite por dúvida de estar ou não fazendo a coisa certa.
É algo sem convicção, é a resposta imediata ao socorro, e , como tal, não há tempo para maiores questionamentos do estar certo ou não, tudo é a primeira opinião, virgem e pusilânime, mas que precisa sair para ser mais elaborada e convicente - além de crescer como tal e tornar se a "mais certa" (?).
( Porque as pessoas insistem querer saber as respostas de tudo ? Porque elas não se contentam apenas com a dúvida ? Porque, a cada dia, certas pessoas precisam de uma confirmação que outras a amam para , assim, essas pessoas poderem viver na vã e ilusória comodidade que a "certeza" de uma resposta positiva traz? E porque o risco da dúvida não é aceito por quem tanto insiste em querer saber?)
Outras
* È a dúvida que explica o motivo da simples presença de uma pessoa trazer certos sentimentos estranhos que, levados para o aspecto físico, são como se alguém tivesse apertado um parafuso dentro do nosso peito, e que esse lugar que foi parafusado se torne tão frágil por alguns minutos, dias ou anos a ponto de a todo momento precisar de um novo aperto ?
Ou é a certeza?
* Será que essa parte frágil algum dia se tornará fixa, dura, resistente, inquebrável?
* Por que será que a certeza, em sua tão certeira e inquestionável resposta, mesmo assim não consegue aplacar a ira da dúvida, que sempre parece achar brechas nas muitas portas que a limitam?
Que dúvida cruel.
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Primeira
Responsabilidades, travestidas de gritos de socorros inaudíveis mas perceptíveis a quem deve escutar;
estarei lá, ouvindo, ajudando quando possível e quando necessário, embora algumas vezes hesite por dúvida de estar ou não fazendo a coisa certa.
É algo sem convicção, é a resposta imediata ao socorro, e , como tal, não há tempo para maiores questionamentos do estar certo ou não, tudo é a primeira opinião, virgem e pusilânime, mas que precisa sair para ser mais elaborada e convicente - além de crescer como tal e tornar se a "mais certa" (?).
( Porque as pessoas insistem querer saber as respostas de tudo ? Porque elas não se contentam apenas com a dúvida ? Porque, a cada dia, certas pessoas precisam de uma confirmação que outras a amam para , assim, essas pessoas poderem viver na vã e ilusória comodidade que a "certeza" de uma resposta positiva traz? E porque o risco da dúvida não é aceito por quem tanto insiste em querer saber?)
Outras
* È a dúvida que explica o motivo da simples presença de uma pessoa trazer certos sentimentos estranhos que, levados para o aspecto físico, são como se alguém tivesse apertado um parafuso dentro do nosso peito, e que esse lugar que foi parafusado se torne tão frágil por alguns minutos, dias ou anos a ponto de a todo momento precisar de um novo aperto ?
Ou é a certeza?
* Será que essa parte frágil algum dia se tornará fixa, dura, resistente, inquebrável?
* Por que será que a certeza, em sua tão certeira e inquestionável resposta, mesmo assim não consegue aplacar a ira da dúvida, que sempre parece achar brechas nas muitas portas que a limitam?
Que dúvida cruel.
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terça-feira, dezembro 13, 2005
I'm so tired
Deitado em seu quarto, O Garoto olha pela janela, fixa o olhar e vê um feixe dourado em forma de estrela se estender infinitamente na horizontal, como uma grande Enterprise viajando na velocidade da luz. Acende um cigarro, se debate na cama, olha a foto ao seu lado, no bidê, fica perplexo; olha fixamente para a janela, divaga, sofre, pensa - muito - sofre.
Liga o som e escuta :
Beatles, i'm so tired.
I’m so tired, I haven’t slept a wink,
I’m so tired, my mind is on the blink.
I wonder should I get up and fix myself a drink.
No, no, no.
I’m so tired I don’t know what to do.
I’m so tired my mind is set on you.
I wonder should I call you but I know what you’d do.
You’d say I’m putting you on.
But it’s no joke, it’s doing me harm.
You know I can’t sleep, I can’t stop my brain
You know it’s three weeks, I’m going insane.
You know I’d give you everything I’ve got
For a little peace of mind.
I’m so tired, I’m feeling so upset
Although I’m so tired I’ll have another cigarette
And curse Sir Walter Raleigh.
He was such a stupid git.
Acha que uma música não pode dizer tanto num momento tão verdadeiramente certeiro.
Liga o som e escuta :
Beatles, i'm so tired.
I’m so tired, I haven’t slept a wink,
I’m so tired, my mind is on the blink.
I wonder should I get up and fix myself a drink.
No, no, no.
I’m so tired I don’t know what to do.
I’m so tired my mind is set on you.
I wonder should I call you but I know what you’d do.
You’d say I’m putting you on.
But it’s no joke, it’s doing me harm.
You know I can’t sleep, I can’t stop my brain
You know it’s three weeks, I’m going insane.
You know I’d give you everything I’ve got
For a little peace of mind.
I’m so tired, I’m feeling so upset
Although I’m so tired I’ll have another cigarette
And curse Sir Walter Raleigh.
He was such a stupid git.
Acha que uma música não pode dizer tanto num momento tão verdadeiramente certeiro.
sábado, dezembro 10, 2005
Notícia de uma peça
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CADERNO DE CULTURA, página C1:
'ENDEREÇOS' CHEGA EM SANTA MARIA
Polêmica peça do diretor José Henrique tem única apresentação hoje no Treze De Maio.
por Tony Laporta
"A luz se acende, O imenso palco está dividido em três níveis: Cada nível está dividido em linhas verticais. Dentro de cada linha acontecem, entre outras, as seguinte coisas: um homem nú espanca uma mulher nua com um chicote de sete tiras, em cujas pontas estão pedaços de metal; um velho sem dentes, numa velha cozinha,coloca com mãos trêmulas enormes pedaços de goiabada na boca, como se estivesse matando; um homem gordo, sentado numa privada, lê o Jornal do Brasil, levanta-se, vira as nádegas para a platéia e limpa o ânus laboriosamente com pedaços de jornal. Enquanto isso, no plano médio, simultaneamente, uma medalha é colocada no peito de um genreal, uma mitra na cabeça de um bispo, um bebê na mão da mãe do ano, uma caixa de ferramentas é ofertada ao operário, um protetor escrotal é colocado no atleta do ano... "
Assim um crítico de um jornal do centro do país descreveu o início da peça que estréia hoje em Santa Maria. Tentou descrever, pois a peça é indescritível, garante quem assitiu . " É um negócio complexo demais, escatológico demais, maluco mesmo, mas até que eu gostei " diz Fabrício Carvalho, estudante de artes cênicas que estava no Rio de janeiro quando a preça estreiou por lá.
'Endereços' faz parte de uma absurda trilogia chamada 'Guia dos Telefones' (as outras duas partes são Páginas marelas e Assinantes) que tenta mostrar toda a "potencialidade visual do guia telefônico".
Para tentar colocar no palco peça tão polêmica ninguém melhor que o jovem diretor José Henrique, que estreiou dirigindo a peça "Dias Felizes" , de Samuel Beckett, onde colocou dois personagens inteiramente nús - a mulher manchada de fezes e o homom de sangue. A seguir, uma entrevista rápida com o diretor:
Como foi que você decidiu enfrentar o grande desafio de encarar o Guia dos Telefones?
Não sei. Acho que cansei dos velhos textos doteatro do absurdo, da crueldade, da incomunicabilidade, etc. Sentia-me enclausurado num microsegmento do multicodalismo do conhecimento humano. No ano passado encontrei-me com Tynan em Londres e ele me disse "'o grande diretor de teatro ainda não nasceu"'. No avião vim pensando, Welles, Barault, Vilar, todos apenas hubris e nada mais.
Você resolveu dirigir o Guia dos Telefones para mostrar que é um grande diretor?
Eu não preciso mostrar a(...) nenhum que sou um grande diretor. Escolhi o Guia dos Telefones por ele ser uma peça (conjunto de informações sobre o mundo) da maior importância, constantemente renovado, postatual, onde o contexto predomina sobre o texto e a analogia sobre as relações de quantidade.
Guia dos Telefones é uma trilogia. E as outras duas, pretende fazer também?
As três peças deveriam ser representadas concomitantemente. Mas a comercialização do teatro nacional e a preguiça e a burrice e a alienação dos espectadores não permitem que a encenação de uma peça de seis horas de duração.
Santa Maria. Conhece a cidade, os gaúchos, o que espera do público?
Sim óbvio que conheço vocês, esperam que façam valer a fama de "mais intelectuais do Brasil" que tanto pregam e não fiquem enbasbacados ou chocados, que palavra ridícula mas enfim, porque é uma transubstanciaçaõ em forma de teatro, teatro livre, é a vida, pessoas morrem, nascem, copulam, roubam, cagam, enfim, vivem, e isso é Endereços.
Os ingressos estão à venda na bilheteria do Teatro. R$ 15,00 normal, R$ 12,00 sócios e R$ 10,00 estudantes. O espetáculo começa às 18:30.
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P.S: notícia baseada no conto Asteriscos, de Rubem Fonseca, do livro Lucia McCartney.
CADERNO DE CULTURA, página C1:
'ENDEREÇOS' CHEGA EM SANTA MARIA
Polêmica peça do diretor José Henrique tem única apresentação hoje no Treze De Maio.
por Tony Laporta
"A luz se acende, O imenso palco está dividido em três níveis: Cada nível está dividido em linhas verticais. Dentro de cada linha acontecem, entre outras, as seguinte coisas: um homem nú espanca uma mulher nua com um chicote de sete tiras, em cujas pontas estão pedaços de metal; um velho sem dentes, numa velha cozinha,coloca com mãos trêmulas enormes pedaços de goiabada na boca, como se estivesse matando; um homem gordo, sentado numa privada, lê o Jornal do Brasil, levanta-se, vira as nádegas para a platéia e limpa o ânus laboriosamente com pedaços de jornal. Enquanto isso, no plano médio, simultaneamente, uma medalha é colocada no peito de um genreal, uma mitra na cabeça de um bispo, um bebê na mão da mãe do ano, uma caixa de ferramentas é ofertada ao operário, um protetor escrotal é colocado no atleta do ano... "
Assim um crítico de um jornal do centro do país descreveu o início da peça que estréia hoje em Santa Maria. Tentou descrever, pois a peça é indescritível, garante quem assitiu . " É um negócio complexo demais, escatológico demais, maluco mesmo, mas até que eu gostei " diz Fabrício Carvalho, estudante de artes cênicas que estava no Rio de janeiro quando a preça estreiou por lá.
'Endereços' faz parte de uma absurda trilogia chamada 'Guia dos Telefones' (as outras duas partes são Páginas marelas e Assinantes) que tenta mostrar toda a "potencialidade visual do guia telefônico".
Para tentar colocar no palco peça tão polêmica ninguém melhor que o jovem diretor José Henrique, que estreiou dirigindo a peça "Dias Felizes" , de Samuel Beckett, onde colocou dois personagens inteiramente nús - a mulher manchada de fezes e o homom de sangue. A seguir, uma entrevista rápida com o diretor:
Como foi que você decidiu enfrentar o grande desafio de encarar o Guia dos Telefones?
Não sei. Acho que cansei dos velhos textos doteatro do absurdo, da crueldade, da incomunicabilidade, etc. Sentia-me enclausurado num microsegmento do multicodalismo do conhecimento humano. No ano passado encontrei-me com Tynan em Londres e ele me disse "'o grande diretor de teatro ainda não nasceu"'. No avião vim pensando, Welles, Barault, Vilar, todos apenas hubris e nada mais.
Você resolveu dirigir o Guia dos Telefones para mostrar que é um grande diretor?
Eu não preciso mostrar a(...) nenhum que sou um grande diretor. Escolhi o Guia dos Telefones por ele ser uma peça (conjunto de informações sobre o mundo) da maior importância, constantemente renovado, postatual, onde o contexto predomina sobre o texto e a analogia sobre as relações de quantidade.
Guia dos Telefones é uma trilogia. E as outras duas, pretende fazer também?
As três peças deveriam ser representadas concomitantemente. Mas a comercialização do teatro nacional e a preguiça e a burrice e a alienação dos espectadores não permitem que a encenação de uma peça de seis horas de duração.
Santa Maria. Conhece a cidade, os gaúchos, o que espera do público?
Sim óbvio que conheço vocês, esperam que façam valer a fama de "mais intelectuais do Brasil" que tanto pregam e não fiquem enbasbacados ou chocados, que palavra ridícula mas enfim, porque é uma transubstanciaçaõ em forma de teatro, teatro livre, é a vida, pessoas morrem, nascem, copulam, roubam, cagam, enfim, vivem, e isso é Endereços.
Os ingressos estão à venda na bilheteria do Teatro. R$ 15,00 normal, R$ 12,00 sócios e R$ 10,00 estudantes. O espetáculo começa às 18:30.
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P.S: notícia baseada no conto Asteriscos, de Rubem Fonseca, do livro Lucia McCartney.
quinta-feira, dezembro 08, 2005
Revista de criticas (1)
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On the Road – Jack Kerouac
Um dos clássicos da Contracultura, desencadeador da rebeldia de muita gente, livro de ouro dos viajantes. Um chute nos bagos da felicidade inocente dos anos 50 pós-guerra, vilão do American way of life. A babá de uma geração vazia. Muitas expressões que talvez ajudem a definir o que é o livro On the Road - do escritor americano Jack Kerouac.
Lançado em 1957, me atrevo a dizer que é um dos livros do século XX que mais causam um “baque” nos leitores – principalmente em jovens dos 18 aos vinte e poucos anos. Mesmo no Brasil, em que primeira edição saiu em 1984, traduzida em conjunto pelo jornalista Eduardo Bueno e o escritor Antonio Bivar, ele inspirou músicas, pessoas, idéias, comportamentos, atitudes – trouxe um alento de que as coisas poderiam ser diferentes e muito mais interessantes também por aqui.
A história se passa no final dos anos 40 e início dos 50, nos Estados Unidos. Sal Paradise, o narrador (alter-ego do autor Jack Kerouac), e seu amigo , o louco anarquista vagabundo Dean Moriarty, viajam pelos Estados Unidos com pouco dinheiro e muita vontade de fazer algo que eles nem sabem o quê. No caminho, circulam pelos confins dos Estados Unidos inocentemente feliz e conservador do pós-guerra; encontram e fazem muitos amigos, passam dificuldades, bebem; fazem festas, visitam lugares esquecidos e conhecidos, ouvem muito jazz. Quase inconscientes pelo pusilânime mundo ao seu redor, vão em busca de experiências. As encontram travestidas de formas tão estranhas que quase não as reconhecem. Mas é isso mesmo? , perguntam. E é, é isso mesmo, mas como só agora vocês foram perceber ?
On the Road é precursor e inspirador. A busca de uma individualidade perdida , que parecia tão diluída entre os louros da camaradagem e do patriotismo da vitória na guerra, teve um quase fim (pois nunca terá um fim definitivo) nos clubes de jazz ao som do be-bop desordenado ou na marijuana trocada por lucky strikes no México na última das viagens do livro. A rebeldia, como forma de ser contra ao tradicional, de dar um soco na cara da mesmice e depois ser presa por isso, ganhou um corpo consistente nas palavras de Kerouac. E a literatura como forma de transcendência, aquela que pula das páginas para nosso corpo e mente e de lá sai correndo como um cadillac possante nos puxando para a vida, como que dizendo não, você é tão medroso, acorde, veja o que te espera, deve muito a On the Road.
Depois de quase 40 anos de espera, finalmente o livro vai virar filme, pelas mãos do diretor brasileiro Walter Salles, com a produção do mestre americano Francis Ford Coppola. Coisa boa está por vir.
A primeira versão do livro é de 1984, da editora Brasiliense. Recentemente saiu uma edição revisada com uma nova introdução e posfácio de Eduardo Bueno.
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p.s: o teclado nao esta colaborando com os acentos.
On the Road – Jack Kerouac
Um dos clássicos da Contracultura, desencadeador da rebeldia de muita gente, livro de ouro dos viajantes. Um chute nos bagos da felicidade inocente dos anos 50 pós-guerra, vilão do American way of life. A babá de uma geração vazia. Muitas expressões que talvez ajudem a definir o que é o livro On the Road - do escritor americano Jack Kerouac.
Lançado em 1957, me atrevo a dizer que é um dos livros do século XX que mais causam um “baque” nos leitores – principalmente em jovens dos 18 aos vinte e poucos anos. Mesmo no Brasil, em que primeira edição saiu em 1984, traduzida em conjunto pelo jornalista Eduardo Bueno e o escritor Antonio Bivar, ele inspirou músicas, pessoas, idéias, comportamentos, atitudes – trouxe um alento de que as coisas poderiam ser diferentes e muito mais interessantes também por aqui.
A história se passa no final dos anos 40 e início dos 50, nos Estados Unidos. Sal Paradise, o narrador (alter-ego do autor Jack Kerouac), e seu amigo , o louco anarquista vagabundo Dean Moriarty, viajam pelos Estados Unidos com pouco dinheiro e muita vontade de fazer algo que eles nem sabem o quê. No caminho, circulam pelos confins dos Estados Unidos inocentemente feliz e conservador do pós-guerra; encontram e fazem muitos amigos, passam dificuldades, bebem; fazem festas, visitam lugares esquecidos e conhecidos, ouvem muito jazz. Quase inconscientes pelo pusilânime mundo ao seu redor, vão em busca de experiências. As encontram travestidas de formas tão estranhas que quase não as reconhecem. Mas é isso mesmo? , perguntam. E é, é isso mesmo, mas como só agora vocês foram perceber ?
On the Road é precursor e inspirador. A busca de uma individualidade perdida , que parecia tão diluída entre os louros da camaradagem e do patriotismo da vitória na guerra, teve um quase fim (pois nunca terá um fim definitivo) nos clubes de jazz ao som do be-bop desordenado ou na marijuana trocada por lucky strikes no México na última das viagens do livro. A rebeldia, como forma de ser contra ao tradicional, de dar um soco na cara da mesmice e depois ser presa por isso, ganhou um corpo consistente nas palavras de Kerouac. E a literatura como forma de transcendência, aquela que pula das páginas para nosso corpo e mente e de lá sai correndo como um cadillac possante nos puxando para a vida, como que dizendo não, você é tão medroso, acorde, veja o que te espera, deve muito a On the Road.
Depois de quase 40 anos de espera, finalmente o livro vai virar filme, pelas mãos do diretor brasileiro Walter Salles, com a produção do mestre americano Francis Ford Coppola. Coisa boa está por vir.
A primeira versão do livro é de 1984, da editora Brasiliense. Recentemente saiu uma edição revisada com uma nova introdução e posfácio de Eduardo Bueno.
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p.s: o teclado nao esta colaborando com os acentos.
terça-feira, dezembro 06, 2005
Incertos conselhos
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De alguém diante do espelho, após uma noite sem graça, às 23:00.
_ Incerteza, cara amiga tão relutante em ser despertada, venha me salvar. Preciso da tua ajuda, da tua compreensão, da tua tão singela sabedoria de nunca saber a hora certa das coisas, mas de apenas sentir ,e isso bastar. Preciso que tu venhas e combata o teu algoz com duas letras a menos, preciso que tu digas para ele que , sim, ele é necessário, mas que ele não pode se apossar da vida de ninguém e ser o guia onipresente de todas as ações, como se nada sem ele possa existir. Venha mostrar para esse teu algoz - inimigo chato, cruel - que a tua forma de guiar é muito mais sabedora do caminho daquilo que alguém inventou chamar de felicidade - o que quase sempre se confunde com outra palavra chamada diversão, sendo , talvez, essa mais coerente e respeitável aos olhos famintos por facilidades que nós temos e insistimos em disfarçar para não sermos tachados de simplórios.
De uma psicóloga para seu cliente, rapaz de 23 anos com propensão a depressão ( embora não tenha tido nenhum ataque psicótico ainda )
_ Se o pudor é exagerado a ponto de impedir que a diversão busque seu espaço tão caro a todos nós, porque não mudá-lo, moldá-lo de acordo com os estímulos diversionais que a todo momento clamam por nossa atenção? Nós não somos bons por natureza, certas atitudes consideradas ruins são necessárias, talvez porque possamos pensar que elas são ruins para nós mas na verdade são apenas causadoras de uma "dor" que é necessária e indispensável para o crescimento, embora difícil é aceitarmos isso sem sofrimento.
De um professor de sociologia a um intelectual que recém se separou da mulher, com quem foi casado por 23 anos:
_ São princípios relutantes em serem aceitos, mas nunca impossíveis de serem transformados, já que, ao se saber do tão grave erro que se comete em não aderir a certos comportamentos comprovadamente mais eficazes na busca da diversão - que é, afinal o que todos queremos -, porque não abrir a gaveta trancada dos princípios adquiridos a muito custo e pouca escolha da infância e aceitar alguns novos? Ainda mais que, com esses novos, os antigos podem ser mudados e se tornarem ainda mais eficazes em suas tarefas e conscientes de sua função.
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De alguém diante do espelho, após uma noite sem graça, às 23:00.
_ Incerteza, cara amiga tão relutante em ser despertada, venha me salvar. Preciso da tua ajuda, da tua compreensão, da tua tão singela sabedoria de nunca saber a hora certa das coisas, mas de apenas sentir ,e isso bastar. Preciso que tu venhas e combata o teu algoz com duas letras a menos, preciso que tu digas para ele que , sim, ele é necessário, mas que ele não pode se apossar da vida de ninguém e ser o guia onipresente de todas as ações, como se nada sem ele possa existir. Venha mostrar para esse teu algoz - inimigo chato, cruel - que a tua forma de guiar é muito mais sabedora do caminho daquilo que alguém inventou chamar de felicidade - o que quase sempre se confunde com outra palavra chamada diversão, sendo , talvez, essa mais coerente e respeitável aos olhos famintos por facilidades que nós temos e insistimos em disfarçar para não sermos tachados de simplórios.
De uma psicóloga para seu cliente, rapaz de 23 anos com propensão a depressão ( embora não tenha tido nenhum ataque psicótico ainda )
_ Se o pudor é exagerado a ponto de impedir que a diversão busque seu espaço tão caro a todos nós, porque não mudá-lo, moldá-lo de acordo com os estímulos diversionais que a todo momento clamam por nossa atenção? Nós não somos bons por natureza, certas atitudes consideradas ruins são necessárias, talvez porque possamos pensar que elas são ruins para nós mas na verdade são apenas causadoras de uma "dor" que é necessária e indispensável para o crescimento, embora difícil é aceitarmos isso sem sofrimento.
De um professor de sociologia a um intelectual que recém se separou da mulher, com quem foi casado por 23 anos:
_ São princípios relutantes em serem aceitos, mas nunca impossíveis de serem transformados, já que, ao se saber do tão grave erro que se comete em não aderir a certos comportamentos comprovadamente mais eficazes na busca da diversão - que é, afinal o que todos queremos -, porque não abrir a gaveta trancada dos princípios adquiridos a muito custo e pouca escolha da infância e aceitar alguns novos? Ainda mais que, com esses novos, os antigos podem ser mudados e se tornarem ainda mais eficazes em suas tarefas e conscientes de sua função.
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sábado, dezembro 03, 2005
Seu Benevides
Historieta de um tempo atrás:
Seu benevides
Onde está meu cachorro?
Era só o que sabia dizer o homem, deitado na calçada à frente de seu prédio, com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
O guarda Benevides não sabia o que responder. Não sabia de cachorro nenhum, não sabia que homem era aquele, nem o que fazia ali na rua tarde da noite, muito menos o porquê da cabeça dele estar vermelha de sangue.
Onde está o cachorro, porra?
Não se cansava de repetir. O guarda Benevides estava ficando irritado; mandou o moço se acalmar que ele não tinha visto nenhum cachorro por ali. Iria chamar a ambulância, se o moço quisesse, para tratar de cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
Daí o guarda Benevides não agüentou: deu um chute na boca do estômago do moço, pum, que urrou de dor, mas depois ficou calado, e não se mexeu mais. O guarda mandou ele se acalmar , que não tinha cachorro nenhum por ali, e que era para o moço ficar quieto, se não ele mesmo o levaria a força para um hospital.
..
O guarda Benevides, ou Seu Benevides, como o chamavam os grã-finos do bairro, era guarda-noturno há 10 anos. Nunca se incomodara nesse tempo. Trabalho fácil. Os marginais, por algum motivo que ele desconhecia e nem queria saber, passavam longe dos prédios dos grã-finos. E ele achava o máximo isso, se sentia poderoso. Os marginais tinham medo do Seu Benevides, era nisso que acreditava.
Uma vez tinha visto dois homens sentados na frente da calçada do prédio do Juca, o porteiro, que era seu primo. Notou de longe o naipe das figuras, e foi se aproximando aos pouquinhos, caminhando sem pressa. Botou a mão no bolso e apertou firme a calça jeans , como sempre fazia quando estava diante de um perigo iminente. Aproximou da calçada do prédio, tirou seu boné e abanou para as figuras sentadas, que não responderam. Benevides parou e repetiu o gesto. Dessa vez os homens olharam para ele, mas não fizeram nenhum sinal. Benevides, irritado, chegou mais perto, perguntou, educadamente, o que os dois faziam ali sentados àquela hora da noite. Nada de resposta. Então, pegou seu cacetete de aço de dentro do casaco e bateu nos dois, pum pum, duas pauladas, uma em cada cabeça, sem quase nenhum intervalo de tempo . Os dois caíram no chão, com suas cabeças em um vermelho cor de sangue. Benevides olhou para dentro do prédio para ver se Juca estaria por ali , mas não achou ninguém, e tratou de terminar o serviço. Deu mais dois chutes em cada um, na boca do estômago e nas costas, pum pum, rápido, sem intervalo, que nem aqueles ninjas de filme chinês. Com calma, pegou os corpos, um de cada vez, e tratou de embrulhá-los nos sacos de lixo que tinha em sua mochila. Carregou cada corpo até a casa abandonada da esquina, onde pacientemente terminou o serviço à luz de uma pequena fogueira, cortando-os em pedaços com uma serra e alimentando o seu cachorro Rex, velho já, que por sua vez estava tratando de uma enorme mordida no pescoço que levara uma semana antes. O cachorro estava deitado num canto escuro, em baixo de uma janela aberta, e quando Benevides chamou-o, Rex,Rex, vem cá, o cachorro pulou de alegria e lambeu a mão vermelha do seu dono, parecendo já recuperado do ferimento. Benevides mostrou os pedaços para Rex, que latiu baixinho de felicidade, e logo depois estava os dois, guarda e cachorro, sentados sob a luz da fogueira, um olhando o outro comer, os dois igualmente com uma alegria indescritível em seus rostos cansados.
Fazia dois anos que Rex se fora. Seu Benevides não foi trabalhar no fatídico dia, passou a noite chorando em casa. Depois que se recuperou, nunca mais encontrou outro cachorro decente. De vez em quando achava um na rua, perdido, levava para casa, treinava-o, mas logo depois eles iam embora, ingratos. No mês passado, tinha encontrado um igual ao Rex, mas igualzinho mesmo. Ficou intrigado porque Rex nunca teve filho, Benevides nunca deixou seu cachorro por aí para engravidar cachorrinhas interessadas no seu sêmen de campeão. Mas, de alguma forma, o cachorro era igualzinho a Rex, e só poderia ser filho dele, ou quem sabe pai, porque Rex morreu cedo, com 4 anos .
Observou o cachorro parecido com Rex por algumas semanas, conheceu seu dono, viu sua casa, seus hábitos, onde passeava, suas vizinhas. Descobriu então que o cachorro era irmão gêmeo de Rex. O dono namorava a moça loira que morava no prédio do Juca, seu primo, e todo dia que vinha visitar a namorada trazia o irmão do Rex junto. Uma semana atrás, tinha tido o primeiro contato com o bicho, numa esbarrada. O cachorro saiu correndo lépido pelo corredor do prédio e Benevides, que conversava com Juca, parou e fez uns carinhos no cão, que logo se acalmou e se fez de morto, para a alegria de Benevides que assim o acariciou com vigor, passando sua mão vermelha por todo o corpo tez do cachorro. Ali fez uma promessa: o cachorro ia ser seu, de qualquer maneira.
Arquitetou um plano que não poderia ter falhas, porque só teria uma chance, era matar ou morrer.
Não queria envolver seu primo Juca, mas era a única forma, não tinha muito tempo. Sabia que o irmão do Rex estava sendo cortejado pela cachorra do prédio vizinho. Já tinham até marcado um encontro para ver se os dois se dariam bem, e os donos aprovavam a união, torcendo para que dali saísse muitos cachorrinhos . Benevides pediu para Juca : quando o dono do irmão do Rex estiver saindo da casa da namorada, avisa que tem um moço que quer falar com ele na frente do prédio. Não deu mais detalhes , não precisava envolver demais as pessoas para uma coisa que iria ser só sua, unicamente sua . Juca fez o combinado. Benevides esperava ansioso na calçada, com a mão no bolso apertando ferozmente a calça jeans. Quando avistou o moço, tratou de se aproximar devagar, com cuidado para não apavorá-lo. Perguntou, educadamente, como era o nome do cachorro. Sabia que era Kuki , mas achou que era uma boa primeira pergunta. O homem respondeu , também educadamente, e Benevides se abaixou para fazer carinho no irmão do Rex. Enquanto fazia carinho, puxou seu cacetete de aço de dentro do casaco, devagar , e deu uma paulada na nuca do moço, que estava de costas para ele. Pum. O moço já caiu desmaiado no chão. Agora tinha que agir rápido. Pegou o cachorro no colo e saiu correndo em direção à casa abandonada da esquina. Ao redor de uma pequena fogueira, fez o bicho deitar, deu água, fez carinho até ele se acalmar e quase dormir, bocejando . Então saiu , voltou para o prédio. Viu o homem ali na frente, que ainda estava acordado, inexplicavelmente.
Onde está meu cachorro ?
Era só o que dizia o homem, deitado na calçada com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
Benevides não sabia o que responder. Tentou se acalmar. Disse que não tinha visto cachorro algum ali , que ia chamar uma ambulância , se o moço quisesse, para tratar da cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
.
Seu benevides
Onde está meu cachorro?
Era só o que sabia dizer o homem, deitado na calçada à frente de seu prédio, com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
O guarda Benevides não sabia o que responder. Não sabia de cachorro nenhum, não sabia que homem era aquele, nem o que fazia ali na rua tarde da noite, muito menos o porquê da cabeça dele estar vermelha de sangue.
Onde está o cachorro, porra?
Não se cansava de repetir. O guarda Benevides estava ficando irritado; mandou o moço se acalmar que ele não tinha visto nenhum cachorro por ali. Iria chamar a ambulância, se o moço quisesse, para tratar de cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
Daí o guarda Benevides não agüentou: deu um chute na boca do estômago do moço, pum, que urrou de dor, mas depois ficou calado, e não se mexeu mais. O guarda mandou ele se acalmar , que não tinha cachorro nenhum por ali, e que era para o moço ficar quieto, se não ele mesmo o levaria a força para um hospital.
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O guarda Benevides, ou Seu Benevides, como o chamavam os grã-finos do bairro, era guarda-noturno há 10 anos. Nunca se incomodara nesse tempo. Trabalho fácil. Os marginais, por algum motivo que ele desconhecia e nem queria saber, passavam longe dos prédios dos grã-finos. E ele achava o máximo isso, se sentia poderoso. Os marginais tinham medo do Seu Benevides, era nisso que acreditava.
Uma vez tinha visto dois homens sentados na frente da calçada do prédio do Juca, o porteiro, que era seu primo. Notou de longe o naipe das figuras, e foi se aproximando aos pouquinhos, caminhando sem pressa. Botou a mão no bolso e apertou firme a calça jeans , como sempre fazia quando estava diante de um perigo iminente. Aproximou da calçada do prédio, tirou seu boné e abanou para as figuras sentadas, que não responderam. Benevides parou e repetiu o gesto. Dessa vez os homens olharam para ele, mas não fizeram nenhum sinal. Benevides, irritado, chegou mais perto, perguntou, educadamente, o que os dois faziam ali sentados àquela hora da noite. Nada de resposta. Então, pegou seu cacetete de aço de dentro do casaco e bateu nos dois, pum pum, duas pauladas, uma em cada cabeça, sem quase nenhum intervalo de tempo . Os dois caíram no chão, com suas cabeças em um vermelho cor de sangue. Benevides olhou para dentro do prédio para ver se Juca estaria por ali , mas não achou ninguém, e tratou de terminar o serviço. Deu mais dois chutes em cada um, na boca do estômago e nas costas, pum pum, rápido, sem intervalo, que nem aqueles ninjas de filme chinês. Com calma, pegou os corpos, um de cada vez, e tratou de embrulhá-los nos sacos de lixo que tinha em sua mochila. Carregou cada corpo até a casa abandonada da esquina, onde pacientemente terminou o serviço à luz de uma pequena fogueira, cortando-os em pedaços com uma serra e alimentando o seu cachorro Rex, velho já, que por sua vez estava tratando de uma enorme mordida no pescoço que levara uma semana antes. O cachorro estava deitado num canto escuro, em baixo de uma janela aberta, e quando Benevides chamou-o, Rex,Rex, vem cá, o cachorro pulou de alegria e lambeu a mão vermelha do seu dono, parecendo já recuperado do ferimento. Benevides mostrou os pedaços para Rex, que latiu baixinho de felicidade, e logo depois estava os dois, guarda e cachorro, sentados sob a luz da fogueira, um olhando o outro comer, os dois igualmente com uma alegria indescritível em seus rostos cansados.
Fazia dois anos que Rex se fora. Seu Benevides não foi trabalhar no fatídico dia, passou a noite chorando em casa. Depois que se recuperou, nunca mais encontrou outro cachorro decente. De vez em quando achava um na rua, perdido, levava para casa, treinava-o, mas logo depois eles iam embora, ingratos. No mês passado, tinha encontrado um igual ao Rex, mas igualzinho mesmo. Ficou intrigado porque Rex nunca teve filho, Benevides nunca deixou seu cachorro por aí para engravidar cachorrinhas interessadas no seu sêmen de campeão. Mas, de alguma forma, o cachorro era igualzinho a Rex, e só poderia ser filho dele, ou quem sabe pai, porque Rex morreu cedo, com 4 anos .
Observou o cachorro parecido com Rex por algumas semanas, conheceu seu dono, viu sua casa, seus hábitos, onde passeava, suas vizinhas. Descobriu então que o cachorro era irmão gêmeo de Rex. O dono namorava a moça loira que morava no prédio do Juca, seu primo, e todo dia que vinha visitar a namorada trazia o irmão do Rex junto. Uma semana atrás, tinha tido o primeiro contato com o bicho, numa esbarrada. O cachorro saiu correndo lépido pelo corredor do prédio e Benevides, que conversava com Juca, parou e fez uns carinhos no cão, que logo se acalmou e se fez de morto, para a alegria de Benevides que assim o acariciou com vigor, passando sua mão vermelha por todo o corpo tez do cachorro. Ali fez uma promessa: o cachorro ia ser seu, de qualquer maneira.
Arquitetou um plano que não poderia ter falhas, porque só teria uma chance, era matar ou morrer.
Não queria envolver seu primo Juca, mas era a única forma, não tinha muito tempo. Sabia que o irmão do Rex estava sendo cortejado pela cachorra do prédio vizinho. Já tinham até marcado um encontro para ver se os dois se dariam bem, e os donos aprovavam a união, torcendo para que dali saísse muitos cachorrinhos . Benevides pediu para Juca : quando o dono do irmão do Rex estiver saindo da casa da namorada, avisa que tem um moço que quer falar com ele na frente do prédio. Não deu mais detalhes , não precisava envolver demais as pessoas para uma coisa que iria ser só sua, unicamente sua . Juca fez o combinado. Benevides esperava ansioso na calçada, com a mão no bolso apertando ferozmente a calça jeans. Quando avistou o moço, tratou de se aproximar devagar, com cuidado para não apavorá-lo. Perguntou, educadamente, como era o nome do cachorro. Sabia que era Kuki , mas achou que era uma boa primeira pergunta. O homem respondeu , também educadamente, e Benevides se abaixou para fazer carinho no irmão do Rex. Enquanto fazia carinho, puxou seu cacetete de aço de dentro do casaco, devagar , e deu uma paulada na nuca do moço, que estava de costas para ele. Pum. O moço já caiu desmaiado no chão. Agora tinha que agir rápido. Pegou o cachorro no colo e saiu correndo em direção à casa abandonada da esquina. Ao redor de uma pequena fogueira, fez o bicho deitar, deu água, fez carinho até ele se acalmar e quase dormir, bocejando . Então saiu , voltou para o prédio. Viu o homem ali na frente, que ainda estava acordado, inexplicavelmente.
Onde está meu cachorro ?
Era só o que dizia o homem, deitado na calçada com a cabeça vermelha de sangue.
Onde está meu cachorro, porra?
Benevides não sabia o que responder. Tentou se acalmar. Disse que não tinha visto cachorro algum ali , que ia chamar uma ambulância , se o moço quisesse, para tratar da cabeça dele vermelha de sangue.
Não preciso de ambulância nenhuma, eu quero o meu cachorro guarda de merda!
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quinta-feira, dezembro 01, 2005
Indagações de um incompreendido
Ah, se as pessoas soubessem que a crítica, por mais arrogante que possa parecer, não é com a intenção de diminuir alguém ou algo, mas com a simples e singela intenção de ajudar a melhorar. O que pode estar errado é o ponto de vista defendido por quem critica, mas, acredito eu, na maioria das vezes que a crítica é veemente, teimosa, é porque quem a faz está muito certo de que aquilo é o melhor caminho, que a coragem de se expor ao criticar é uma forma de garantir a honestidade e a intenção de ajudar a melhorar o algo/alguém criticado.
Claro, posso estar completamente equivocado nisso.
Ah, seu eu aguento ouvir
outro não, quem sabe um talvez
ou um sim
eu mereço enfim
é que eu já sei de cor
qual o quê dos quais
e poréns, dos afins, pense bem
ou não pense assim
- Los Hermanos, Paquetá -
Claro, posso estar completamente equivocado nisso.
Ah, seu eu aguento ouvir
outro não, quem sabe um talvez
ou um sim
eu mereço enfim
é que eu já sei de cor
qual o quê dos quais
e poréns, dos afins, pense bem
ou não pense assim
- Los Hermanos, Paquetá -
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