domingo, março 25, 2007

Instantâneas (1)

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De vinil


Domingo de manhã. Não chove lá fora mas ameaça. Céu cinza claro, que tão bem combina com a preguiça do domingo. Abre-se a cortina do quarto; aos poucos a claridade também vai revelando a poeira deixada no chão avermelhado da noite anterior, regada à luzes confusas de abajur, amarelas como não há outro amarelo.
Amarelo. Cinza. Vermelho.
Silêncio na rua, iluminada em preto e branco pelo sol cinza de perto do meio dia. Alguns movimentos na rua tentam ser coloridos, mas se entregam quando vêem a fumaça, de um cinza mais escuro, saindo de algumas já acesas churrasqueiras.
Caminha-se tranquilamente até o banheiro, necessidades matinais. Caretas no espelho, à procura de espinha e das lembranças da noite anterior. Cozinha ainda escura, acende-se a luz p&b e o café é preparado.
O destino agora é o quartinho mais escuro ainda. O depósito, dos objetos inúteis da casa e das coisas que pararam no tempo, está dessarumado, almofadas ocupam o único sofá. Dá para sentar igual, assim como esticar as pernas e colocá-las na cadeira em frente da escrivaninha. Gole no café quente traz de volta a lembrança do dia anterior, quando o mesmo café era companheiro da idéia de deixar a manhã de domingo para se escutar música, somente. O aparelho ao lado do sofá acende a luzinha amarela, primeira imagem colorida do dia. Volta-se a atenção para ele. Caixa ligada começa a emitir um som gorduroso, a começar pelo baixo grandão e a terminar pela voz nitidamente gravada ao vivo, há uns 36, 37 anos atrás, mais precisamente.
O olhar para a parede cheia de medalhas, uma mão segurando a xícara de café, o ouvido quase grudado na caixa de som, o domingo se torna o mesmo de umas décadas atrás, quando, ainda como um projeto de nascimento na cabeça de uma jovem mulher, ele reinvindava um domingo como esses, musical e p&b, saído diretamente de um disco de vinil.


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terça-feira, março 20, 2007

Cortazarianas Beatniks (5)

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Com o meu outro blog em férias forçadas pelas diversas ocasiões pra lá de extasiantes ocorridas nos últimos dias, esse aqui pode vir a ser atualizado mais frequente, sem mais posts pedindo desculpas a si mesmo.

Retomo aqui uma velha seção nomeada "Cortazarianas Beatniks". O nome dela já diz tudo de suas influências, embora não especifique muito bem quais suas verdadeiras intenções. Creio que seja como um treino, um exercício de criação de metáforas.

Esse trecho abaixo é retirado de um possível conto meu, nomeado Passeio:

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É então que junta sua cabeça com o joelho e encosta ambos na mesma única pedra presente, para desta forma sentir a estranha trepidação que o percorre por dentro, indo do último fio de cabelo encharcado ao dedo do pé aquecido dentro do tênis que reúne todas as forças possíveis para se juntar ao restante do corpo e encostar-se à pedra, que agora parece estar quente com uma secreção brotada dele, e é através desse líquido que a pedra vai revelando, na mesma velocidade com que vai sendo molhada, os diversos destinos que parecem se agrupar em pequeninos pontos que agora preenchem toda a vasta superfície da pedra e que a transformam em uma poça d’água que ele acaba de pisar, revelando, como num espelho quebrado, as diversas facetas grotescas das escoriações que estão no seu corpo como lâminas enfileiradas numa suposta formação de um conjunto marcial apontando para os mesmos destinos que antes se revelaram na superfície da pedra, infinitos, desconexos, mas formatados e direcionados à algum lugar já conhecido (...)
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segunda-feira, março 12, 2007

Correria

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Correria de final de curso, início da vida pós-moleza de estudar, comer, durmir e outras cositas mais sem se preocupar em se sustentar.
Aqueles períodos em que o "inconsciente" pede para ser escutado e a correria das obrigações para amanhã, estritamente necessárias para ontem, torna isso impossível. Mas vai ter uma hora, talvez a hora certa, que a "resposta" do insconsciente, a tanto tempo trabalhada e praticamente pronta, sairá ao natural, e vai trazer o caminho a ser seguido.
Talvez o melhor caminho, talvez o por mais tempo desejado, talvez o tão difícil que até se tenha esquecido, talvez o mais fácil e burocrático: ainda não tive tempo para escutá-lo e saber o que ele me apresenta.
Mas semana que vem farei isso.

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