quinta-feira, julho 27, 2006

Idéias

.

Poderia existir um ranking de níveis de habilidade para escrever e ter idéias, ou melhor, que medisse a capacidade de juntar as duas.

O primeiro nível além do básico de conhecer as regras ortográficas para saber escrever é o ter idéias para expressar. Elas vem confusas, e geralmente são expressas de forma desordenadas, sem muito cuidado na escolha das palavras mais adequadas. Normalmente chamam de "escrita automática", mas um automática por não ter outra opção, já que existe o automática por opção, que é de outro nível, mais avançado.

O segundo nível é quando o vocabulário iguala-se as idéias. Houve alguma leitura para que isso pudesse acontecer, mas ainda há certa dificuldade em escrever coisas descomplicadas. A escrita já não é tão automática, mas ainda não existe a percepção de que esse tipo de escrita é típica do primeiro nível - se houvesse, o estilo seria imediatamente abandonado.

O terceiro nível inicia pelo novo avanço das idéias, que voltam a ficar à frente das palavras. Pensando em inovar, já se procura ler algumas coisas "complexas", narrativas modernistas que fogem do banal e levam as idéias para passear longe. Quando voltam, elas ficam atordoadas, pois não sabem ser expressadas como deveriam. É uma fase rápida: no momento em que as idéias estão presas, não tem outra saída que não ler mais, e aí avança-se um nível.

O quarto nível é marcado pelo novo nivelamento das idéias com as palavras. Surge através de leituras de livros considerados "simples", mas, só agora isso é percebido, a simplicidade é muito mais complexa e difícil de atingir. As idéias conseguem ser domadas, embora com dificuldades. A "escrita automática" é coisa do passado; as "sacadas legais" são cada vez menos frequentes.

O quinto nível eu não sei.

..

segunda-feira, julho 24, 2006

No more

.

Com o outro blog a pleno vapor esse aqui ficou um pouco esquecido, coitado. Mas é que o o outro é jornalismo, esse é um pouco de tudo, e nesses últimos tempos, só tenho feito jornalismo, não um pouco de tudo.

Como sei que é apenas uma fase, manterei esse com uma atualização periódica, não tanto quanto antes, mas talvez uma vez por semana.


..

domingo, julho 16, 2006

Descrição

.

Exercício de tentativa de descrever músicas do "The Piper at gates of Dawn", primeiro álbum do Pink Floyd. Ácido puro, o álbum.

Astronomy Domine - Imagine uma nave voando pelo espaço. Devagar, ela se aproxima da terra, e começa a sobrevoá-la rapidamente. Então, o seu comandante aparece numa espécie de sacada, dentro da nave, para fazer seu pronunciamento aos terráqueos. O teor das palavras é de sabedoria, mas o tom parece ser de repúdio a raça humana. Por fim, ninguém entende o que acontece e a nave sai da Terra para continuar sua viagem rumo ao desconhecido.

Lúcifer Sam - Deitado na sala de sua casa na beira da praia, fumando o nono baseado seguido, o cara está sozinho. De repente, vê (ou acha que vê) um gatinho siâmes pular pela sala, lépido e curioso. O cara tenta acompanhá-lo, pegar o tal gatinho no colo, mas não consegue. Por fim, desiste. Dias depois, sonha com o gatinho; mais dias depois, vê novamente ele circulando pela sala; mais dias, mais visões, e ele resolve deixar de compreender que diabos o gatinho tanto faz em sua casa. Trecho da letra:

Lucifer Sam, Siam cat.
Always sitting by your side,
always by your side.
That cat's something I can't explain


The Scarecrow - O filho pequeno pede para seu pai contar uma história. O pai parece estar meio alterado psicologicamente, e em vez de contar uma historinha boba para o filho dormir, resolve contar a história de um espantalho. Começa, o filho fica com medo, mas acaba por cair no sono, cansado. O pai continua, cada vez mais alterado, até se dar conta de que ele era o espantalho da história. Vai para o seu quarto, não consegue dormir.

Letra:
The black and green scarecrow,
as everyone knows,
stood with a bird on his hat
and straw everywhere.
He didn't care....
He stood in a field where barley grows.
His head did no thinking, his arms didn't move,
except when the wind cut up rough
and mice ran around on the ground.
He stood in a field where barley grows.
The black and green scarecrow is sadder than me,
but now he's resigned to his fate
'cause life's not unkind.
He doesn't mind.
He stood in a field where barley grows


Matilda Mother - Um conto medieval escrito por um prisioneiro, considerado mentalmente instável e perturbado, em sua cela no auto da torre, contado para diversos ratos, também presentes na cela.


..

sábado, julho 08, 2006

Dia

"Permanecia uma hora inteira mergulhado dentro da banheira, escutando música, até a água ficar fria. E especialmente ali, dentro da água, eu me sentia cansado. Velho, em certo sentido. No sentido de que era tarde demais pra morrer jovem."

Daniel Galera, Até o dia em que o cão morreu

.

domingo, julho 02, 2006

Abstração

.

Conhecer a si mesmo profundamente permite certas extravagãncias de pensamento, do tipo que se rodeia, rodeia, e se chega a um lugar que, por ainda não ter sido explorado, vibra como nunca quando se sente descoberto.

O caminho para esses lugares é um mistério, daqueles que só se revela quando uma leve pontinha finalmente aparece no fim da estrada - então, não é mais possível voltar, e o mistério deixa de ser um.

Uma das formas de forçar o aparecimento das pontinhas, ou chaves, é guardar a lembrança de como foi possível chegar lá em uma outra vez. Não é difícil, mas requer paciência, não admitindo preguiça nem ansiedade.

Uma música, por exemplo. Primeiramente, ela acalma. Sente-se isso. Desacelerando, outras coisas são vistas, e em cada uma delas um caminho é apresentado. Escolhe-se um, e indo adiante, sem interrupções, chega-se ao lugar ainda não descoberto.

Lá, a permanência não é muito longa. Não se consegue, principalmente por que requer concentração e abstração das coisas urgentes. Mas, quando fica-se mais tempo que o normal, outros caminhos aparecem, também pedindo para serem descobertos.

Se permanece a busca, outros estímulos são apresentados para facilitar a continuidade na estrada. Nesse estágio, a abstração já é quase absoluta - e é assim mesmo que se faz necessário.

Acontece que alguém bate na porta, interrompendo. Não interessa quem seja, a função é a mesma: policiar o pensamento. Extravagâncias não são bem-vindas em qualquer lugar.

..